Vivendo o acaso
“A gente se esforça tanto pra prever as coisas, mas uma coisa acontece agora e a gente não sabe onde vai dar”
Com uma trilha sonora envolvente e forte presença durante todo filme e tendo São Paulo e seu caótico trânsito como metáfora sobre a vida, o longa Não por acaso mostra como tentamos controlar nossas vidas e como o destino se coloca forte diante de nós.
Primeiro conhecemos Enéias (Leonardo Medeiros), um homem quieto, com uma vida presa ao seu trabalho, ou seja, seu trabalho é a sua vida. Trabalha guiando o transito por sistemas eletrônicos, sendo assim, conhece todas as ruas, vias e rodovias da cidade. Tenta guiar e conduzir sua vida como controla o transito em seu trabalho. Tudo segue normal até que um acidente de trânsito envolvendo sua ex-mulher muda sua visão sobre os fatos que lhe cercam. Ele simplesmente perde toda a estrutura. Mas outro porém acontece novamente na vida dele. Após alguns dias, aparece em sua casa uma garota chamada Bia (ver nome) que diz ser sua filha que havia descoberto pela mãe pouco antes dela morrer a verdade sobre ele.
Depois somos apresentados ao Pedro (Rodrigo Santoro), um jovem dono de bar que adora jogar sinuca. Mas o jogo não é simplesmente uma diversão, mas um modo de levar a vida. Ele fabrica mesas e tenta participar de torneios. Namora uma garota simpática que ele ama. Ela acabou de se mudar para o seu apartamento e passou a alugar seu antigo apartamento para Lucia (Letícia Sabattela). Tudo seguia normal na vida de Pedro até que ela morre no mesmo acidente de trânsito que envolveu a ex-mulher do Enéias.
A partir desse momento o filme mostra como esses dois personagens reagem a esse acidente que não estava planejado em suas vidas. Tanto o trânsito como a mesa de sinuca mostram como tentamos controlar nossos passos e escolhas. Tudo é calculado e direcionado de forma sistemática, nada pode sair errado, porém, quando algo sai, todos ficam paralisados, perplexos, sem reação. Mas do mesmo modo como surgem fatos que nos deprimem, a vida nos coloca escolhas e situações que podem ser o momento de nos levantarmos e seguirmos adiante com a vida. Para Enéias é a descoberta de ter uma filha e a nova sensação de ser pai, para Pedro é a chegada de forma inesperada de Lucia. Seus personagens estão amargurados e ressentidos, mas ainda tentam viver. É nesse ponto que o filme toca e passa a ser tão comovente. Há muito mais silêncio do que palavras. Muito mais momentos de dor do que alegria, nada é forçado entre os personagens. As paisagens completam o que eles sentem. Eles não falam dos seus sentimentos. Nada é dito, nada é falado ou comentado, mas podemos perceber pelos seus olhares perdidos, seus diálogos não completados. Se as imagens das ruas e avenidas materializam a dor e a tentativa de compreensão de tudo o que aconteceu no personagem de Enéias, com Pedro, as imagens das bolas sobre a e mesa e como elas são batidas e rebatidas formando movimentos calculados e precisos mostram a desorientação de Pedro em não conseguir entender como aquela catástrofe podê acontecer.
Um filme brasileiro fora dos padrões da estética da fome ou pobreza que consegue captar a alma, a dor e angústia de seus personagens.
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