Qual seria a razão para se fazer um 13º Big Brother Brasil, levando em conta que os doze anteriores foram rigorosamente iguais? Uma das justificativas é a própria matéria-prima de programas como esse, anônimos. Alçar um desconhecido à categoria de celebridade instantânea acende em todos os outros uma chama invejosa sintetizada na frase: e se fosse comigo? Ao fazer crer que os participantes dos reality shows são gente como a gente, os meios de comunicação de massa enchem os olhos dos espectadores de esperança e seus bolsos de dinheiro. Longe de ser uma apologia ao banimento dos realities, esse raciocínio é o reconhecimento de que eles, de alguma maneira, representam impulsos legítimos de vaidade, curiosidade e competitividade.
A mesma lógica faz a indústria cultural repetir incansavelmente a fórmula do amor: o casal se apaixona mas não pode ficar junto, enfrenta então uma série de obstáculos e no final vive a plenitude de seu amor. Não é preciso esforço para lembrar de filmes que seguem essa linha. A trilogia Crepúsculo (Twilight, 2008-2012, EUA) é, talvez, seu representante atual mais proeminente.
Outra garantia de sucesso narrativo é a jornada do herói. Resumidamente, trata-se da história em que um personagem é chamado para cumprir uma missão (A Partida), vive aventuras para realizar seu objetivo (A Iniciação) e, finalmente, volta à terra-natal trazendo o aprendizado que adquiriu (O Retorno). Esse modelo tem tamanho poder de arrebatamento que foi consagrado, inclusive, pelos mitos religiosos. A também trilogia Senhor dos Anéis (Lord of the Rings, 2001-2003, EUA, Nova Zelândia) exemplifica tão bem as fases da jornada do herói que cada um de seus filmes representa uma das etapas.
Jogos Vorazes (The Hunger Games, 2012, EUA) reúne esses modelos de uma maneira, no mínimo, engenhosa. O longa baseado no best seller juvenil homônimo conta a saga de uma heroína que se vê obrigada a participar de um campeonato macabro. Num futuro apocalíptico, 24 jovens entre 12 e 18 anos são colocados em uma arena na qual terão que matar uns aos outros até que reste apenas um, que sairá vivo e vencedor da disputa. Para completar o sadismo que faria o Marquês levantar do túmulo, tudo é transmitido ao vivo, sem cortes e com patrocinadores que, evidentemente, podem ditar que rumo que o jogo deve tomar.
O reality show se combina com a fórmula do amor quando a heroína se apaixona por um de seus “companheiros” de jogo (sim, aquele a quem deve matar). É precisamente neste ponto que o roteiro ganha refinamento, pois a moça tem consciência de que está em um show (de horrores) e que um romance poderia atrair a simpatia dos telespectadores e dos patrocinadores. Nesse ponto, o longa de Gary Ross dialoga com o nacional Os 3 (Os 3, 2011, Brasil), que também trata da fronteira tênue entre a realidade e a ficção, entre a espontaneidade e a encenação. Outra discussão semelhante também foi proposta por O Show de Truman (The Truman Show, 1998, EUA), filme no qual o protagonista vive, inadvertidamente, desde o seu nascimento até a idade adulta, em um reality show.
A cereja do bolo de sangue Jogos Vorazes é sua protagonista, Katniss Everdeen, que o destino escolheu para participar da competição, para ganhá-la e e para retornar ao seu paupérrimo e oprimido distrito como uma messias. Parece improvável que uma literatura young adult, que se autodenomina sucessora de Harry Potter e Crepúsculo, contenha assuntos como política, poder, classe, violência, espetáculo e relacionamento, mas é verdade.
Apesar dos méritos da história, o filme tem defeitos. Talvez os mais evidentes e graves sejam a falta de identidade e a falta de orçamento. Não faz muito sentido que o longa tenha classificação indicativa de 12 anos, uma vez que o fio condutor da narrativa é um campeonato de assassinatos. Da maneira como foi feito, o espectador mais jovem tem a mesma idade da mais nova participante do torneio. Para conseguir ser “assistível” por adolescentes, foi necessário atenuar, desfocar, escurecer ou apenas mencionar combates e mortes, tirando boa parte da graça de uma fita de ação. Perdido entre adultos e crianças, Jogos Vorazes não atende ninguém a contento.
Fora isso, ou não investiram o suficiente no visual ou investiram mal. Os raros e simplórios efeitos parecem aberturas de novelas da década de 1990. Outra menção desastrosa é a maquiagem e o figurino pretensamente futuristas. Não conseguem passar qualquer informação além da ideia de que as pessoas do futuro se vestem como palhaços. A fotografia, que poderia ajudar o espectador a entrar no clima, nem é percebida.
A adaptação para a telona dessa interessante história pode ser descrita, em expressão tipicamente gauchesca, como desperdício de pólvora em chimango.
Comentários (0)
Faça login para comentar.
Responder Comentário