Flores Raras caiu na boca do povo muito antes de sua estreia. Quando ainda estava na fase de pré-produção, o longa teve muitas dificuldades para obter recursos. “O Brasil ainda é um país muito conservador”, resumiu o diretor Bruno Barreto durante uma conferência de imprensa no Festival de Gramado deste ano, onde o filme foi exibido. Segundo ele, a abordagem de um tema considerado tabu afugentou os patrocinadores. “Foi um trabalho muito difícil de ser produzido, pois é uma história que vai contra a corrente”, explicou. “O pessoal de marketing, que é quem decide os patrocínios para os filmes, não quer associar sua marca à homossexualidade”, completou. Para cobrir o orçamento de 13 milhões de reais, Barreto teve de tirar dinheiro do próprio bolso. Hoje, ele enfrenta problemas parecidos na captação de recursos para seu próximo projeto, a comédia “Crô”, inspirada no personagem de Marcelo Serrado na novela global “Fina Estampa”. Mais de um ano depois, Flores Raras saiu e estreou em 150 salas de cinema no primeiro final de semana. O resultado, apesar dos esforços, não é tão bom quanto poderia.
Este, muito provavelmente, seria o candidato brasileiro ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro caso fosse elegível. Como a maior parte do longa é falada em inglês, ele não poderá concorrer à indicação. Mas se dependesse da vontade do diretor, que já foi indicado em 1998 por “O Que é Isso, Companheiro?” - e chegou inclusive a comparar sua nova empreitada ao premiado O Segredo de Brokeback Mountain -, "Flores Raras" certamente receberia essa e outras indicações. Afinal de contas, trata-se de um filme feito nos moldes para conquistar a tão almejada vaga nos Academy Awards: narrativa quadrada e clássica, com ótimo trabalho de reconstrução de época, boas atuações e um tema polêmico.
Acontece que “Flores Raras” é quadrado até demais. Sua primeira parte é apressada e o relacionamento entre a arquiteta brasileira Lota de Macedo Soares e a poetisa americana Elizabeth Bishop começa de forma abrupta e artificial. Barreto não dá espaço para que a história das duas se desenvolva naturalmente e, num piscar de olhos, elas estão apaixonadas e Lota empenhada na construção de um estúdio para a nova amante – na casa que, aliás, ela dividia com outra mulher até um dia antes. Já a segunda parte, que não fede nem cheira, pelo menos dá espaço para as atrizes brilharem, o que acaba sendo positivo para um filme que não sai da mesmice. A australiana Miranda Otto (O Voo da Fênix) transita muito bem entre o jeito recluso e tímido de Bishop e suas crises de alcoolismo. Glória Pires (com um “quê” de Helena/Cláudio de Se Eu Fosse Você), apesar do inglês esquisito, encarnou perfeitamente os trejeitos da arquiteta que idealizou o Aterro do Flamengo e que apoiou o golpe militar de 1964. Não há dúvida de que elas são o que o filme tem de melhor. Na verdade, Barreto e seus produtores estão tão cientes disso que já sinalizaram campanha para as atrizes na corrida do Oscar. Por isso, o marketing do filme fora do Brasil está cada vez maior e até nome em inglês já tem: “Reaching for the Moon”. Já foi exibido no Festival de Berlim e deverá estrear nos Estados Unidos entre outubro e novembro.
“Flores Raras” é um conjunto de bons elementos que, somados, resultam num trabalho apenas ok. Falta tempero e falta, principalmente, coragem ao diretor Bruno Barreto para inovar. A história de amor entre esses dois ícones da literatura e da arquitetura mundiais merecia um filme mais ousado.
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