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II SINISTRO FEST 2023 - ENCERRAMENTO

PREMIAÇÃO DO APAVORAMENTO

II SINISTRO FEST 2023 - ENCERRAMENTO E PREMIAÇÃO. Foto: Ted Rafael
II SINISTRO FEST 2023 - ENCERRAMENTO E PREMIAÇÃO. Foto: Ted Rafael

O aspecto de terror via antologia causara furor nos mais variados trabalhos. Como exemplo histórico há de se citar as influências macabras destes tipos de materiais antológicos como forma de expressão ao horror/terror. Nisso há o sagaz José Mojica Marins – o nosso Zé Do Caixão – que usara destas influências para construir algumas de suas mais horroríficas peças, como cito na crítica do filme Estranho Mundo de Zé do Caixão (Estranho Mundo de Zé do Caixão, 1968) – “Antologia. Assassinato metendo a mão no cadáver que se justifica por instinto e tesão”:

É sabida a predileção do Mojica por quadrinhos – o cara tinha uma coleção monstra começada na infância – e juntara isto com seu fascínio pelo pavoroso quando se deparava com material de apavoramento escroto das mais variadas editoras americanas, tais quais a Fawcett Comics (1938-1980), Avon Periodicals (1941), a revista Creepy (1964-1983), entre outras. Muitas delas eram marcadas pelo caráter dos pequenos contos grosseiros num estilo que teria sua popularização em várias mídias (contando com a inspiração anterior na literatura de horror), e a posteriori nos materiais das séries televisivas como Os Contos da Cripta (Tales from the Crypt,1989-1996), esta criada por William Gaines e Steven Dodd, e filmes como Creepshow - Show de Horrores (Creepshow, 1982) do mestre George Romero e escrito por Stephen King, entre outros tantos materiais feitos no período. Era gente de calibre investindo nisso nos anos 80, e o velho Mojicão já experimentara pra ver se prestava lá em 1968. Mas era no caráter de antologia destas pequenas estórias estraçalhadoras que o velho José Mojica Marins se rebolou pra cima. Sem fuleiragem. (NOGUEIRA, 2021[1]).

Além da antologia vista em Estranho Mundo de Zé do Caixão, Mojica ainda faria outro trabalho desta monta, que seria a obra Trilogia de Terror (Trilogia do Terror, 1968), onde o mesmo dirigira um segmento e outros dois seriam dirigidos por Luís Sérgio Person e Ozualdo Candeias. Inclusive há uma série de médias-metragens alcunhada de Mestres do Horror (Masters of Horror, 2005-2006), que reuniria monstros sagrados clássicos do cinema de horror/terror – John Carpenter, Tobe Hooper, John Landis, Dario Argento, Stuart Gordon, entre outros – em materiais de duração média de 45-50 minutos para demonstrarem sua afeição ao gênero, além de exemplos diversos que seguem esta linha. Este formato permite tanto a diversidade quanto a demonstração de capacidade para criar um material de qualidade e que funcione por si mesmo. As antologias de quadrinhos citadas seguem esta prerrogativa, com personagens aprontados logo de começo com seus conflitos explicitados e a explosão dos problemas em seguida. Não há tempo para devaneios ou pretensas profundidades. Estórias fugazes. O que abre espaço parta a brutalidade, já que o curto formato exige pressa e choque. O horror/terror fora (e é por alguns círculos) considerado como gênero menor – até quando é proposta a existência de temas políticos e sociais por numa determinada esfera crítica (uma conversa mole, porque elementos tais como os citados já eram contemplados), cria-se um subgênero para se diferenciar propositadamente dos alcunhados de inferiores, como fora a invenção da nomenclatura do pós-horror –, e um dos motivos talvez seja por este caráter transgressor que é apelativo para as sensações mais escrotas das criaturas humanas. E a configuração como curta pode servir ainda mais a este propósito. A diversidade citada, amalgamada com as deliciosas más intenções do curto formato introjetam tesão a essa prerrogativa. Permite uma variada tormenta de pensamentos e sensações diante do assistir de vários materiais em acelerada sequência. Não obstante da importância dos longas nalguma programação festivalesca, afinal, o carro chefe tem de ser apreciado. É um esquema já conhecido dos festivais e ao horror/terror/cinema fantástico funciona na variedade citada e nas formas mais variadas de apavoramento.

