Há três anos, ao nos apresentar Invocação do Mal, James Wan conseguiu surpreender até mesmo os mais pessimistas, esgotados de uma geração de filmes produtos das mesmas ideias - eu, inclusive, era uma dessas pessoas que foi descrente ao cinema. Mas, o que se passou nas telas, embora tenha sido o de sempre, era um "mais do mesmo" melhor, aprimorado, mais sofisticado. Tornou-se perceptível a habilidade do diretor em explorar muito bem as cenas de suspense, a partir do escuro e algumas vezes até da subjetividade. Embora não tenha sido um grande filme de terror, ganhou destaque instantâneo, visto os fracassos recentes do gênero.
Embalado em seu grande sucesso, Wan usou a maré de sua boa reputação de diretor para trazer ao cinema a sequência de seu também bom trabalho anterior, Sobrenatural 2, e ainda presenteou a sua plateia com um filme solo daquilo que mais amedrontou em sua obra, a boneca Annabelle. Sobre os dois, ambos fracassaram cada qual com o seu motivo, seja pela presunção ao criar algo que nem Wan compreendia; ou pela alta expectativa criada em torno de si, mas que decepcionou pela pobreza de roteiro, de atuações e do terror de má qualidade apresentado. Talvez essa seja a melhor justificativa para resultados ruins: um diretor habilidoso que perdeu o controle ao pegar carona em grandes sucessos para criar sequências desnecessárias e completamente esquecíveis ao gênero, tornando seus filmes apenas parte daquela pilha de medíocres que estávamos acostumados de ver no cinema todos esses anos.
Eis que chega a sequência mais esperada, novamente com o casal Warren, ao lado do ótimo trabalho de marketing ao serem associados a fatos reais. Representados sempre da mesma forma em todos os filmes que protagonizam, neste, Lorraine está ainda mais sentimental, pessimista, desolada pelo o que sua habilidade psico-espírita lhe proporciona. Seu companheiro Ed, por outro lado, é persistente, tem expectativa e fé em seu trabalho. Na relação dos dois, são perdidos inúmeros minutos, ao tentar mostrar um lado mais humano do casal, as suas paixões e o que os une. Existe um excesso de sentimentalismo ao romantizá-los, após uma tentativa superficial de explicar a história da dupla. Além de não convincente, a narrativa torna-se completamente acessória, dispensável e até enfadonha. Sem mencionar ainda o quão deslocada a subtrama é, por natureza, ao gênero. Para alguns, assim como aconteceu comigo, essas cenas dedicadas ao casal podem ser longas demais e propiciarem pescadas bem oportunas.
Paralelo aos Warren e a sua relação conjugal, temos mais uma vez uma família, em uma casa mal-assombrada por uma força demoníaca que não quer largar o osso. Mais uma vez temos uma criança, a Regan McNeil do século XX, como centro, vítima dessa entidade. Mais uma vez temos os Warren envolvendo-se no caso, embora, mais uma vez, Lorraine não se sinta confortável suficientemente para isso. Mais uma vez, temos a sequência de sustos para estabelecer aquilo que habita aquela residência, algo tão poderoso, em intensidade que, mais uma vez, nunca foi outrora sentida. Mais uma vez, um final previsível, otimista, incompatível com o horror estabelecido.
Depois de tantas repetições mixadas com os problemas espírito-conjugais dos Warren, temos o nosso filme, que, com tantos prévios equívocos, ainda tinha que lidar com as limitações de seu roteiro. Em resumo, ao carregar a responsabilidade de filme sequência, as chances de erro eram enormes.
Após tantos minutos de sustos fáceis, diferentes tipos de entidades demoníacas aparecem, desde freiras a Crooked Man, além de um suspense mal aproveitado, é possível concluir que esse é o ponto mais alto, o ápice de uma geração baseada na eterna fórmula repetida, completamente vazia, dependente dos jump scares para causar susto e falso terror. Diferente de seu antecessor, que torna o clichê em bom suspense, a sua sequência passa bem longe de superar a previsibilidade. Toda cena de horror, é mal sucedida, mesmo aquelas que começam bem, sempre carregam os excessos de um diretor mal sucedido, obcecado por uma receita desgastada.
Comercialmente, talvez Invocação do Mal 2 obtenha êxito, alcance um bom número de bilheteria e um sucesso na opinião popular. Mas, como uma produção do gênero suspense/terror falha em todos os quesitos, inclusive naqueles onde pareciam os grandes acertos de Wan, foram também fracassos ao longo da narrativa. Os comentários positivos são consequência do excelente trabalho do diretor ao fazer o cinema inteiro pular da cadeira a cada susto barato que proporcionava. Já sabemos que assustar não é sinônimo de estabelecer o medo. O contrário, este é o caminho mais fácil de atingir o público e prender a sua atenção.
Há de se admitir, no entanto, como mencionei anteriormente, duas exceções que aparentam serem atributos no meio dessa bagunça: a primeira delas é uma cena em particular, que envolve a Annabelle de Invocação do Mal 2, a freira-satânica. Começa muito bem dirigida, com boa técnica, responsável por um suspense original, digno de clássicos do terror. Mas, como tudo nessa direção de Wan esbarra em excessos, termina em uma mistura brega de CGI com jump scare, destruindo toda atmosfera criada anteriormente.
A segunda exceção é o humor. Existem momentos genuinamente engraçados no meio desse caos, que são capazes de sacar risadas até dos menos interessados. Ainda sim, os problemas persistem, já que as circunstâncias tornam o tom da comédia excessivo demais. Há momentos, por exemplo, em que parece perdido o ritmo do filme afogado nas lágrimas do casal Warren, envolvido na narrativa da família em sua casa assombrada e na mistura de péssimo gosto do horror com o pastelão.
E, o final, é claro, não poderia ser diferente. Se você já assistiu aos últimos desse fenômeno recente, não crie expectativas diferentes. Não se decepcione. Tudo vai ser concluído exatamente do jeito que se espera dessa mente brilhante, por muito tempo perdida entre tantas outras em Hollywood. As cenas finais chegam a dar náuseas a qualquer cinéfilo que se preze, com uma resolução que beira o absurdo. Previsível, termina ainda com um discurso piegas-didático de dar arrepios. Se for assisti-lo, não esqueça o lenço.
Junto com A Bruxa, Invocação do Mal 2 encabeça a lista de filmes de terror mais esperados do ano. Os dois, contudo, estão separados por um abismo: enquanto Robert Eggers anda na contramão, apostando no subjetivismo, nas metáforas e na perspicácia do público, James Wan rema junto com a maré, mas com a fé única de ser capaz de reunir todas as repetidas fórmulas medíocres do terror para criar algo legítimo. Fracasso completo dessa vez, onde nem do medíocre consegue chegar perto.
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