Dentre todos os gêneros cinematográficos, três em especial sempre me despertaram um maior fascínio: o western, os filmes sobre gangsteres e o film noir. Possuem características fortes e exclusivas e formato narrativo peculiar o que o tornam inconfundíveis. Atribuída as devidas características, Chinatown encaixa-se perfeitamente no clássico e charmoso noir, sendo não apenas mais um ou uma mera homenagem ao gênero, mas um dos melhores film noir já realizados.
Um detetive particular chamado J.J. Gittes (Jack Nicholson) recebe a visita de uma mulher que acredita que seu marido, um homem poderoso e chefe do Departamento de Água, está traindo-a e pede uma investigação para confirmar suas suspeitas. Após o caso aparecer no jornal, uma mulher aparece para o detetive dizendo ser a verdadeira esposa, Evelyn Mulwray (Faye Dunaway), e diz que irá processá-lo. Após ter sido enganado e acreditando ter sido vítima de um plano para prejudicá-lo ele vai buscar respostas com o homem que investigou, mas ele aparece morto em um reservatório de água. Gittes se vê em meio a poderosos magnatas, irá realizar investigações que poderão lhe afetar fortemente.
Confesso que pouco entendi sobre o filme em todo o seu decorrer e acredito que essa foi a sensação de grande parte de quem assistiu ao filme. O roteiro é de uma complexidade em que os fatos acontecem com extrema clareza, mas requer uma maior atenção do público para a compreensão dos acontecimentos. É aí que o filme se torna uma obra-prima, em seu roteiro, que de todas as suas perfeições a maior delas é nunca subestimar o seu público. Ser complexo é bem diferente de ser sem sentido. E ao reconhecer o público como capaz de diferenciar as duas coisas engrandece ainda mais esta obra. O roteiro é brilhante, todas as características noir (com exceção da utilização da narração) adaptadas, os personagens perfeitamente criados e incluídos a trama com a devida relevância, diálogos fortes e bem criados, situações brilhantes, enfim, um roteiro impecável. O fato é que ele não é um simples roteiro típico de um noir, não é previsível como a maioria dos filmes do gênero, não segue o mesmo traçado em todo o decorrer da trama, suas reviravoltas resultam em um filme de extrema imprevisibilidade.
O impecável roteiro consegue se converter em um impecável filme através da magistral direção de Roman Polanski, que demonstra suas virtudes ao explorar cada detalhe de seu roteiro, por menor e insignificante que seja, não que o filme seja repleto de detalhes insignificantes, mas o modo como Polanski trata com seriedade o seu trabalho é impressionante, por isso ele é considerado tão polêmico. Consegue ditar o ritmo com coerência e eficácia do filme como poucos diretores, intriga o espectador e o prende criando todo um clímax espetacular, resultados de sequencias incomuns e enigmáticas. O filme cresce a cada momento, fruto da excelente direção de Polanski, que criou tensão até mesmo nos bastidores. Em uma cena em que a atriz Faye pedia para ao banheiro e Polanski não autorizou, dizem que a atriz jogou um copo com urina no rosto do diretor.
Um dos aspectos mais charmosos do filme é sem dúvidas a trilha sonora. Cria climas suaves e ao mesmo tempo tensos, e com os personagens moralmente ambíguos na tela resultam em cenas de perfeição. Um fato a perceber é o de que em todas as cenas do filme o personagem de Nicholson está presente, em alguns momentos pode até passar despercebido, mas ele está sempre lá, com seu personagem que resume todo o estilo necessário para um protagonista de um noir, especialmente pelo seu estilo de se vestir. Jack Nicholson consegue perfeitamente resplandecer e em um dos melhores e mais difíceis personagens de sua carreira consegue uma atuação magnífica, soberba e coerente e merecedora de prêmios (indicado ao Oscar naquele ano e vencedor do Globo de Ouro e do BAFTA). Como todo noir que se preze, a presença de uma femme fatale envolvida com o protagonista é quase que obrigatória. A femme fatale é interpretada por Faye Dunaway e realiza de forma plausível seu papel, sempre causando uma dúvida no espectador com suas ações inconfiáveis (Indicado na categoria de melhor atriz no Oscar, Globo de Ouro e BAFTA).
Um belo filme que sem dúvidas irá provocar revisões, e em cada revisão esta obra irá crescer. Instigante em todo o seu decorrer, em nenhum momento torna-se cansativo ou até mesmo previsível. Não venceu o Oscar de melhor filme naquele ano, que ficou, de forma incontestável, com O Poderoso Chefão: Parte II (The Gotfather: Part II, 1974). Além de melhor filme, Chinatown foi indicado a outras nove categorias (Melhor Diretor; Melhor Direção de fotografia; Melhor Edição [sublime, diga-se]; Melhor Som; Melhor Trilha Original; Melhor Direção de Arte; Melhor Ator [Nicholson]; e Melhor Atriz [Dunaway]). No Globo de Ouro venceu em quatro categorias das sete indicações. O filme teve o seu devido reconhecimento, e é certamente um dos melhores da década de 70.
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