Cisne Negro (Black Swan. 2010). Qual teria sido a pressão maior a essa me-Nina?
Indo assistir “Cisne Negro“ já estava ciente de que a personagem principal, Nina (Natalie Portman) passava por um distúrbio psíquico. A profundidade dele, só vendo o filme. Por ser eu uma cadeirante, logo com certas limitações, e até mesmo adequações frente a uma nova realidade, batia em mim também uma curiosidade em ver o que ela faria, já que galvava o papel principal na nova montagem do “Lago dos Cisnes“. Claro que estou ciente de que limitações motoras não dá para se comparar com as mentais. Diante disso, fui disposta a observar os maiores detalhes que eu pudesse, de Nina e todos em sua volta. E irei trazê-los para cá. Com isso o texto terá spoiler.. Ficando também a sugestão de que assistam primeiro esse filme. Que o considero uma Obra Prima da performance da Natalie Portman.
Durante as primeiras cenas, me veio a lembrança da Phoebe, personagem de Elle Fanning em “A Menina no País das Maravilhas“. Por ambas terem adentrado num mundo da fantasia. Um meio de escaparem das pressões do mundo real. Outro ponto em comum que também me chamou a minha atenção: foram o papel das mães. No sentido de quanto influenciavam na vida das filhas. No conflito interno que padeciam. A mãe de Phoebe retirou a filha das mãos de um Psiquiatra, por achar que o problema seria por não ter tido tempo para a filha. Já a mãe de Nina, Érica (Barbara Hershey), mantinha uma dedicação quase integral. Quando não podia estar junto da filha, tinha outros olhos a lhe informar dos passos da Nina no Teatro. Falando em olhar, o da Érica sobre a filha parecia vampirizar a me-Nina. Meio assustador! Excelente atuação da atriz. E até por conta disso, nem lhe passou pela cabeça procurar ajuda por Profissionais da área Psico.
Esse também é um ponto que irei abordar: da busca por uma Terapia. O termo é mais difundido como o de fazer um hobbie. Algo para desanuviar a mente ante a uma pressão, ou bloqueio… Enfim, até pode ser. Mas há de se pesar de que cada caso, é um caso. E só quem poderia avaliar com mais precisão seria alguém que estudou para isso. Sendo ele um profissional sério, saberá encaminhar para um especialista. Como leiga no assunto, me pareceu que o problema de Nina poderia ser pelo menos atenuado com medicação pescrita por um Psiquiatra.
Como eu fui com um olhar em buscar pelos sinais do distúrbio da Nina, o de se coçar até ferir, foi um deles. Sendo nas costas, seria outro já adentrando nos ensinamentos de Jung – a Sombra. Como também para quem gosta de Astrologia – a casa 12. A Phoebe também se autoflagelava como uma punição. No caso da Nina, a princípio, ela nem se dava conta disso. Era como se o seu outro “eu” que fizesse isso. Pode até ser que esse coçar… aos olhos de um Profissional, já se seria um sintoma. Para mim, seria um aviso de que minha filha estaria passando por um problema que a cabecinha dela não estava dando conta do recado. Um diálogo aberto me levaria a outros sinais.
No caso de Nina, sua própria mãe é quem nos fornece maiores detalhes. Que para ela eram todos contornados em tratando a filha como uma criança, ainda. Volto a destacar a atuação da Hershey: foi brilhante! Cheguei a ficar com raiva dela com a solução que ela deu. Conto? Contarei sim. Mas antes, já que a mãe via aquele coçar até se ferir como Compulsão, fui pesquisar por um significado. Trouxe esse do site do Dr. Dráuzio Varella:
“O comportamento compulsivo se caracteriza por uma pressão interna que, em determinadas situações, faz com que a pessoa se sinta impelida, tomada por desejo muito forte de realizar uma ação que gera prazer principalmente nos estágios iniciais, mas que depois provoca sentimentos de culpa e mal-estar.”
Para mim, não se aplica no comportamento da Nina. Mesmo se tratando de uma compulsão, não seria cortando as unhas que iria resolver. Porque poderia se coçar com objetos que iriam ferir mais. Como a mãe veio com um – “Você voltou a fazer!” -, então era hora para procurar por uma ajuda. Na cena em si, cheguei a ficar com raiva dela, em tratar a filha como um bebezinho. E vendo o quarto de Nina, via-se ali os sonhos ainda da infância. Ainda uma adolescente. Achei-o sufocante.
