O REGRESSO
Este filme deveria vir com o subtítulo: Filme feito para Leonardo ganhar o Oscar. O longa tem uma peculiaridade interessante em seu roteiro, praticamente, logo depois que é atacado pelo urso, por volta do minuto 27, o personagem só volta a ter uma fala depois de passada uma hora de filme, mesmo assim, apenas duas ou três frases. O ano é 1822, envoltos por diversas tribos indígenas selvagens, os caçadores de peles são emboscados numa floresta densa num inverno muito forte e acontece uma batalha entre a vida e a morte. O explorador Hugh Glass (baseado em fatos reais) viaja com seu filho, disposto a ganhar dinheiro caçando. Embrenhados na natureza adentro eles caminham e procuram pelo objeto de sua busca. Hugh Glass procura sozinho por alguma presa fácil, observando atentamente a espreitar, por entre as árvores, até que pressente algo lhe observando, quando se vira não dá tempo de pensar em nada – um urso gigante, impiedoso, ataca-o, morde-o na perna e o puxa, arrasta-o e é impressionante o realismo que Leonardo emprega à cena, parece dar uma tridimensionalidade mesmo num plano bilateral. Assim, o urso deixa-o ali jogado, com suas feridas, com as patas em cima de sua cabeça, como se fosse o troféu conquistado. Glass, arrasta-se para a sua espingarda, espera pela ação do urso e quando ele se aproxima desfere um tiro, mas não surte efeito algum. Desta vez o urso ataca seus braços e seu rosto violentamente e depois revira aquele corpo já muito machucado e, por último, já sem alternativas, o caçador pega uma faca e espera mais um ataque da fera quando ela se aproxima ele começa a golpeá-la no pescoço repetidas vezes até que os dois caem numa ribanceira. Ela, morta, e ele sufocado pelo peso dela que ficou por cima dele. A situação deplorável em que ficou o caçador não dava conta de que fosse sobreviver. Essa é uma daquelas cenas que já entraram para os anais do cinema em todos os tempos.
É interessante o modo como o elemento nativo-indígena é acrescentado à narrativa: De forma a desconfiar o tempo inteiro dos “brancos” nos tratados de barganha, eles não esquecem que esses mesmos que pretendem fazer negócios hoje, são os mesmos que saquearam, mataram e estupraram suas mulheres. Portanto, o índio é descrito pelo diretor como o dono do espólio latifundiário, como já foi um dia no Brasil, e os caçadores são pessoas, invasores, mas, como não podem combatê-los sozinhos, o melhor a fazer é negociar. Diferente dos índios brasileiros os americanos são culturalmente guerreiros, lutam e sempre lutaram pelo que a eles pertenciam. Hoje, muitos deles são empresários, homens bem sucedidos, estão entre os mais ricos dos Estados Unidos. Donos de cassinos e bancos.
Os homens que estão com Glass decidem abandoná-lo, mas o traidor Fitzgerald decide ficar, pois tem planos mais ousados para aquele homem, pensando no dinheiro que iria ganhar, claro. E Fitzgerald põe em prática seu plano, que era o de enterrar Glass vivo, mas o filho de Glass o surpreende e assim o traidor o mata. A câmera sempre visa a imagem de baixo para cima objetivando as árvores, com o propósito de estabelecer um vínculo de esperança entre o personagem que estava entre a vida e a morte e a perseverança para o regresso de sua vingança. Quando Glass se encontra com um índio, no meio da noite, com um animal, devorando-o sem vacilar, ele se aproxima e o índio joga um pedaço de carne em sua direção, ali, percebe-se que a relação existente entre animal e homem é muito relativa, dependendo das condições em que o ser humano esteja vivendo a racionalidade deixa de existir para dar lugar ao instinto.
E mais um desafio para o caçador Glass quando ele é perseguido a cavalo e chega a um despenhadeiro, pula com seu cavalo, bate em uma árvore e o que provavelmente teria sido sua morte, revela-se mais uma vez o quão é resistente aquele homem guerreiro. Já, quanto ao cavalo, nada sobrou. Seu instinto de sobrevivência, mesmo estando comprometido dá-lhe uma ideia genial: abre o cavalo, tira todas as suas vísceras, tira suas roupas e entra na couraça do animal para se proteger do frio da neve. A imagem fala por si só, não dá para descrevê-la em palavras, pois arruinaria toda beleza de sua originalidade. Aquele ventre/útero que conforta não um filho, mas um homem maduro na iminência da morte para gerar, mesmo morto, a vida outra vez.
E ele, enfim é encontrado por seus companheiros que saem à procura de Fitzgerald numa disputa que chega ser até vergonhosa, pois para quem enfrentou um urso, uma briguinha com um de seus pares não há de ser nada.
Bem, concordo que o filme não era digno de ser escolhido como o melhor de 2015. O filme é bom. Leonardo DiCaprio mostra como toda técnica numa interpretação dramática bem sucedida, sem roteiro rico, fazendo uso de seu talento magistral que o coloca numa base alta da cadeia hierárquica dos grandes atores históricos. Apesar do filme não expressar tanta dramaticidade como era esperado. É o filme de um homem só. E de um dono só, seu diretor, o magnífico Alejandro González Iñárritu, que dispensa apresentações. Ele ganhou o Oscar no ano passado com o filme “Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância)” e foi indicado este com “O Regresso”, mas veja em seu currículo o que ele já dirigiu além deste dois: “Amores Brutos”, “21 gramas”, “Babel”, “biutiful”. È pouco ou quer mais?
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