Valente (Brave, 2012) não começa com o clássico letreiro 'Era uma vez’ das fábulas de antigamente, mas bem que poderia.
Ambientado em um mundo que a Disney um dia dominou, conta a história da Princesa Merida, que cansada de aguentar as obrigações da realeza feminina, decide fugir e mudar o seu destino através de uma bruxaria; atitude que obviamente traz mais problemas do que soluções. A Pixar parece ter sido alvo de feitiço parecido, pois desde que cometeu o equívoco Carros 2 (Cars 2, 2011), viu seu nome, até então irretocável, começar a criar dúvidas onde antes havia certezas. Valente, então, é a tentativa da empresa de reconquistar a crítica e o público, mas será que o caminho é apostar em algo tão diferente do que está acostumada a entregar?
O tom de Valente é relativamente sério em seu desenvolvimento, o que causa estranhamento imediato. O ambiente meio viking também contribui para isso, onde é comum vermos cenários fechados, castelos mal iluminados (não em sentido pejorativo) e noites sombrias e chuvosas que escondem mitos; um deles, um urso responsável por arrancar a perna do Rei, pai de Merida. As cores vivas só são vistas nas florestas, onde o verde contrasta de forma natural com seus ruivos e já marcantes cabelos; e não a toa o local onde ela se sente mais a vontade.
Lembra as fantasias antigas das Disney, com todos os clichês de princesa, mas os diálogos acelerados denunciam o direcionamento à juventude atual, com momentos de humor pontuando a trama (o que é tradicional da Pixar). Porém, esses momentos por vezes desandam ao apostarem em piadas físicas, gags visuais batidas que geralmente encontramos nas animações de outros estúdios, e não nos trabalhos da luminária saltitante. Há momentos inspirados, mas e essas passagens de riso fácil, como explicá-las? Some isso a alguns números musicais bizarros e percebe-se a influência direta da Disney na concepção do longa. Estaria a Pixar perdendo força criativa dentro da área?
Não que tecnicamente o filme seja decepcionante, longe disso. Os cenários são absurdamente maravilhosos, com montanhas fabulosas e águas que parecem reais, os cabelos de Merida movem-se de maneira natural e independentes, independência essa que busca também em sua vida, mas da capacidade técnica ninguém (ainda) duvida do que a Pixar é capaz. O problema está mesmo na história, na capacidade de escolher um tema e desenvolvê-lo ao máximo, de todas as maneiras possíveis, de forma a nos fazer não apenas acreditar naquele mundo, mas também de querer estar lá, vivendo aquilo junto aos personagens. Cadê o coração de Toy Story 3 (idem, 2010)? Cadê a energia de Os Incríveis (The Incredibles, 2004)? Cadê o romantismo de Ratatouille (idem, 2007)? Cadê a ousadia de WALL•E (idem, 2008)? Em algum lugar do caminho a Pixar parece ter se perdido. Falta a Valente algo que nunca faltou em nenhum outro filme da empresa (nem a Carros 2): identidade.
Não me entenda mal: Valente está longe, muito longe de ser um equívoco total. Pelo contrário, é um filme agradável ao modo clássico das histórias de princesas mais escuras, de desenvolvimento lento e gostoso de acompanhar. Há coragem em mexer no destino dos personagens sem se preocupar em assustar as crianças; elas que aprendam com os erros de quem está em tela. O foco é mesmo o conflito adolescente, um tema geral que certamente abre possibilidades de diálogos entre pais e filhos, mas isso é o que esperamos da Disney, algo basicão e de fácil digestão, e não da Pixar... Ok, o filme não é um erro, é bacana e certamente divertirá famílias, mas o que esperar daqui para frente de seus trabalhos? São muitas incertezas para um estúdio que até pouco tempo atrás simplesmente não conseguia errar.
Não há nada mais óbvio nesse filme que o fato de a Pixar ter emprestado seu talento para desenvolver um projeto com a mentalidade Disney. Mais claro que isso, não há.
Mesmo assim, ainda que tenham sido momentos de mero escape, bem simples, gostei muito!
Parabéns pela cítica Rodrigo.Quando ouvi falar desse filme, achei que seria uma versão Pixar de ''Como Treinar o Seu Dragão'',e não uma versão Pixar dos filmes de princesa da Disney. Eu ainda não vi Carros 2 (embora já tenha saído decepcionado com o primeiro), mas confio na Pixar,talvez 'Valente' não deva ser visto como ''incerteza'', mas sim como um experimento da empresa para quem sabe trazer o que de melhor a Disney tinha vários anos atrás. Claro que é um risco, mas é algo que pode se aperfeiçoar com o tempo.
Concordo com a nota, mas não muito com a crítica... Não achei o filme sério, mas que mescla aventura épica com tons sombrios de tempos medievais. O filme é feito para todos os tipos de gerações, não é tão engraçado, mas é muito encantador. Tem identidade sim, principalmente naquela relação de mãe e filha, e para mim está longe de ter todos esses erros apontados no texto...
"O problema está mesmo na história, na capacidade de escolher um tema e desenvolvê-lo ao máximo, de todas as maneiras possíveis" = Concordo.
Eu não sei porque tanto bafafá em cima de Carros 2 (Cars 2, 2011)... Primeiro, que não é um filme ruim, segundo, a Disney está muito acostumada a lançar sequências inferiores aos filmes que as deram origem, mas em DVD, só que desta vez foi nos cinemas...
É basicamente um filme que utiliza a criatividade Pixar com a mentalidade Disney, entretanto, não deixa de fazer o seu papel que é divertir-se com a aventura de Merida.
Esperava mais ousadia, mas as animações do Oscar estão com essa mesma "pegada" infatilóide.