Harry Potter e as Relíquias da Morte: Parte I
2001 estava acabando, eu tinha apenas 12 anos de idade e havia poucos meses, iniciei-me no mundo de Harry Potter. Em questão de semanas, li os três primeiros livros publicados, A Pedra Filosofal, A Câmara Secreta e O Prisioneiro de Azkaban. Também naquele ano de 2001, chegava aos cinemas o primeiro filme daquela que se apresentava como a maior saga de fantasia de todos os tempos no cinema. Harry Potter e A Pedra Filosofal levou milhões ao cinema, encantou crianças e adultos e estabeleceu de vez o ícone no entretenimento, seja nos livros ou nas telas. Harry Potter, o menino que sobreviveu, viria a protagonizar mais quatro livros até o derradeiro final, em 2007. Os filmes foram sendo produzidos gradualmente. E nove anos depois, estamos aqui. Fãs que eram crianças lendo essa saga, hoje são adultos. Eu tenho 21 anos e cresci com Potter, Rony e Hermione. E por todo esse histórico, por tantos anos de saga cinematográfica, o que mais se esperava - especialmente após o brilhante Harry Potter e o Enigma do Príncipe - era que a primeira parte de Harry Potter e as Relíquias da Morte fosse realmente épica e digna. Pois então: Accio filmaço!
A primeira parte do final épico de Harry Potter é tudo isso e mais. Pode-se criticar à vontade a opção dos produtores de dividir o filme em dois, nem tanto para contar mais a história, mas sim para lucrar umas verdinhas... Critique-se, enfim. Os produtores deram aqui o filme que os fãs esperavam. Uma tradução quase literal do último tomo da saga, elevando em escala geométrica a qualidade da saga e começando o término perfeito para a história de Harry Potter.
O enredo, a saber: com a morte de Dumbledore, o poder de Voldemort aumenta cada vez mais. Os Comensais da Morte tomam o Ministério da Magia, Hogwarts e iniciam a tomada do mundo bruxo, partindo para a eliminação dos mestiços e posteriormente, dos trouxas. Enquanto isso, Harry, Rony e Hermione partem para a jornada em busca das horcruxes - objetos que contém uma parte da alma de Voldemort. Eles devem destruir essas horcruxes, para que o Lorde das Trevas possa ser morto. Essa jornada será regada de sangue, dor, incompreensão e medo. As Relíquias da Morte do título referem-se a três objetos que juntos, permitem a seu portador ser o senhor da morte.
Nunca a série HP foi tão intensa, emocional e aterrorizante como agora. O último livro é assim também e, aproveitando que a maioria dos fãs hoje são adultos, o diretor David Yates (no seu terceiro filme à frente da saga) e o roteirista Steven Kloves não hesitam em imprimir uma atmosfera opressiva, pessimista, nem em ser explícitos. Diversas cenas do filme são antológicas: a primeira, em que Hermione apaga ela mesma da memória dos pais, para protegê-los; a morte de Caridade Burbage, na mansão dos Malfoy; a tortura praticada por Belatrix em Hermione; e a morte de Dobby, no final, cena esta que arrancará muitas lágrimas dos fãs ("que lugar lindo para se estar com os amigos").
Auxiliado pela fotografia de Eduardo Serra, bem como de magníficas locações, o diretor Yates usa impressionantes enquadramentos, mais amplos em algumas cenas, ou com a câmera na mão em outras. A fotografia dá o tom intimista da história e novamente aproveita o azul e cinza. Yates ainda usa algumas locações simplesmente desertas, dando a impressão de um cenário pós-apocalíptico, pontuando a jornada solitária do trio na busca das horcruxes. Aproveitando a literalidade da história, Yates permite-se fazer cenas mais demoradas, buscando detalhes, aprofundando diálogos.
