Ficou conhecido pelos filmes anti-belicistas "A Harpa da Birmânia" e "Fogos na Planície"
Kon Ichikawa nasceu em Uji Yamada, distrite de Mie, Japão, em 1915, filho de um vendedor de quimonos que morreu logo após seu nascimento. Mais novo de uma família de três irmãs, foi criado cercado de mulheres nos aredores de Hiroshima. Começou a carreira artística como desenhista, numa companhia de animação que mais tarde se tornaria o poderoso estúdio Toho, um dos maiores do Japão. Seus primeiros curtas, feitos quando ele tinha apenas 18 anos, foram versões japonesas de Mickey Mouse, Betty Boop e Popeye. Depois da fusão do estúdio de cinema em que trabalhava com outros, dando origem à Toho, Ichikawa mudou-se para Tóquio e começou a carreira em longas como assistente de direção de Akira Kurosawa. Foi quando conheceu sua mulher Yumiko Mogi, conhecida pelo nome profissional de Natto Wada, então uma intérprete e tradutora do estúdio, e partiu para a direção de longas. O primeiro dele foi A Garota do Templo Dojo (Musume Dojoji, 1946), uma animação de marionetes censurada na época e que se perdeu.
Juntos, Wada e Ichikawa fizeram em torno de 40 filmes, que foram ficando densos e sofisticados com o passar do tempo. Entre eles diversas adaptações literárias, reconhecidas pelo respeito ao texto original, algumas de acentuado conteúdo sexual, então em moda no Japão dos anos 50-60. Ichikawa dizia que, se os filmes de Kurosawa eram predominante masculinos, os seus eram andróginos, “sexualmente saudáveis, mas com um quê de incômodo”, referindo-se a Estranha Obsessão (Kagi, 1959), fantasia sexual de um velho que tenta revitalizar sua vida sexual que venceu o Grande Premio do Júri no Festival de Cannes, dividido com A Aventura, de Michelangelo Antonioni, e o Globo de Ouro de melhor filme estrangeiro.
Os homens em seus filmos eram em geral frágeis, muitas vezes angelicais, um tanto frívolos e não confiáveis, constrastando com as mulheres cheias de vida, sem pudor e inteligentes, o que muitos viam uma réplica da vida em comum do casal. Ichikawa-Wada fizeram os filmes mais elogiados e aclamados filmes do diretor no exterior, como Coração (Kokoro, 1955), A Vingança do Ator (Yukinojô henge, 1963), Conflagração (Enjô, 1958) – baseado em Yukio Mishima, grande fã de Ichikawa -, e o documentário Olimpíadas de Tóquio (Tokyo Olympiad, 1964), na qual venceram o BAFTA, o Oscar britânico, de melhor documentário, e o premio da Crítica em Cannes.
A Harpa da Birmânia (Biruma no tategoto, 1956), lançado no Brasil também com o nome de Nunca Deixarei os Mortos, venceu o Festival de Veneza. No filme, um soldado da Segunda Guerra Mundial falha ao tentar convencer seus companheiros de que a guerra havia acabado, com a conseqüente derrota do Japão. Fogos na Planície (Nobi, 1959), considerado por muitos sua obra-prima, viria logo depois, com as polêmicas cenas de canabalismo.
Wada, que nunca quis ser roteirista, aposentou-se depois de Olimpíadas de Tóquio e deixou o diretor por conta própria. Coincidiu com a ascensão para da TV e Ichikawa fez para esse veículo algumas de suas obras mais populares no Japão, pois foi lá que nasceu o detetive Kindaichi, que rendeu uma série de filmes. Em 1982, insisitu para que a mulher escrevesse um último filme, ela que se tratava de um câncer no seio. As Irmãs Makioka (Sasame-yuki, 1983) foi o último filme dos dos dois (Wada escreveu apenas o final), a derradeira obra-prima.
Em meados da década de 60, junto com Kurosawa, Keisuke Kinoshita e Masaki Kobayashi, tentaram dirigir um filme a quatro mãos, mas o projeto foi arquivado. Ichikawa, após a morte dos demais, filmou o roteiro: chamou-se Amar de Novo (Dora-Heita, 2000). No final da carreira, Ichikawa dedicou-se a refilmagens: uma, agora em cores, de A Harpa da Birmânia (1985) e de Os 47 Samurais (Genroku chushingura, 1994), originalmente filmado por Keiji Mizoguchi. Seu último filme foi Os Inugamis (Inugami-ke no ichizoku, 2006), também um remake de seu filme, filmado em 1976.
Morreu em 13 de fevereiro de 2008 de pneumonia aos 92 anos, deixando dois filhos.