O que houve com Tim Burton? Por onde anda aquele diretor talentoso, que nos presenteou com grandes filmes, como Ed Wood (idem, 1994) e A Lenda do Cavaleiro Sem Cabeça (Sleeepy Hollow, 1999)? Estas perguntas devem passar pela mente de boa parte das pessoas que estão acompanhando o declínio da carreira do diretor nos últimos dez anos. Sempre que um novo filme de Burton, invariavelmente estrelado por Johnny Depp, é lançado, as esperanças de que finalmente assistiremos a mais um grande trabalho da dupla renascem, mas logo caem por terra. Este Sombras da Noite (Dark Shadows, 2012) não foge à regra, embora seja um claro avanço em relação ao horroroso Alice no País das Maravilhas (Alice in Wonderland, 2010).
Sombras da Noite é um daqueles filmes que não sabem para onde vão, e parecem refletir uma crise ou um lapso de criatividade por parte de seu realizador. Baseado na série homônima dos anos 1960, da qual Burton e Depp são fãs declarados, o filme começa como uma promissora comédia de humor negro, e termina como uma salada de gêneros, incluindo cenas de ação patéticas, que entram facilmente na lista das piores da carreira do diretor. Mas, vamos por partes. Resumidamente falando, principalmente para aqueles que não conhecem a série (era o meu caso), aqui acompanhamos o vampiro Barnabas Collins (Johnny Depp), que foi transformado em tal monstro pela bruxa Angelique (Eva Green) no século XVIII, que se sentiu rejeitada por Barnabas e causou o suicídio da amada dele, Josette (Bella Heathcote). Após ser trancado em um caixão por Angelique, Barnabas é solto por acidente em 1972, e volta para sua família, capitaneada pela matriarca Elizabeth Collins (Michelle Pfeiffer). Entretanto, Angelique continua viva, e obcecada por Barnabas.
Há ainda uma série de personagens secundários, mas todos são tratados de forma superficial pelo roteiro de Seth Grahame-Smith. E contar histórias e desenvolver personagens também nunca foram um ponto forte de Tim Burton. Logo no começo, Burton acerta a mão, com várias gags visuais e piadas que realmente funcionam, depois que Barnabas é solto em 1972 (há uma excelente tirada associando o McDonald's e Mefistótefeles, que gerou muitas risadas durante a sessão). Além disso, o diretor apresenta todos os personagens e suas características típicas, como a psiquiatra bêbada Dra. Julia Hoffman (Helena Bonham Carter), o caseiro Willie Loomis (Jackie Earle Haley), o irmão de Elizabeth, Roger Collins (Jonny Lee Miller), as "crianças" Carolyn (Chloë Grace Moretz) e David (Gulliver McGrath), e sua babá Victoria (também interpretada por Bella Heathcobe), que se torna alvo do amor de Barnabas.
Mas tudo vai caindo por terra na segunda metade. Alguns personagens são tão mal trabalhados que saem de cena sem fazerem a menor falta, como Roger Collins. Nem mesmo a esposa do diretor, Helena Bonham Carter, tem muito espaço para se destacar, e sofre com piadas que não funcionam (a não ser uma, de cunho sexual, que foi mais surpreendente do que propriamente engraçada). É claro que a ênfase ao visual de Burton é notável, mas a trama emperra quando fica girando em círculos em torna da obsessão de Angelique por Barnabas. As relações entre os integrantes da família Collins nunca são plenamente desenvolvidas, algo que já acontecera em Os Fantasmas se Divertem (Beetlejuice, 1988), mas que aqui ainda é pior, assim como o interesse que Victoria demonstra por Barnabas. Há ainda um bocado de cenas e piadas repetitivas, que tornam a experiência de assistir a Sombras da Noite enfadonha na sua segunda metade. É Angelique atazanando Barnabas, este não resistindo, Angelique insiste, ele resiste, ela insite mais, ele resiste mais, e por aí vai. E a participação de Alice Cooper não acrescenta em nada, a não ser melhorando o nível da trilha sonora.
Contudo, o pior é mesmo a meia-hora final. Esta deixa claro a falta de tino de Burton para sequências de ação. Ele tentou fazer uma espécie de duelo entre Angelique e os Collins, que na verdade se resumiu a uma série de situações ridículas e constrangedoras. Há até uma surpresa reservada à personagem de Chloë Moretz (irritante e fora do tom durante quase todo o filme), que por mais que esteja dentro do universo do filme, soa gratuito e patético. O próprio final reservado à Angelique, interpretada deliciosamente por uma diabólica e sensual Eva Green, deixa a desejar, com a utilização de efeitos especiais precários e remetendo a filmes muito ruins sobre bruxaria realizados nos anos 1980 e 1990.
Em alguns momentos, fica parecendo que Burton procurou causar algum suspense, utilizando elementos do gênero terror, e inserindo uma participação rápida de Christopher Lee, seu amigo pessoal, e meu ator favorito. Mas o verdadeiro terror é que Burton deve ter imaginado que estava fazendo um grande trabalho, e deixou brecha para uma continuação!
Apesar de tudo, o filme não chega a ser um desastre completo, graças ao ótimo início e ao bom trabalho do elenco principal (Depp, Green e Pfeiffer). Mas ainda é muito pouco para um diretor como Burton. É claro que, se levarmos em conta apenas a sua filmografia dos últimos dez anos, Sombras da Noite acaba de destacando. Contudo, ainda é muito pouco para alguém de talento como ele. Então, que venha Frankenwwenie, sobre o qual depositaremos novas esperanças de assistir a um grande filme de Tim Burton.
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