Carlos Primati. Foto: Arquivo Pessoal
Carlos Primati. Foto: Arquivo Pessoal

O curador Carlos Primati estima que a brincadeira para a escolha dos selecionados teve mais de 600 filmes inscritos para o II SINISTRO FEST 2023. Sobre o modus operandi da curadoria ele explicita que

esses filmes são inscritos em plataformas online. É a FilmFreeway e a Festhome, a gente tem duas plataformas, são inscrições internacionais. Tem muito filme brasileiro, mas tem também filmes de, literalmente, todas as partes do mundo. É uma pena até que países meio obscuros, que seriam interessantes a gente contemplar, as vezes o filme não tinha qualidade suficiente né? E a gente sempre vai pelo critério de qualidade e de poder de entretenimento, de o quanto ele é original, inovador e tal. (PRIMATI, 2023[2]).

E ele continua a afirmar que o seu trabalho opta e

privilegia também a qualidade técnica. As vezes o filme tem um som muito ruim, ele é muito incômodo, na gramática ali, uma câmera muito ruim, a montagem muito precária... São alguns [dos] critérios para desclassificar o filme. Só que obviamente tem filmes que rompem todas as barreiras. Ele consegue ali não levar muito em consideração a linguagem cinematográfica, mas consegue ser uma obra, assim, que cativa por outros critérios. Então não significa que a gente só programa filme bonito e bem feito. (PRIMATI, 2023).

Cabe, de acordo com Primati, a observância do perfil idiossincrático de cada festival. “A gente conseguiu, é, assim, privilegiar a escolha de filmes que fossem um entretenimento mais interessante, mas ao mesmo tempo tivesse ali um grau de provocação, de diferentes manifestações ali do que poderia ser o terror.” (PRIMATI, 2023). O lance é se resolver dentro dos critérios (maleáveis sim como afirmado fora) da curadoria e lidando com as dificuldades de listagem de filmes a partir de um severo afunilamento que é de praxe da programação de todo e qualquer festival. Ele continua expondo que se informa de “quais são as sessões, se tem recortes específicos e qual a duração total do festival.” (PRIMATI, 2023). A depender também dos tipos de filmes inscritos. Afinal, alguns recortes a serem especificados seriam projetados através daquilo que fora apresentado nos atos de inscrição dos mais variados realizadores. Um recorte pode forçosamente se criar a partir disso. Há também o caráter de busca por uma originalidade mínima, que fuja da mera imitação por si só.

A gente não coloca ali, necessariamente, filmes óbvios, né, filmes que muitas vezes são diluições de obras que a gente já conhece, porque inevitavelmente tem cineastas iniciantes, uma galera que gosta de terror mas, tem um repertório muito limitado, uma produção de hollywood, que acaba assistindo Invocação do Mal e esse tipo de filme de susto, de fantasma, de possessão... E faz imitações baratas disso. É muito difícil filmes assim entrarem, da minha parte. Pra gente não contribui muito porque são cópias pioradas de filmes são tecnicamente bem feitos e bem sucedidos, então a gente vai optar por mostrar algo diferente. (PRIMATI, 2023).

E foi nesse diferente – vinculado sim ao entretenimento – que o festival se formatara tentando agarrar públicos múltiplos que se conflagrassem com um tipo de material que assim os satisfizesse, e que assim trouxesse algum ineditismo que fosse, principalmente por serem produções até então pouco conhecidas do grande público, mas com apelos do gênero que permitissem esse tesão pelo horror/terror/cinema fantástico. A abundância de estilos e formas é salutar exatamente para um crescer dentro das próprias maneiras de se assustar ou causar quaisquer sensações que estes estilos já alopram a tanto tempo. Um festival com recorte de gênero acaba por apostar bastante na multiplicidade logo no seu nascedouro.

