Alien: A Ressurreição (Divulgação)
E esse aqui foi uma obra amplamente desconsiderada e de forma injusta? Tem altos problemas, mas tenta seguir um encaminhamento de resgate absorto e uma tramitação visual muito interessante baseada nos dois primeiros aliens. E arrisca nos temas, impondo-se com culhões dentro de um modismo, se fazendo com o uso de clonagem. Dentro disso, a putaria vai num crescente e os aliens aqui estão cada vez mais aterradores e protetores de uma rainha, e a direção de Jean-Pierre Jeunet aponta um caminho que se arvora no aporte do design de produção e na ameaça das aberrações. Não há mistério ou terror na miúda da escuridão, há a ação consciente das criaturas como algo funcional para impressionar – e violência no capricho. Aqui é um projeto que veio na esteira do invencionismo da clonagem para poder existir, já que a tenente Ripley papocara no filme anterior Alien 3 (Alien³, 1992), então a ideia mais franca fora a citada, com uma nova personagem que unisse características da antiga Ripley, suas novas experiências e habilidades físicas recém-adquiridas da raça alienígena. Uma primeira dica do trabalho de hibridismo que seria considerado polêmico dentro da cinessérie.
O diretor aplica uma camada de humor sarcástico que prima pela falta de tom e tato para com o que se ajambra. Simplesmente não encaixa entre os trâmites narrativos. E afirmo isto não de uma maneira salutar – afinal eu respeito bastante um descontrole e uma esculhambação –, mas aqui não se pisa no acelerador como poderia (deveria) e nem se equilibra na sobriedade que a série já estava propondo até então, o que acaba por deixar o material com um ar estrambótico apenas, mas sem o choque que poderia se debruçar. Escrito isso, o filme se dispõe ainda assim a possuir uma personalidade própria que o faz funcionar e ser bom de se acompanhar. Inclusive, quando propõe alguns exageros se sai bem – o alienígena híbrido é uma prova, polêmico e asqueroso, mas decente dentro da proposta. O assumir das apostas merece respaldo. A vantagem da autoralidade. O diretor já afirmara que tivera total controle por sobre a fita, e na mesma entrevista ainda acusa o fato da incompreensão do filme por ser artístico demais. Talvez seja uma defesa ególatra da questão por parte do sujeito, mas a minha verdade é que Alien: A Ressurreição tem sua aura idiossincrática sim, e tem sua gama de espectro intrigante em si.
Agora a protagonista é o clone Ripley 8, agora com funções díspares dos filmes anteriores. Sai a líder de grupo, mas ainda ficam resquícios severos da mãe, mesmo que esta esteja disposta a se livrar de sua prole torta em certa altura. Sigourney Weaver tenta dar um tom mais solto a sua personagem e não tentando emular declaradamente trejeitos da Ripley original, mais como uma espécie de sátira não intencional de sua personagem mais conhecida. O que acaba por deixar o todo desequilibrado, mesmo sendo uma ousadia interessante nessa escolha. Mesmo assim ela ainda possui um histórico seu que se justifique em dramas internos. O que acaba servindo para ela proporcionar, sim, uma grande cena na fita. O retorno dela via clonagem foi um oportunismo que beira um soslaio via zeitgeist. O tema era bem recorrente na segunda metade dos anos 90, em parte pela popularidade da experiência da clonagem da ovelha Dolly (que fora de impacto a partir de sua criação em janeiro de 1997). E Ripley 8 é um corpo dividido com uma Rainha Alien, que fora retirada de si após o processo de clonagem fazê-la atingir a idade adulta. E aqui entra um ardil: porque Ripley 8? O que significa esta numeração? Os clones anteriores respondem esta pergunta. E é nisso que se arvora a citada cena: o encontro de Ripley 8 com as experiências genético-laboratoriais anteriores a sua própria. É um contemplar ao mesmo de tempo de si com várias imitações falhas de si, sendo que ela era a oitava investida sobre sete fracassos anteriores. Uma situação tratada de forma certeira por Jean-Pierre Jeunet diante de uma experiência esquisita e complexa de uma obra já estranha por si só. E é no galgar disso que se monta esta cena, com um tom de descoberta macabra a dar espaço para o vazio existencial propalado por sobre Ripley 8 que estava a se descobrir quando se deparara frontalmente com o que diabos ela era: só mais uma peça num quebra-cabeças ganancioso. E aqui brilha a percepção em se apontar a câmera para as criaturas mortas e estampadas em tubos para contemplação mórbida de outrem cientistas. É a constatação do mau uso da ciência e suas consequências mentais e físicas sobre as vítimas do processo. A reação de Ripley 8 mostra-se genuína em seu desespero por estar lidando com semelhantes suas (uma delas torturantemente ainda viva) em deploráveis estados de agonia e morte, assim como aponta para o significado do que realmente ela possa ser considerada como sujeito. O tenebroso de ver a si mesmo como nada mais como uma experiência, assim como a obrigação de dar um fim naquilo tudo. A carga dramática mais interessante desse negócio, apela para o asco, mas de forma genuína. Sem melodramas inúteis.
