A Febre é o grande vencedor do 52º Festival de Brasília
Depois de pouco mais de uma semana de eventos na capital do país, a 52ª edição do Festival de Brasília se encerrou ontem com A Febre como o grande vencedor. O filme de Maya Da-Rin ganhou 5 prêmios, incluindo melhor filme e direção em longa metragem. O filme foi encarado como favorito desde a seleção e isso se fortaleceu quando de sua exibição. O filme conta a história de um indígena que demonstra um desconforto cada vez maior e inexplicável em relação a si mesmo. O personagem é interpretado por Regis Myrupu, melhor ator em Locarno e, agora, também em Brasília.
Também fizeram bonito na competição Alice Júnior, de Gil Baroni (4 prêmios, incluindo o inédito prêmio de melhor atriz para Anne Celestino, uma jovem trans), Piedade e O Tempo Que Resta, 3 prêmios para cada, incluindo um especial para Cláudio Assis, diretor do primeiro. Na seara do curtas, tudo foi menos centrado, sendo o grande vencedor Rã, de Ana Flávia Cavalcanti e Julia Zakia. O prêmio de direção foi pra Sabrina Fidalgo, por Alfazema. Carne e A Nave de Mané Socó levaram 3 prêmios cada.
Desde o primeiro dia de evento, o Festival de Brasília 2019 não se furtou de promover situações incômodas, para realizadores, artistas, público e até imprensa. Na verdade, desde a escolha da equipe curatorial, que incluiu um crítico de cinema que atua exclusivamente com material em vídeo, com passagens polêmicas recentes dentro de sua área e que cobre muito pouco o cinema nacional, percebemos que o festival desse ano teria problemas desde sua gênese. A complexa captação de recursos fez murchar a lista de cobertura da imprensa, rendendo ao festival menos visibilidade.
A própria seleção, que se previa no mínimo bizarra, apresentou uma única descoberta preciosa entre longas (O Tempo que Resta, de Thaís Borges), e escolhas altamente discutíveis e populistas, de qualidade duvidosas e moral idem, devidamente ignoradas pelo júri — um claro recado para a tentativa de popularização extrema de um festival que nunca foi experimental (como se acusou), mas que nessa edição esteve em mãos que tentaram descaracterizá-lo, em vão.
Ao longo da semana, casos como a da noite de abertura, em que um ator local foi absurdamente censurado no palco ao tentar ler uma carta de protesto contra a interrupção das políticas públicas para o audiovisual na cidade, esbarrando em clara truculência da organização, infelizmente, mancharam a edição. Por bem, a equipe de A Febre, na voz de seu produtor Leonardo Mecchi, tenou dar alguma dignidade ao episódio lendo a carta censurada na íntegra na noite da exibição de seu filme.
Na noite de apresentação do filme de Thaís Borges, um homem da equipe organizacional do festival agrediu as mulheres no palco tentando silenciá-las. Não satisfeito, ele bateu boca e xingou outras realizadoras que tentaram alertar o horror dessa situação. Isso em meio a uma seleção em que dois filmes (exatamente os dois mais problemáticos da edição) aludiam à violência contra a mulher de maneira a diminuir e/ou romantizar sua gravidade.
Um trabalho de curadoria é sempre em equipe e com certeza alguns e algumas tentaram salvar a seleção desse ano. Porém, espanta notar que exatamente o crítico citado acima que compôs a curadoria tenha publicado críticas de vários filmes da competitiva da edição, um caso inacreditável que une ausência total de noção, desserviço à área em que atuava e militância em relação a uma seleção sobre a qual ele não deveria emitir mais opinião que o seu trabalho como curador já não tenha feito.
Ao fim e ao cabo, os júris tanto de longas quanto de curtas tiveram a inteligência e a qualidade de premiar as belas produções dirigidas por mulheres majoritariamente, que foram de fato os grandes filmes de uma edição problemática, produções que falaram sobre as próprias mulheres, com sua visão de mundo e sobre suas próprias vozes, e perceberam que, assim como a imprensa no geral, também o corpo de jurados enxergaram que discursos machistas em obras inexplicáveis, ainda que "sem querer", não podem mais ser corroborados de forma alguma.
Conheça todos os vencedores do 52º Festival de Brasília:
Mostra Competitiva de Longas
MELHOR SOM
Felippe Schultz Mussel, Breno Furtado, Emmanuel Croset, por A Febre
MELHOR TRILHA SONORA
Vinicius Nisi, por Alice Júnior
MELHOR DIREÇÃO DE ARTE
Carla Sarmento, por Piedade
MELHOR MONTAGEM
Pedro Giongo, por Alice Júnior
MELHOR FOTOGRAFIA
Bárbara Alvarez, por A Febre
MELHOR ROTEIRO
Thaís Borges, por O Tempo Que Resta
MELHOR ATOR COADJUVANTE
Cauã Reymond, por Piedade
MELHOR ATRIZ COADJUVANTE
Thais Schier, por Alice Júnior
MELHOR ATOR
Régis Myrupu, por A Febre
MELHOR ATRIZ
Anne Celestino, por Alice Júnior
MELHOR DIREÇÃO
Maya Da-Rin, por A Febre
JÚRI POPULAR
O Tempo Que Resta, de Thaís Borges
PRÊMIO ESPECIAL DO JÚRI
Claudio Assis, pelo filme Piedade
MELHOR LONGA METRAGEM (PRÊMIO TÉCNICO DOT CINEMA)
A Febre, de Maya Da-Rin
PRÊMIO ABRACCINE – MELHOR FILME LONGA METRAGEM
O Tempo Que Resta, filme de Thaís Borges
MENÇÃO HONROSA
Mostra Competitiva de Curtas
MENÇÃO HONROSA
Ari y Yo, de Adriana Faria
MELHOR SOM
MELHOR TRILHA SONORA
Vivian Caccuri, por Alfazema
MELHOR DIREÇÃO DE ARTE
Isabelle Bittencourt, por Parabéns a Você
MELHOR MONTAGEM
André Sampaio, por A Nave de Mané Socó
MELHOR FOTOGRAFIA
João Castelo Branco, por Parabéns a Você
MELHOR ROTEIRO
Camila Kater e Ana Julia Carvalheiro, por Carne
MELHOR ATOR
Severino Dadá, por A Nave de Mané Socó
MELHOR ATRIZ
Teuda Bara, por Angela
MELHOR CURTA METRAGEM JÚRI POPULAR – MOSTRA COMPETITIVA (PRÊMIO TÉCNICO EDINA FUJII CIARIO)
A Carne, filme de Camila Kater
MELHOR CURTA METRAGEM – MOSTRA COMPETITIVA (PRÊMIO TÉCNICO DOT CINE E CINEMATICA)
Rã, de Júlia Zakia e Ana Flavia Cavalcanti
PRÊMIO MARCO ANTÔNIO GUIMARÃES
Chico Mendes, um Legado a Defender, de João Inácio
PRÊMIO CANAL BRASIL DE CURTAS - MELHOR FILME CURTA METRAGEM COMPETITIVA
Sangro, de Tiago Minamisawa e Bruno H. Castro
PRÊMIO ABRACCINE – MELHOR FILME CURTA METRAGEM COMPETITIVA
Carne, de Camila Kater
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