Wesley Gondim no II SINISTRO FEST 2023. Foto: Ted Rafael
Wesley Gondim no II SINISTRO FEST 2023. Foto: Ted Rafael

Um dos organizadores do tetricamente assombroso evento, Wesley Gondim, afirma que a concatenação da origem do SINISTRO FEST viera através da circulação do seu filme curta-metragem Para Minha Gata Mieze (Para Minha Gata Mieze , 2018) em festivais e mostras do gênero, o que o levara a conhecer gente ligada no esquema do cinema fantástico – curadores, diretores dos festivais –, e perambulando por eventos de parecido escopo percebera que no Ceará (e no Nordeste) não havia um desta envergadura em específico. Além do fato do ineditismo de vários destes filmes para o público em geral e realizadores na força de, segundo Wesley, “poder assistir vários filmes que a gente não tem acesso, e não teria acesso de outra forma né? [São] muitos filmes interessantes que não andam no circuito tradicional, assim, e nunca que a gente veria isso num cinema num shopping.” (GONDIM, 2023[3]) Sobre o formato, Wesley afirma ter sido mais interessante manter um esquema tradicional de festivais com muitos curtas e alguns longas, e por conta de que o longa “ele tem uma hora e meia e consegue pegar um espaço que teriam vários curtas-metragens naquele local né? Mas ao mesmo tempo também é interessante a gente ver como é um longa-metragem, porque são [formatos] diferentes.” (GONDIM, 2023). “A diferença da forma como você conta uma estória, num longa você consegue contar uma estória maior, com mais personagens, consegue ter muito mais coisas e aprofundar mais em fotografia, aprofundar mais, assim, na própria narrativa, e na construção dos personagens.” (GONDIM, 2023). E exatamente pelo curto formato que propicia essa diversidade e busca por resultado expresso, ele continua que

em compensação no Curta-metragem você consegue ter mais perspectivas, você pode ver vários estilos de curta, desde animação experimental a um filme no formato thriller mesmo, suspense policial, a um gore bem absurdo, ou um filme mais psicológico, ou aquelas coisas muito doidas. Tem de todo tipo de coisas que você pode colocar num curta-metragem. (GONDIM, 2023).

A experiência ao denotar as várias maneiras de destroçamento – físico, mental, social, etc – já traz a reboque o tesão não só pela novidade, mas pela catarse que estas próprias novidades podem ensejar. A liberdade de ação e narrativa, a disparidade entre filmes que se seguem, e os debates que os mesmos podem inferir se jogados uns contra os outros. A força destas escolhas é salutar por conta do agregado do que fora citado até aqui. A concatenação oportunista em aterrorizar é tão deliciosa, que se transmuta (e transgride) dos mais invocados modos para o nosso atemorizo e deleite.

Filmes premiados no II SINISTRO FEST 2023. Fotos: Divulgação.
Filmes premiados no II SINISTRO FEST 2023. Fotos: Divulgação.

VENCEDORES DO II SINISTRO FEST 2023

TROFÉU QUIBUNGO MELHOR LONGA-METRAGEM
Verão Fantasma (Verão Fantasma, 2022) [horror / musical - 1h 54 min – Brasil], de Matheus Marchetti. “Em algum lugar no litoral brasileiro, dois adolescentes se unem sobre o mistério de uma criança desaparecida. Eles acabam se apaixonando enquanto investigam ocaso, mas seu romance florescente é ameaçado por forças sinistras que espreitam sob aquela idílica paisagem de verão.” 

TROFÉU QUIBUNGO MELHOR CURTA INTERNACIONAL
Himo (Himo, 2022) [horror, bodyhorror - 18 min – Finlândia], de Azh Boyzz, Teemu Saarinen e Ville Aittokumpu. “HIMO é uma história carnal sobre a luxúria e a necessidade de satisfazer o apetite. Para manter o controle, você deve ser capaz de ver o seu lado cru.”

TROFÉU QUIBUNGO MELHOR CURTA NACIONAL
Promessa de um Amor Selvagem (Promessa de um Amor Selvagem, 2022) [suspense - 23min – Brasil], de Davi Mello. “Depois de invadir uma festa, um jovem descobre que esta será sua última noite.”

TROFÉU QUIBUNGO MELHOR FILME CEARÁ SINISTRO
Noturno (Noturno, 2022) [suspense - 22 min – Ceará], de Irene Bandeira. “Um amanhecer na vida de Manoel, vigia noturno em uma grande casa abandonada. Ao anoitecer, os mortos começam a vagar sem rumo pela cidade. Manoela guarda ansiosamente a visita de Estela.”

TROFÉU QUIBUNGO MELHOR ROTEIRO ORIGINAL CEARÁ SINISTRO
Noites em claro (Noites em claro, 2022) [suspense - 20 min – Ceará], de Elvis Alves. “Carlos, um entregador de comida, precisa lidar com o apavorante toque de recolher imposto pela polícia em sua comunidade enquanto tenta lidar com a presença de uma entidade sobrenatural.”