Alien: A Ressurreição (Divulgação)
O aporte pela ação é mais objetivo. Mesmo com toda a ótima criação de cenários buscando uma contemplação de monstruosidades, tudo é muito bem iluminado e a preocupação é pelo choque mediante a capacidade destrutiva das criaturas e não pelo terror em face do suspense que elas poderiam incitar. Ao contrário dos filmes anteriores que usaram de elementos da escuridão para venderem medo [até mesmo na ação épica de (Aliens O Resgate (Aliens, 1986)]. Estas seleções interessam por um esforço por outras proposições. Este enriquecimento de propostas é um dos motivos da saga Alien ser tão foda. É um personalismo necessário. Mesmo tendo em consideração os limites do que a indústria mainstream dos estúdios assim consegue permitir. E dentro da esfera de ação citada, há o trato dos aliens, não mais como criaturas deveras sorrateiras, mas monstrengos perigosos. Soldados escrotos (tão viscerais quanto Aliens O Resgate (Aliens, 1986), mas numa acometida de serem mais ameaçadores na acepção da ameaça). E o momento mais sagaz desse modus operandi é a dos Aliens em perseguição a um grupo de sobreviventes debaixo d’água. Coisa bem arrumada e com o nível certo de crescimento de agonia. Com os bichos num aproximar excessivo enquanto os humanos se debatem a nadar desesperadamente em seu mergulho. Um tipo de uso de ataque desses alienígenas que antes não havia sido tentado. É um artifício de visual acachapante e criativo de mais um ataque alien. Serve para demonstrar mais uma particularidade de planejamento de caça desses hediondos e com atuações conjuntas dos humanos que perambulam entre o burlesco da caricatura e o urgente, mas sendo proveniente ao universo em questão dentro da estruturação desse material desde o início, assim acabando por funcionar. E a movimentação dos aliens segue amedrontadora.
O filme, porém, segue altamente difamado por suas determinações e por sua estruturação desequilibrada, quando penso que correr estes riscos deixara a obra interessante. Mesmo com suas falhas. Cinema não é uma planilha de erros e acertos mediante o social/moral/culturalmente aceito, mas uma amálgama de decisões e tesões de seus artificies munidos de milhões de um estúdio que possui uma preocupação tácita com os lucros. Mas a saga alien ainda consegue tem uma legitimidade artística frente a seus congêneres. Inclusive em suas últimas experiências (mesmo, NOVAMENTE, citando as interferências dos estúdios). E por escrever sobre polêmicas, eu parto aqui para um breve comentário acerca da maior dela: O Newborn. Essa é uma criatura nascida através da junção de um útero humano capturado pela Rainha Alien por sua matriz genética misturada com Ripley 8, com atributos mais divididos entre as duas raças. Já que o processo de nascimento não seguira o modelo tradicional alienígena. É uma tentativa da criação de uma nova criatura. Algo que expanda ainda mais o universo ficcional da franquia. E esta criatura esbranquiçada segue uma mistura do caráter esguio dos alienígenas com feições mais humanizadas, além do fato importante da noção de sentimentos da figura, que ressoa um comportamento infantilizado e irresponsável. Uma criatura altamente dúbia e intrigante. Calcada no relacionamento genético com Ripley 8, busca aqui um replicar escroto e díspar do tom de maternidade da tenente Ripley. De forma a subverter seus pesadelos com as criaturas de sua personagem anterior, e agora colocando-a como partícipe racial e mãe. Fora uma ideia amalucada e muitos preferem esquecer, mas acho um assumir de risco (de novo), assim como uma expansão e provocação do material. E é seguindo essa estrutura bizarra que o filme se vende com sua relevância à saga, que por não ser bem recebido, meio que fizera a saga entrar num limbo, mas é salutar como o aporte atrevido ainda consegue intrigar em toda sua duração. Sem deixar em momento algum de lado a seboseira e a brutalidade.
Alien: A Ressurreição (Divulgação)
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