II SINISTRO FEST 2023 - DIA 003 – 05/10/2023
Encarcerador dia terceiro
SINISTRO FEST 2023 - DIA 003 – 05/10/2023. Foto: Ted Rafael
E o SINISTRO segue aterrorizando. Uma questão presente nestas escolhas de fitas, seria a proposição ao aprisionamento humano, seja ele físico, mental, estrutural, biológico ou por vias de controle social. Uma motivação clássica aos filmes de horror/terror e cinema fantástico, já que o conflito se estabelece com algum tipo de apoderação qualquer que seja. Ou por uma discordância levada a cabo ao delírio como é percebido em Ciclo (Ciclo, 2023); passando pela tortura física em calabouços como é disposto em El Semblante (El Semblante, 2023); ou como forme de controle social em The Beast (The Beast, 2023). A prisão nos é forçada e cabe às escolhas futuras que fazemos, as maneiras com as quais vamos lidar com as espécies de confinamento imposto – ou autoimposto (quem sabe?).
El Semblante (El Semblante, 2023). Foto: Divulgação
El Semblante (El Semblante, 2023) [horror - 15 min – Espanha], de Raúl Cerezo e Carlos Moriana. Sessão Labatut. Competitiva Curta Internacional.
De época. Tortura. Inquisição. Reza do mal. Caça às bruxas. Conflito entre mestre e inquisidor. A inquisição como panorama de fundo motivado para a existência tácita dos personagens ao se debater tortura, autoridade e violência contra a mulher. Câmera usada de forma tradicional, o velho e funcional plano e contra-plano serve bem ao direcionar a angústia e surpresa perto do fim, onde o choque narrativo e visceral importa mais do que o eixo da forma rebuscada que inventada fosse. Com movimentos de câmera leves num crescente diante da tensão, onde de início os planos estáticos vão dando lugar à mobilidade conforme o recrudescimento severo das questões levantadas. O tal semblante da dor. Atuação foda do trio principal. O eixo da prisão do pai vai se configurando em puro desespero quando percebe que sua filha poderá ser torturada pela aparelhagem de flagelação que o mesmo fora obrigado a criar para um inquisidor da Igreja Católica. A filha Elena acaba por se lascar – ao ser supliciada duma maneira escrota que envolve empalamento sexual. E o pai vê. A face da dor que o inquisidor tinha tesão em conseguir não era da torturada, mas a do pai.
The Beast (The Beast, 2023). Foto: Divulgação
The Beast (The Beast, 2023) [folk horror - 23 min – França], de Joris Laquittant. Sessão Labatut. Competitiva Curta Internacional.
Folk Horror. Caça nos Matos. Matança de porco. Incitação do garoto na caça. Estranhamento. Câmera lenta, sorrisos e trilha assombrada. Ritual. Sangue na cara do primo. Boa decupagem. Bons sustos. Genuínos. O filme vai te jogando essa gama de elementos enquanto monta uma estratégia de surpresa programada bem inspirada no M. Night Shyamalan, prontamente nas suas obras Sinais (Signs, 2002) e A Vila (The Village, 2004), seja no suspense visual de ambas – tem até a putaria de susto no milharal – ou na surpresa da monstruosidade “falsa” do segundo. Há a exigência de um treinamento de iniciação pro garoto, que é incumbido de passar por algumas provas, nas quais se vê sem saída, já que aquele grupo o força na marra a desenvolver-se nas obrigações ritualísticas envolvidas. Consegue casar bem o ritual e o sobrenatural fake, afim de gerenciar o espectador no interesse de como vai ser o desfecho desse negócio.
Deadline (Deadline, 2023). Foto: Divulgação
Deadline (Deadline, 2023) [animação - 13 min – Israel], de Idan Gilboa. Sessão Labatut. Competitiva Curta Internacional.
