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Infiltrados, Os

(Departed, The, 2006)
8,3
Média
1475 votos
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Sua nota

Críticas

Cineplayers

Scorsese volta ao mundo do crime em um filme que finalmente pode fazê-lo receber o Oscar.

9,0

O bom filho à casa torna. Após mais de uma década longe do universo dos gângsteres, Martin Scorsese volta ao mundo que o consagrou. E o fato é inegável: mesmo sendo responsável por grandes obras em outros gêneros – o recente O Aviador é um exemplo disso –, é quando lida com o submundo do crime que o cineasta torna-se praticamente insuperável.

Os Infiltrados, baseado em um longa chinês chamado Conflitos Internos, gira em torno de dois personagens colocados em lados opostos da lei. O policial recém-formado Billy Costigan é recrutado para trabalhar disfarçado na equipe do maior criminoso de Boston, Frank Costello. Enquanto isso, Costello coloca um de seus homens, Colin Sullivan, dentro do Departamento de Polícia. Quando Costello e a polícia desconfiam que têm um espião em seu grupo, Costigan e Costelo precisam fazer de tudo para proteger sua identidade.

Partindo dessa premissa interessantíssima, Scorsese e o roteirista William Monahan erigem um filme de narrativa praticamente irrepreensível, explorando com inteligência todas as possibilidades da história. Tudo, em Os Infiltrados, encaixa-se perfeitamente para a construção de um novo clássico do cinema: o trabalho de direção preciso, a complexa e bem desenvolvida trama e, claro, o sensacional elenco.

A primeira característica que chama a atenção na obra é a inteligência. Scorsese é um cineasta talentoso demais para colocar os tiros e explosões como destaque de seu filme, optando por virar seu foco para o desenvolvimento da história e dos personagens. Como conseqüência, Os Infiltrados apresenta uma trama elaborada com cuidado e precisão cirúrgica, um emaranhado de mentiras, traições e violência que sufoca os personagens e, por conseqüência, o espectador.

O espetáculo de tensão concebido por Scorsese e Monahan mantém-se sempre no limite, dando a impressão de que algo pode acontecer a qualquer momento. A tensão proveniente desta abordagem é reforçada quando se percebe a naturalidade com que aquelas pessoas encaram a violência. Assim, os perigos pelos quais passam os personagens de Sullivan e Costigan parece realmente palpável, mantendo a tensão à flor da pele. Além disso, todas as reviravoltas são orgânicas à trama, surpreendendo o espectador, mas sempre soando possíveis.

Sabendo, talvez, que apelar para a violência seria assinar o fim de suas jornadas, os personagens vêem-se em situações complicadas nas quais precisam utilizar o cérebro e pensar rápido para escaparem com vida. E é aí que Os Infiltrados revela-se mais fascinante do que a maioria dos filmes do gênero. Há, claro, a matança e o sangue (o que seria um filme de Scorsese sem isso?), mas todos pensam e usam a inteligência como forma de antecipar o passo do outro, em um jogo de gato-e-rato nervoso e genial. A violência, quando surge, não é gratuita, aparecendo como única opção para aquelas pessoas. 

Os personagens, aliás, são o núcleo de Os Infiltrados. Todos, inclusive os coadjuvantes, possuem suas motivações claras, aparecendo ao espectador como pessoas reais. Billy Costigan, por exemplo, é um jovem que tenta escapar do passado negro de sua família. Por essa razão, torna-se uma figura até certo ponto trágica ao ver-se ao lado do maior criminoso da cidade. No entanto, Costigan é uma boa pessoa e parece constantemente desesperado e receoso de conviver ao lado de assassinos. Leonardo DiCaprio assume o personagem com uma fúria até então desconhecida, conseguindo realçar o medo de Costigan junto a uma constante irascibilidade, parecendo sempre a ponto de explodir. Uma das melhores performances do ator.

Em contraste com a bomba emocional que é Costigan, Sullivan surge como um homem que parece – ou ao menos tenta – estar sempre com tudo sob controle. Sua auto-confiança é tanta que chega até a desafiar Costello, ainda que sua reverência ao “padrinho” continue. E Matt Damon brilha ao mostrar as rachaduras nessa confiança, transmitindo vulnerabilidade e insegurança por trás dessa fachada.

Mas a estrela do filme, sem dúvida, é Jack Nicholson. Mesmo com um elenco afiado como o de Os Infiltrados, o velho Jack continua como o astro maior, em torno do qual todos os outros orbitam. É ele quem abre o filme e são dele as melhores falas. Exibindo todo seu charme e magnetismo, Nicholson constrói um Frank Costello que exala perigo por todos os poros. Pervertido e violento, Costello trata a violência com a maior naturalidade do mundo. Aliás, essa sua forma de enxergar o grotesco rende cenas involuntariamente engraçadas, como brincar com uma mão decepada durante o café da manhã.

Embora DiCaprio, Nicholson e Damon sejam os maiores destaques, Os Infiltrados ainda conta com uma série de grandes atuações. Mark Wahlberg, por exemplo, só não rouba as cenas em que aparece porque todo o elenco está bem. Enquanto isso, Martin Sheen transmite seriedade no papel do chefe de polícia, ao mesmo tempo que em Ray Winstone ganha destaque como o braço direito de Costello.

Claro que todas estas qualidades só poderiam resultar em grandes momentos e Scorsese não decepciona nesse sentido. O roteiro cria belíssimas situações, transformadas em cenas orquestradas com maestria pelo cineasta. Dentre elas, a minha favorita é aquela na qual Sullivan telefone para Costigan e ambos permanecem em silêncio. Tudo é perfeito ali: as atuações de Damon e DiCaprio, a construção da tensão por Scorsese e a própria reação dos personagens.

Aliás, a direção de Scorsese em Os Infiltrados é de extrema elegância. Os grandes fãs do cineasta podem sentir falta dos típicos planos-seqüência, mas a verdade é que o trabalho do diretor é econômico e completamente voltado à história. A composição dos planos é impecável, assim como a transição das cenas, com diversos travellings e movimentos de câmera que ajudam a pontuar o ritmo do filme. Além disso, a utilização da trilha sonora é um show à parte – como não se empolgar ao ouvir Rolling Stones ou Pink Floyd em um filme como esse?

Seria injusto também não comentar o trabalho de edição de Thelma Schoonmaker. Eterna colabora de Scorsese, a montadora tem aqui um dos melhores trabalhos de sua carreira. Reparem como diversas cenas que certamente funcionariam isoladas são editadas como se fossem simultâneas, aumentando a tensão e dando mais fluidez à obra.

Mantendo o espectador preso durante suas duas horas e meia de duração, Os Infiltrados é uma aula de cinema, conseguindo explorar ao máximo todas as possibilidades da história. É o filme que pode, finalmente, fazer justiça ao talento de Scorsese e premiá-lo com o Oscar. Tenso, violento e magnífico.

Comentários (1)

Cristian Oliveira Bruno | quinta-feira, 28 de Novembro de 2013 - 17:13

Ver como um policial dedicado como Costigan entrando em desepero e um FDP como Sulivan se dando tão bem cria um clima de tensão ininterrupto, conduzido por grandes atuações de todo elenco comandado pelo mestre supremo entre os viventes, Scorcese.

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