Antes de prosseguir, deixo uma indagação: Por que ainda nos dias de hoje há tanta resistência em se procurar por um profissional da área psi? Hora desses profissionais retirarem esse ranço antigo. De que são só para “loucos”.
A mãe de Nina fazia tudo isso por projetar na filha aquilo que ela não conseguiu ser: uma bailarina de destaque. O fato de ficar sempre como pano-de-fundo, a levou a outros caminhos. No filme não faz referência de como se engravidou de Nina. Se foi algo do tipo: teste de palco. Também não há indícios se houve em algum momento uma figura paterna. Não que seja algo imprescindível, mas no caso de Nina essa ausência terá uma consequência. Conto mais adiante.
Essa transferência – o filho será o que não conseguiu ser -, é algo muito forte na cultura estadunindense. Por polarizar: ou se é um winner, ou se é um loser. Mas também está presente na relação – pais e filhos – de outros países. A mãe de Nina a responsabilizava de que com o seu nascimento teve que abandonar a própria carreira aos 28 anos de idade. Algo que me fez lembrar da personagem principal de “Comer Rezar Amar“, onde às vésperas de completar 30 anos, ainda não se via como mãe. Para muitas das mulheres, atualmente, e que querem ser mãe, deixam para ter filhos após os 25 anos. Até para se dedicarem mais esse novo papel em suas vidas. Por conta disso me peguei a pensar de que a gravidez de Érica fora algo indesejado.
Não sei o quanto pesa na vida de uma mulher o fato de tentar conquistar a posição de 1ª Bailarina numa Grande Companhia de Balé. Desconheço os meandros. Sendo assim parto de supor de que alguém tendo 28 anos de idade se ainda não “aconteceu”, ficará difícil alcançar esse posto. Assim, não há desculpas convincentes para as cobranças da mãe de Nina. E a filha ao soltar as primeiras amarras, diz a mãe que ela sempre faria parte do corpo de balé, nada além disso.
O Lago dos Cisne, ou melhor os dois personagens principais – o Cisne Branco e o Negro – pediam por alguém jovem. Que se tivesse condições, uma única bailarina faria os dois. Havia também o fato de que a Companhia passava por uma grande crise financeira. Dai, precisando de uma carinha nova; de sangue novo. Por conta disso aposentam a até então primeira bailarina: Beth. Grande atuação de Winona Ryder.
Nina admirava Beth. Aspirava ser perfeita como ela. Buscava pela perfeição em seus ensaios. Que não passou despercebido pelos olhos da Companhia, no caso, do Coreógrafo Thomas Leroy. Uau! Vincent Cassel me surpreendeu nesse papel. Foi brillhante! Não caiu em esteriótipo. Seu coreógrafo não me levou a pensar em seus outros papéis. Pode até ser que essa atuação não seja o seu divisor de água, mas está de parabéns.
Thomas fora um Mentor diferente. Ciente da capacidade de Nina, faltava ingressá-la na Sedução o qual o Cisne Negro exigia. Nina já possuia a candura necessária para o Cisne Branco. Um jeito menina de ser. Lhe faltava descobrir a mulher fatal dentro de si e trazê-la à superfície. Bem, poderia apenas aflorar o poder de seduzir, mas a pressão do momento exigia muito mais.
Thomas faz isso de um jeito encantador. Fica meio difícil acreditar que um Pai, mesmo hoje em dia, daria o mesmo conselho. Dai o vi como um Mentor. Indo além, como um cara de bom caráter que sabe esperar que a jovem também o queira para uma relação íntima. Um cavalheiro à moda antiga. Mesmo que as verdadeiras intenções de Thomas eram fazer dela – de fato e de direito - a 1ª Bailarina da nova versão do Lago dos Cisnes.
Seu conselho foi para se masturbar. O primeiro passo para sentir os prazeres do próprio corpo. E então poder exteriorizar essas sensações até para ajudar no processo de sedução. Pois o Cisne Negro teria que ser bem provocante com a platéia. De modo a surpreender a todos com as duas formas de sedução em cada um dos Cisnes. O angelical, do Branco. O de mulher fatal, do Negro.
