O Anjo Negro(L'ange noir, 1994), é talvez o filme mais hitchcockiano da carreira de Brisseau. Planos, plongees e dentre outros jogos de câmera, dos filmes que vi de Brisseau é de fato o mais hitchcockiano. Mas a um fato que agrupa e envolve bem todo esse show de câmera em um propósito, trata-se de um filme noir que traz uma releitura a visão de Brisseau e como todo Brisseau é um filme de visuais lindos que esbanjam a riqueza natural, principalmente do corpo feminino, este sua fiel ferramenta para criar o que de filme em filme, usa o sexo sem tabu como uma das armas para alegar que a liberdade, o clichê que todos queremos viver, não é nada mais um consolo para essa talvez prisão física, espiritual.
O Anjo Negro(L'ange noir, 1994) é peça-chave na filmografia do francês por que principalmente esse, não só enrola um véu de influências cinematográficas sobre o filme, mas também por que prova essa relação original e única de todos os seus filmes. De Jogo Brutal(Un Jeu Brutal, 1983) até Coisas Secretas(Choses secrètes, 2002)), O Anjo Negro navega seja nessa hereditariedade presente em seu começo de carreira e esse ódio em forma de amor(ou vice-versa) que seus filmes vão aprimorando com o tempo, tornando tudo em um grande disputa humana que de perversa chega a se tornar selvagem.
Como um filme de investigação, Brisseau aposta bastante em planos-sequências que demonstram o poder de sua imagem(pois, afinal, Brisseau não monta ou distorce realidades, mas sim cria) sobretudo na femme-fatale de seu noir ou em sonhos e ilusões uma guerra hipócrita burguesa. Se no cinema clássico, o mistério era solucionado e tudo se acabava bem, aqui prefere optar por uma narrativa que remete muitas vezes a angústia sobre a vida amorosa nas lentes de Nicholas Ray, principalmente aqui, pois se retrata de um filme potencialmente crítico que desde o seu nascimento foi predestinado a tragédia e assim a retratar o mundo paralelo existente(seja espiritual, surreal).
Aqui, o filme de Brisseau respira de forma menos escancarada e cruel do que em Coisas Secretas(Choses secrètes, 2002), mas sim com sutileza e leveza(fatores que combinam com a persona de seu diretor) para transpor o surreal e a não importância da banalidade do real, que pode ser perfeitamente adequada a Stephane(Sylvie Vartan) a também a questão da juventude que é retratada não somente em seus mais recentes filmes mais principalmente em Os Indigentes do Bom Deus(Les savates du bon Dieu, 2000) junto com essa parcela do melodrama que já estava sendo estudada por Brisseau, aliás não a nada mais convincente em uma melancolia senão o desapego ou a mentira, sonho sexual que ninguém ainda na história do cinema filmou também tais atos.
Sendo um fã de Buñuel e Hitchcock, é impossível não notar a sua paixão pelo cinema(Brisseau é um daqueles ávidos amantes do cinema, únicos), principalmente como já disse anteriormente de Hitchcock, já que o tema e o gênero que o aborda para sua crítica é nada mais nada menos que o noir, algo que precisa, necessita dos toques e dotes herdados de Hitchcock, com sutileza, ainda é impressionante como a referências claras, como Janela Indiscreta(Rear Window, 1954) e Um Corpo que Cai(Vertigo, 1958). Talvez apenas a cenas de nudismo no caso de Anjo Negro(L'ange noir, 1994) e essa certa religiosidade com o proibido(bordéis, desejos...) que tanto cerca sua filmografia apresentem traços de uma surrealidade mais explorada e próxima, mas é intencional, a todo momento Brisseau tenta provar por meio de tudo isso essa distancia entre realidade e surrealidade, fantasia e realismo, banal e criativo que provém dos males, não daqueles que a humanidade comete contra si própria, como o assassinato, isso pouco importa para Brisseau(principalmente por que para ele, a vida é apenas um prólogo de todo esse filme que vivemos), mas sim, aquela que esconde, que destrói e descaracteriza, a hipocrisia.
Certa vez, ouvi dizer uma menção(própria de Brisseau) que escrever é um inferno. Brisseau é um roteirista mas sobretudo é um diretor, um cineasta que vê além dentre a morte e a vida, o que mais provoca a vontade de viver nessa vida, com sensualidade, provocação e tudo que se pode ter direito, o sexo, que negando ou não, na sociedade em qualquer lugar é o ápice do amor, a essência do perfume e fruto para toda essa criação, Brisseau é daqueles que devem ser preservado, por jamais um diretor chegou tão perto do que significa juventude, vida e morte, se Brisseau não chegou por completo, é uma peça importante para descobrimos e deixarmos livres, pois neste cinema, não a regras de impedimento, quem quiser que venha, mas que por favor, tire a máscara antes do início da sessão.
Comentários (0)
Faça login para comentar.
Responder Comentário