TROFÉU QUIBUNGO MELHOR ARTE E FIGURINO CEARÁ SINISTRO
Sistema Isolado (Sistema Isolado, 2023) [sci-fi - 25 min – Ceará], de Bruno Albuquerque. “Tomado por um calor intenso, o mundo tornou-se um lugar desolado e inóspito. Uma jovem sobrevivente luta diariamente para permanecer viva, lidando com temperaturas escaldantes, fome e os sobreviventes restantes.”

MENÇÃO HONROSA
Casa de Bonecas (Casa de Bonecas, 2023) [horror / sci-fi / queer- 15 min – Brasil], de George Pedrosa. “Nós, três profetas imateriais de rosa que seduzem com corpos brilhantes e desejos sombrios. Estaremos sempre dentro do coração um do outro. Dia após dia sofremos mutações e ficamos muito mais fortes.”

MENÇÃO HONROSA
Deadline (Deadline, 2023) [animação - 13 min – Israel], de Idan Gilboa. “"Deadline" é um curta-metragem de comédia ácida em stop-motion que explora o complexo equilíbrio de poder entre a burocracia, a morte e a devoção felina dos idosos. No centro da trama, destacamos a história de uma corajosa amizade e solidariedade entre duas senhoras idosas que estão fartas do desrespeito e da indiferença da sociedade.”

MENÇÃO HONROSA
Aratu (Aratu, 2022) [horror - 8 min – Brasil], de Firmino de Almeida. “Uma mãe solteira, há muito tempo separada de seu filho, reencontra-o enquanto trava uma batalha por seu direito à habitação em uma favela. Enquanto isso, uma figura ancestral do folclore brasileiro emerge no cenário.”

Irene Bandeira. Diretora do filme Noturno (Noturno, 2022). Foto: Ted Rafael
Irene Bandeira. Diretora do filme Noturno (Noturno, 2022). Foto: Ted Rafael

Elvis Alves. Diretor de Noites em Claro (Noites em Claro, 2022). Foto: Ted Rafael
Elvis Alves. Diretor de Noites em Claro (Noites em Claro, 2022). Foto: Ted Rafael

Netinho Nogueira. Diretor de Arte e Figurinista de Sistema Isolado (Sistema Isolado, 2023). Foto: Ted Rafael
Netinho Nogueira. Diretor de Arte e Figurinista de Sistema Isolado (Sistema Isolado, 2023). Foto: Ted Rafael

NOTAS

[1] Crítica do filme Estranho Mundo de Zé do Caixão (Estranho Mundo de Zé do Caixão, 1968) – Antologia. Assassinato metendo a mão no cadáver que se justifica por instinto e tesão. Cineplayers. 2021. Disponível em: https://www.cineplayers.com/criticas/estranho-mundo-de-ze-do-caixao-o

[2] PRIMATI, Carlos. Carlos Primati: Depoimento [out. 2023]. Entrevistador: Ted Rafael. Ceará, 2023. Arquivos de áudio digitais. Entrevista concedida através do programa Whats app, em decorrência da criação do artigo para o site Cineplayers “II SINISTRO FEST 2023 - ENCERRAMENTO”.

[3] GONDIM, Wesley. Wesley Gondim: Depoimento [out. 2023]. Entrevistador: Ted Rafael. Ceará, 2023. Arquivos de áudio digitais. Entrevista concedida através do programa Whats app, em decorrência da criação do artigo para o site Cineplayers “II SINISTRO FEST 2023 - ENCERRAMENTO”.

Equipe do II SINISTRO FEST 2023. Foto: Ted Rafael
Equipe do II SINISTRO FEST 2023. Foto: Ted Rafael

COBERTURA COMPLETA - SINISTRO FEST

ABERTURA -  II SINISTRO FEST 2023
DIA 001 - 03/10 - II SINISTRO FEST 2023 
DIA 002 - 04/10 - II SINISTRO FEST 2023     
DIA 003 - 05/10 - II SINISTRO FEST 2023
DIA 004 - 06/10 - II SINISTRO FEST 2023 
DIA 005 - 07/10 - II SINISTRO FEST 2023 

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