A vingança e o poder do cinema.
"O cinema é o modo mais direto de entrar em competição com Deus".
Fellini
O cinema de Tarantino é extremamente delicioso. Cada pormenor dos seus filmes tem uma beleza de significados estonteante e arrebatadora. Bastardos Inglórios não foge à regra. Explode no filme referências aos westerns spaghetti de Sergio Leone a cultura pop (a cena ao som de David Bowie daria um belíssimo videoclipe), junto com a já conhecida violência estilizada tarantinesca.
Muitos das características que apontei no parágrafo anterior na obra do cineasta americano, muitos diretores hoje em dia também utilizam (bons exemplos são os filmes Scott Pilgrim Contra o Mundo e Kick-Ass); mas Tarantino vai muito além das simples referências: ele as utiliza para criar uma coisa maior, original e ambiciosa. E no filme isto fica bem claro: a intenção do cineasta é subverter a história oficial, construir a partir da arte cinematográfica uma visão paralela sobre a 2º Guerra Mundial. Tarantino não tem medo da empreitada, se reconhece com nenhum traço de humildade, como senhor do seu ofício. E como o Deus do Velho Testamento, é impiedoso com seus personagens. Todos de certa forma têm um grau de culpa e maldade. Radical, não?!
É curioso (e coerente) ser justamente os judeus os perpetradores da vingança. Os hebraicos (antepassados dos judeus) são o povo escolhido. Qualquer desvio de conduta são brutamente castigados por seu Deus. Quando seguem fielmente aos seus mandamentos, são seus inimigos que sofreram. Tarantino sabe disso, formando elementos para criar uma das grandiosas tramas de vingança já vista no cinema.
Neste filme há basicamente duas características primordiais. A primeira é a utilização magnífica da mise-en-scène. A cena inicial é prova disso. No diálogo entre o fazendeiro francês e o coronel nazista, Tarantino consegue mostrar toda a ambientação do local (as características rústicas da casa, o cachimbo dos personagens, o copo de leite). Em uma das tomadas ele consegue expor os personagens, a casa e até o carro dos soldados lá fora atráves da janela. Tudo muito bem enquadrado. Não há espaços descartáveis.
Esta característica liga-se a segunda: a tensão. Tarantino atráves dos seus diálogos afiados e instigantes, deixa o espectador angustiado. A cena da taverna é o exemplo cabal. A conversa entre os personagens vai se constituindo, e a qualquer momento você imagina que pode acontecer alguma coisa terrível. O cineasta não precisa utilizar de artifícios sonoros para criar esta atmosfera de tensão. Todos estes pontos estão aliados a uma fotografia estupenda e atuações maravilhosas – destaque para ator austríaco Christoph Waltz.
Poucos cineastas conseguem demonstrar tanta paixão por seu oficio. E também são poucos os cineastas que fazem o espectador se apaixonar e olhar o cinema como obra de arte. Tarantino é um deles.
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