Animação stop-motion. Deliciosa, de grotesca e ingênua brutalidade que diverte bem. Velhinha tenta encarar uma fila de espera num banco no qual persiste exigindo uma burocracia tecnológica com a qual ela tem o seu próprio ritmo para lidar, nisso a indiferença quanto a sua condição por parte daqueles que a circundam só cresce, o que a faz se comprometer em estraçalhar todos sob os olhares do anjo da morte que nada tem a fazer além de fazer a contagem de corpos. Velhinhas armadas até os dentes para defender não só suas existências, mas para promulgar uma vingança por sobre os que não as trataram bem. A animação tem uma movimentação fluida e com o aporte certinho para o humor ácido que carrega, com direito a miolos estourando, desmembramentos diversos e proteção ao gato querido pelas idosas. A opressão silenciosa sendo resolvida com muito barulho é a esperta mensagem desse material.
Ratón de Biblioteca (Ratón de Biblioteca, 2023). Foto: Divulgação
Ratón de Biblioteca (Ratón de Biblioteca, 2023) [horror - 13 min - Espanha], de Javier Yañez Sanz. Sessão Quibungo. Competitiva Curta Internacional.
Irene busca uma saída para sua prisão de vida – com o comodismo conservador na manutenção daquilo que é mais socialmente aceito e assim deve ser contemplado e continuado – e acaba recorrendo a uma biblioteca com criaturas internas esquisitas. Aproveita bem o espaço fechado da biblioteca que serve exatamente para libertar através do conhecimento, porém há os movimentos de captura ao lidar com o terror das criaturas. E já rola um monstro, com pós-momentos de estraçalho corporal, com efeitos de maquiagem altamente decentes. Monstro escroto inclusive no visual de seus vários orifícios na cabeça, numa demonstração daquilo que nada a ele escapa. E trocar a carceragem anterior por este valeu a pena? O sangue e tripas dos intestinos delgado e grosso podem responder esta pergunta com mais precisão.
Ciclo (Ciclo, 2023). Foto: Divulgação
Ciclo (Ciclo, 2023) [sci-fi - 1h 25 min - Brasil], de Ian SBF. Sessão Quibungo. Competitiva Longa-metragem.
Aqui um dos seis longas exibidos no SINISTRO FEST. Um protagonista conselheiro ou psicólogo pra tentar ajudar a galera segue sendo cismado com o que o cerca, e que não acredita, de fato, estar fazendo algo de positivo para os seus companheiros. Até alguém morrer na sua frente e um segredo ser revelado. A paranoia crescente como uma doença faz com que as figuras se encaixotem em espécies de abrigos retro futuristas supostamente metidos a hiperbáricos, que sirvam para mantê-los presos e lidando com seus velhos vícios, desde carência à consumo. O filme usa bem da paleta de cores para se vender como troço claustrofóbico, que versa nas cores os anseios dos personagens, além de causar um destaque interessante daquilo que o cercam. Uma esperteza marota essa escolha, como quando o amarelo vai mostrando uma mediana sujeira e desconforto enquanto o vermelho intriga mais e denota o perigo, e as cores frias a podridão. Sobre a câmera, inclusive, tem um plano em sues primeiros minutos que é bem esperto ao propor o fechamento dos espaços. Um contra-plongée no protagonista mostrando o mesmo preso num ambiente fechado e opressor com o teto bem próximo de sua cabeça. Para deixar o espectador dentro daquela prisão. A decupagem se vende em muitos planos fechados e médios no máximo, de conjunto, bem poucos. Isolamento e depressão das pessoas, montadas com estas escolhas. A doença mental do medo de sair. Ciclos de tempo como fobia. Paranoia de novo. Cenário foda. Claustrofobia. Personagens em crescente tensão como siris numa lata. A surpresa da descoberta é tramada como algo a ser não exaltado, mas, sim, vilipendiado pelos paranoicos, que céticos ficam com qualquer mudança. Por isso mesmo todos papocam no encerramento.
Texto para a cobertura do Sinistro. Artigo Festival II SINISTRO FEST 2023.
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