Faustrecht der Freiheit (O Direito do Mais Forte, 1975) é antes de tudo, um filme melancólico. Ou "melancholische film''.
Franz Biberkopf ou "Fox" (Rainer Werner Fassbinder) é um homem sem cultura que trabalha em um circo, como "Fox, a cabeça falante", durante sua vida Fox na verdade pouco fala, ele escuta, ou melhor, é ordenado. Ele então passa a se prostituir, tal profissão não dura em sua vida, pois já no primeiro homem (é...), ou melhor, cliente, será o ponto de partida para Franz conhecer seu parceiro ao longo do filme, o interesseiro Eugen (Peter Chatel). Depois de ganhar na loteria (notamos aqui, sucessivos acontecimentos que mudariam drasticamente a vida de qualquer pessoa), Franz começa do zero em um lugar totalmente novo, de cultura barroca e homens elegantes. Eugen até parece ser um ponto novo na vida de Franz, mas é ele quem despedaça-a.
O Direito do Mais Forte é um filme às avessas, um tipo de Farrapo Humano, ou qualquer outro romance da década de 1930, 1940 ou 1950, adaptado a própria vida do diretor. Sua vida em botecos gays decadentes e com relacionamentos destrutivos. A cultura gay na qual movimentava os curtos passos intensos de sua vida. O Direito do Mais Forte também seria um ponto da vida de Fassbinder em que ele sairia um pouco da frente das câmeras para se concentrar mais atrás delas, se até 1975 ele havia atuado em poucos de seus filmes, depois daqui o número de atuações diminuiria bastante.
Com um começo meio truncado, algumas atuações duvidosas, um roteiro dos bons e um desenvolvimento de personagem exemplar, temos aqui a estória de um homem a quem (como é citado no início do filme) o dinheiro não o torna rico. Franz (ou Fox) é explorado ao máximo por todos que passam em sua vida, segundo sua própria irmã, que o define como idiota e decadente. É sempre nela que Franz busca refúgio, e nunca é nela que ele o consegue, são apenas insultos ou "você me deve isso".
Fassbinder usou em O Direito do Mais Forte algumas tomadas interessantes, como o plano final, e também o uso de espelhos (saturados em alguns de seus filmes), ao longo de duas horas e poucos minutos vemos na tela dezesseis reflexos, muito para ser coincidência, é claro. Também destacam-se um close fechado em um órgão masculino por baixo da calça e diálogos nada refinados, como tamanhos de pênis e habilidades na cama citados sem escrúpulos, tudo isso entre gays, deixando tudo mais ácido e polêmico para os conservadores de carteirinha. O próprio Fassbinder aparece em nu frontal, por duas vezes.
Mas seriam mesmo esses homens, essa classe alemã tão alta e refinada? Ou seriam eles uma plebe neurótica e tão suja como mal educada, apenas disfarçados por ternos caros e grandes mentiras? Basta ir a uma universidade particular no Brasil atual e ver como muitas salas de aula ficam com restos de comida e lixo após a aula. A imagética nem sempre produz aquilo que aparenta ser na realidade em si. Essa diferença do estilo de vida de Franz chega na família de seu namorado, irritando-os, mas basta eles precisarem de seu dinheiro para que tudo isso seja esquecido.
O relacionamento entre homossexuais também surge com um ponto de vista interessante, não é mostrado como superior aos relacionamento heterossexuais, mas tão deslocados e cheios de conflitos quanto. Uma igualdade que para muitos homossexuais ainda parece ser um tabu.
Fox talvez seja mais um dos grandes alter egos de Fassbinder, um leão por fora mas por dentro uma das mais sensíveis pétalas de rosa, um frágil ser humano deslocado em um mundo corrupto e corruptor. E é engraçado notar como toda a burguesia decadente julga-o por ser o que é, quando o próprio nunca os julga por serem quem são, como definir o certo do errado? O dinheiro não o tornava rico, mas sim o amor, o amor aos seus amantes, ao seu estilo de vida. Do que adianta ouvir Mozart e continuar sendo um grande babaca? O final de O Direito do Mais Forte é irônico (ou apenas um presságio) para quem conhece a vida do diretor alemão, parece que dinheiro e aparências (que são tão difíceis de manter) não se tornam tão difíceis comparados à compaixão e amor à vida que falta no mundo.
Na última cena, ouvimos uma música de circo, Fox sempre foi um palhaço na mão de todos.
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