Com isso a me-Nina cresce. Fazendo uma revolução em sua vida. Que até poderia ter vindo como uma consequência natural de vida: infância -> adolescência -> maturidade… Mas tendo a mãe lhe pressionando a não crescer, talvez para que chegasse ao estrelado ainda com o frescor da adolescência. Essa mãe também deveria fazer uma Terapia.
Por estar sempre cobrando o seu nascimento, me veio a impressão que ficou no subconsciente de Nina uma aversão a uma relação hetero. Nina passa isso quando um carinha em uma boate, a leva para um cantinho. Com o Thomas não foi um desejo carnal, mas em aprender rápido o que ele queria na interpretação do Cisne Negro. Como se não bastassem as pressões – uma doença em evolução, a mãe, a posição de Primeira Bailarina, o sentimento de culpa pela “aposentadoria” da Beth, o querer ser perfeita na carreira, não conseguir se enturmar, o coreógrafo lhe cobrando numa mudança para então fazer também o Cisne Negro… Enfim, se não fosse tantas pressões, o própio Thomas lhe traz mais uma: uma bailarina para ficar como substituta. Já que “o show não pode parar“… a Companhia precisava ter alguém à altura do espetáculo.
Ela é Lilly (Mila Kunis). Se Nina pudesse raciocinar com calma, veria que ali dentro não teria concorrência. Nem Lilly lhe tiraria a vaga. Já que ela não trazia o porte elegante de Nina. Lilly pendia mais para a vulgaridade. Tinha talento sim, mas para se encaixar na disciplina do Balé Clássico, Lilly precisaria de muito treinamento.
Inocentemente, Nina busca em Lilly tudo aquilo que não consegue ser por si mesma. A carência por uma amizade, a leva a se entregar de corpo e alma a Lilly. Onde realidade e fantasia se misturam em sua mente. Mas essa, por sua vez, cerca Nina de todos os modos. Esperando os momentos certos para atacar. A maldade em Lilly lhe era tão natural, que cegava a visão de Nina. Não vendo que o que Lilly pretendia mesmo era destronar Nina. Ela só descobrirá já um pouco tarde.
Nina, que antes tinha a lhe assombrar o Cisne Negro… direciona a sua limitação em aprender com essa nova amizade. Sem ter consciência da sua nova realidade, no caso, de ter uma outra personalidade, a faz também um objeto de desejo. Ao se masturbar, Lilly se materializa. Onde eu não vi como sendo a descoberta de uma homossexualidade. Era o seu outro “eu” querendo ser provocativa. Me fazendo lembrar de “Uma Mente Brilhante“, onde o “colega de quarto” do personagem principal, o Nash (Russel Crowe), também era o seu contraponto. Mas esse teve alguém que lhe amava e conseguiu ver a real situação do marido. Diferente de Nina que não teve ninguém que pensasse nela como uma pessoa, e que precisava de ajuda. Só pensavam neles. Quando a então notaram… já era tarde demais.
“Cisne Negro” também aborda uma outra mudança atual. Até um tempo atrás, era muito comum ver menininhas em uniforme de Balé. Fazia parte do sonho infantil: ser bailarina. Até as com tendências a engordarem, eram encorajadas numa tentativa em mudarem seus hábitos alimentares. Além disso, elas também ganhavam as primeiras noções dos Clássicos: Música e Dança. Eu não sei se a intenção do Diretor era em mostrar o total desconhecimento dos Clássicos pelos jovens de hoje. Muitos dos quais buscam em serem Celebridades sem o menor esforço, e com muito menos estudos. Um pouco de Cultura, não faz mal a ninguém. Aronofsky leva isso nos dois jovens que Nina e Lilly conhecem na boate. Ambos sequer tinham ouvido falar do “Lago dos Cisnes”.
E qual teria sido a pressão maior a essa me-Nina?
Para mim a grande vilã dessa estória foi a mãe de Nina. Que a conduziu até a borda daquele precipício. Final emocionante. Para ficar na História do Cinema.
Ao fechar as cortinas…
Bravo Natalie Portman! Sua Nina entrou para a Lista das Grandes Personagens Femininas! Aplausos também a todos! Desse excelente filme.
Por: Valéria Miguez (LELLA).
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