As cores de Resnais em Medos Privados em Lugares Públicos. O choque de realidade de Haneke em Caché. A nudez do que de pior e melhor há na juventude do novo século em filmes como Rosetta e Entre os Muros da Escola. Se for preciso vê-los em âmbito social ou apenas artístico, isso é problema de cada um de nós. Azul é a Cor Mais Forte é o mais novo marco do intocável cinema francês por ser obra de triunfo, de fôlego, de pigarro e de ajeitar o traseiro na poltrona; tudo isso acaba sendo um fato só. Filme que justifica em x maneiras, o tempo todo, o prêmio que (mereceu) recebeu em Cannes 2013, apesar de ser nada menos do que broxante pra quem tem o sobrenome Von Trier, ou invoca os bons costumes numa arte que já perdeu a inocência há alguns anos.
Sabe quando você nas aulas de interpretação na escola primária tentava descrever o que significava aquele maldito ponto negro, ou branco, no meio da lousa branca, ou verde? Aquele borrão não significava nada, e ao mesmo tempo carecia de infinitas formas de análise; alunos nas mais distintas universidades ainda passam por essa mesma vergonha, desde sempre! De qualquer forma, a cor faz toda a diferença... E quando a criança Adéle observou à primeira vista o estopim ambulante do seu amadurecimento, a ultra confiante Emma, ela também não conseguiu interpretar aquele borrão azul como a relação mais marcante de sua vida. É justamente essa visão unilateral que pode vir a ser inevitável ao espectador que apreciar Azul, ainda que virgem de uma revisão saudável. Não tomemos descontos à parte, afinal todos já fomos assim em relação a esse ou aquele filme na vida.
A partir de então, nesse encontro desencontrado numa faixa de pedestres movimentada, o diretor sela um simples compromisso: Responder a razão da cor da maioria das calças jeans no mundo merecer ser admirada como a mais efervescente que há, lá fora, e então esse universo explode em matizes de ciano, até o fim! Nesse período, que parece constar de trinta minutos de duração graças à fluidez da montanha-russa, desconfiamos de muita coisa. Não do que é visível, pois tudo é mais crível do que a certeza que entre quatro paredes, a chama safira do fogão pode queimar mais do que uma fogueira ao ar livre, mas do que é exclusivo a nossa consciência emocional; ao nosso terceiro olho, se tivéssemos um...
Mas calma: Só 5% do filme é a resposta à afirmativa do próprio título. O resto, ironicamente, não é diegese. É brincar em um trampolim com o atual cinema francês e público global. O diretor aqui opta por esquecer trilha sonora extra, montagem americana ou a tentação de muitos em definir essa “nova” geração. Ao invés disso, por exemplo, se dá bem substituindo o ritmo narrativo oriundo da trama pelo nível excepcional de todas as atuações; em especial a protagonista, com seus inúmeros monólogos sem palavras. Cada gemido ou sugada de espaguete é sinal verde para a próxima cena, às vésperas de um novo riso ou choro para nos deixar órfãos da insensibilidade. No universo sem contexto ou decretos de Adéle, nua do começo ao fim, nada é, mas tudo pode ser intencional transvestido de inofensivo. Um arco-íris de sensações pintado no limite entre apologia e explosão emocional; uma ode enquanto abordagem crônica a liberdade – la voie, la vérité, la vie.
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