Estilo único e humor ácido marcaram a carreira deste brilhante diretor.
Autor de obras-primas como Nashville, M*A*S*H* e Short Cuts – Cenas da Vida, além de grandes filmes como Três Mulheres e O Jogador, Robert Altman firmou seu nome internacionalmente fora dos padrões do cinema comercial e, em especial, Hollywood, tanto que nunca venceu o Oscar de melhor diretor, apesar de ter sido indicado cinco vezes – venceu, no início desse ano, um prêmio honorário em reconhecimento de sua carreira.
Na ocasião, disse que nunca dirigiu um único filme que não tenha desejado fazer – difícil de acreditar, no entanto, se levar em conta suas últimas obras, abertamente comerciais e fora de seu espectro, como A Armação (The Gingerbread Man, 1998), Dr. T e as Mulheres (2000) e De Corpo e Alma (The Company, 2003).
Se não foi reconhecido em sua terra, Altman no entanto foi aclamado na Europa, pois é um dos poucos artistas a vencer os três principais festivais europeus: M*A*S*H* venceu Cannes em 1970, Short Cuts, o Leão de Ouro em Veneza em 1996, e Oeste Selvagem (Buffalo Bill and the Indians) Berlim em 1976.
Satírico, hirônico, cáustico, Altman trabalhava com improvisação, grandes elencos (alguns atores eram recorrentes, como Lili Tomlin), tomadas longas e corajosas (filmou o pênis e um homem urinando de frente em Short Cuts), em filmes sempre repletos de diálogos cortantes, inteligentes e críticos, nos seus melhores momentos.
Seu auge foi na década de 70, quando dirigiu seu maior sucesso de bilheteria e crítica, M*A*S*H*, seu oitavo filme, um libelo pacifista que tirava um sarro louco dos militares americanos, da paranóia comunista e da Guerra Fria. No mesmo pique, filmou o western Quando os Homens São Homens (McCabe and Mrs. Miller, 1971), o noir O Perigoso Adeus (1973), para muitos seu melhor filme, e Nashville (1975) satirizando os “EUA profundo”, o meio-oeste americano conservador, reacionário, religioso, republicano. A fase de ouro terminaria no enigmático Três Mulheres (1977).
Daí em diante começava sua fase decadente, que durou mais de 15 anos, em especial depois do fiasco de Popeye (1980). O cineasta foi trabalhar na televisão e até como ator. Apesar de ter feitos ótimos filmes, como A Nave da Revolta e do sucesso da série televisiva M-A-S-H (que ele odiava), caiu no esquecimento. Dirigiu um espetáculo na Broadway, Come Back to the Five and Dime, Jimmy Dean, Jimmy Dean, depois adaptado para o cinema como James Dean, o Mito Sobrevivente (1982), sem nenhuma repercussão.
A volta por cima ocorreu em 1992, com O Jogador, com Tim Robbins, uma sátira à Hollywood em que Altman abriu imitando o famoso plano-seqüência de sete minutos que Orson Welles fez em A Marca da Maldade. Depois faria um de seus grandes filmes, Short Cuts (1993), baseado em contos e poemas de Raymond Carver. Na seqüência, apesar de Marcello Mastroiani e Sophia Loren no elenco, recebeu críticas negativas por Prêt-a-Porter (1994), em que ridicularizava o mundo da moda (grande atuação de sua habitual colaboradora Anouk Aimée) e Assassinato em Gosford Park (2001), que recebeu várias indicações ao Oscar, incluindo melhor filme, diretor e para as atrizes coadjuvantes Maggie Smith e Helen Mirren (em desempenho notável). Venceu como melhor roteiro.
O último filme foi A Última Noite (A Prairie Home Companion, 2006), em que um octogenário morre (mesma idade de Altman ao morrer) e uma das personagens (Virginia Madsen) diz que quando um homem de 80 anos morre isso não significa nada, o show tem de continuar.
Altman nasceu no Kansas em 1925 e foi um apaixonado por jazz. Foi piloto na Segunda Guerra Mundial e formado em engenharia pela Universidade do Missouri, mas nunca exerceu. Seu primeiro filme, Os Deliqüentes (1957), surgiu depois de trabalhar longamente para a televisão, dirigindo episódios de séries como Bonanza e Alfred Hitchcock Presents. Desde então, foi considerado um dos mais modernos diretores americanos, com seu estilo único de filmar, seu humor ácido e sua imensa caridade com os diferentes da sociedade, especialmente os marginalizados que sofrem de preconceitos da classe média branca americana.