Ainda falando de Yates, ele é conhecido pela pintura política em seus trabalhos. Com Harry Potter e a Ordem da Fênix, essa impressão foi significativa, onde os alunos rebelavam-se com a "ditadura" de Dolores Umbrigde. Agora, Yates coloca a ascenção bruxa sobre mestiços e trouxas como uma analogia ao nazismo: bruxos são julgados para ter sua origem determinada, trouxas são seres a serem eliminados, buscando a pureza dos bruxos. Isso sem falar nos símbolos usados, bem como no monumento que pontua o cenário do Ministério da Magia: um gigantesco bloco de pedra esmagando trouxas. Mais direto, impossível.
O maior feito de HP7.1, sem dúvida, é a evolução interpretativa de Daniel Radcliffe, Rupert Grint e Emma Watson. Durante as 2h26min de filme, o trio praticamente não sai de cena, sendo exigido o tempo todo. E para nossa alegria, eles entregam sua melhor atuação na série. Radcliffe segue na competência de sempre, mas chega a ser curioso que ele, protagonista que é, fique um pouco apagado pelo desempenho brilhante de seus companheiros de cena. Grint, então reserva histriônica dos filmes, agora ganha mais nuances dramáticas, transpirando medo e tensão pela incerteza do futuro, pela família que ele pode nunca mais ver. Sua atuação fica mais expressiva no confronto de Rony com Harry, o que culmina com a partida do ruivo. Foi sem dúvida uma evolução notável e que chegou a tempo. Contudo, Emma Watson é o nome do filme. A menina inteligente e que sempre acaba salvando os amigos agora também teme pelo futuro. Sua dor ao apagar-se da memória dos pais é tocante. E a relação com Harry e Rony tem momentos difíceis ao longo da narrativa. Watson fica na linha tênue entre o desespero e a serenidade e, com Radcliffe, protagoniza duas cenas marcantes: a primeira é uma cena em que Harry e Hermione dançam na barraca (tal cena inexiste no livro). É uma cena que quebra um pouco a narrativa, pela curiosidade, mas acima de tudo, por mostrar que em meio ao terror, eles ainda tentam manter-se de pé. A outra cena não ocorre de verdade, é fruto de uma visão provocada por uma horcrux: Harry e Mione se beijam e trocam carícias um tanto ousadas. Opção arriscada, mas ainda assim muito interessante.
Os adultos também estão perfeitos (não há aqui nenhuma atuação menos que excelente). Ralph Fiennes segue macabro como Voldemort. Jason Isaacs entrega um Lucius Malfoy inseguro do próprio destino. Bill Nighy, como Rufus Scrimgeour, se destaca. Rhys Ifans é outro destaque, como Xenofílio Lovegood. Mas o nome adulto do filme é Helena Bonham Carter. Sendo o vilão que mais aparece no filme, como Belatrix Lestrange, Carter dá um show, abusando do veneno e impondo ao público algumas cenas do mais puro terror, como a tortura que ela pratica em Hermione.
Tecnicamente, o filme segue brilhante. A trilha sonora de Alexandre Desplat é imponente, magnífica. Os efeitos especiais seguem incríveis. Figurinos, estão ótimos. A direção de arte, se não for indicada ao Oscar, será uma grande injustiça, tal a perfeição de detalhes e cuidado como tudo foi realizado. Uma curiosidade que merece aqui destaque é a opção em apresentar o conto das relíquias da morte (de "Os Contos de Beedle, o Bardo) em animação. O desenho é muito bonito e pontua de maneira peculiar a trama.
Em julho de 2009, quando comentei O Enigma do Príncipe, eu disse o seguinte:
A série está chegando no clímax e desde já, estamos todos ansiosos pelo final, que só chegará às telas em 2010 e 2011. Nessa balada, as duas últimas produções atingirão o ápice, a perfeição.
Eu sinto que estava certo. Para quem é fã, Harry Potter e As Relíquias da Morte - Parte 1 é simplesmente perfeito. Foi dividido? Sim, foi. Todos com certeza prefeririam ver a história terminar de uma vez. Mas os fãs também merecem um final épico, à altura desta saga monumental. Nunca um filme de Harry Potter foi tão literal. Chegamos ao primeiro estágio da perfeição. Agora é esperar por julho de 2011 para o derradeiro final da saga. Preparem os corações potterianos.
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