Então vou falar agora um pouco sobre essa animação bela, ingênua e cheia de magia feita sob medida para agradar a criançada, tão colorida e cheia de personagens fofinhos... NÃO, ACHO QUE NÃO!
Um pequeno aviso aos que pretendem assistir a esse filme: vão minimamente preparados (psicologicamente) para assistir a algo, digamos, diferente de tudo que você já viu na tela do cinema! Com total ausência de pudor e driblando o politicamente correto, essa é mais uma comédia norte-americana que tenta fugir das amarras impostas pelo opressor mercado cinematográfico da atualidade, trazendo algo radicalmente liberal e escrachado em uma época em que o estabelecimento de uma censura mais elevada pode significar fracasso de bilheteria e prejuízos milionários. E já que teoricamente desenho animado é feito para chamar a atenção primariamente das crianças, o desafio do retorno financeiro é ainda maior. Ainda assim, a bilheteria arrecadada só prova que mesmo uma animação com classificação R (menores de 17 só acompanhados de responsável) pode ser bem sucedida: com um custo de produção de apenas US$ 19 milhões, o filme já arrecadou no mundo mais de US$ 120 milhões. E isso, portanto, é reflexo (ao menos em parte) do desejo do espectador em consumir algo diferenciado, que escape de convenções e conservadorismos típicos.
O corajoso estúdio que topou produzir e financiar Sausage Party foi a Sony Pictures, que com certeza não se arrependeu do investimento. Claro que por trás do projeto havia nomes como o roteirista Evan Goldberg (o mesmo de Superbad, É Hoje) e o ator, diretor e roteirista Seth Rogen (de É o Fim), o que obviamente pesou para a aprovação do projeto, mesmo arriscado. Contando também com vários nomes já conhecidos da nova geração da comédia americana, como Paul Rudd (Ligeiramente Grávidos) e Jonah Hill (Anjos da Lei), o filme veio com a força de seu elenco, bem como com o forte marketing, tornando-se assim um sucesso, principalmente nos EUA.
Basicamente, a história se passa em um supermercado, e os alimentos (e alguns objetos) possuem vida própria. Eles acreditam que os “deuses” (no caso os seres humanos) caridosamente os escolhem, os retiram das prateleiras e então os levam a um lugar chamado de “paraíso”, mas na verdade não sabem da verdadeira intenção que esses “deuses” possuem, até que finalmente chegam à cozinha de suas casas. Já se percebe por esse resumo analogias com questões religiosas, tema inclusive bastante explorado durante todo o filme. Vale ressaltar que eles não atingem apenas as religiões ocidentais! Alguns tabus envolvendo certas liberdades sexuais são amplamente abordados também dentro desse contexto, e sem nenhuma amenização, com direito ao uso de todo o palavreado “nobre” que a língua oferece. Por mais liberal e ‘mente aberta’ que você ache que seja não dá para não se surpreender com o tom de algumas piadas.
O filme não poupa o espectador de absolutamente nada! Temas como drogas e sexualidade são jogados em tela sem nenhum filtro, e quando não são explícitos, referências, duplos sentidos e trocadilhos estão lá, e a nossa mente consegue decodificar todas, instantaneamente. Algumas referências são um tanto óbvias, como por exemplo, colocar uma salsicha (Frank) e um pãozinho (Brenda) como protagonistas apaixonados. Um ponto que talvez seja importante ao assistir essa animação é não leva-la a sério em momento algum. Tratar como uma “tiração” de sarro ou até uma provocação por parte dos envolvidos seria mais interessante.
Mesmo tendo suas imperfeições, é curioso perceber as saídas do roteiro para tornar “crível” a transição entre as duas dimensões, a dos alimentos e a dos humanos, e como essas dimensões se conectam em determinadas partes. A inserção de “explicações metafísicas” por parte de um dos personagens pode ter sido uma saída mais fácil e genérica, porém divertida e eficiente!
É sempre instigante assistir trabalhos com originalidade e que tenham coragem para bater de frente com uma indústria tão conservadora. Sausage Party entra na restrita categoria em que já se encontram filmes como South Park e Team America, sem medo de ser grosseiro, querendo mais é “causar” mesmo. É claro que essas abordagens um tanto “modernas” poderão ofender algumas pessoas, inclusive pelo palavreado pesado sem censuras (inclusive na versão dublada em português), e, portanto, não é um entretenimento para todos os públicos. Inclusive, é preciso se estabilizar psicologicamente para acompanhar os últimos 10 minutos desse filme! Eu realmente não esperava! Eu e ninguém mais da sessão, pelo que pude perceber a partir das reações do público.
Portanto, Sausage Party é uma das comédias mais originais, despudoradas e politicamente incorretas lançadas na atualidade! Esse é o tipo de experiência cinematográfica que exige certo conhecimento prévio por parte do espectador acerca do que será encarado, mas para quem gosta do estilo, vale bastante à pena conferir!
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