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Críticas

Cineplayers

O primeiro erro indiscutível de George Clooney como diretor.

4,0

Aproximadamente no meio de Caçadores de Obras-Primas (The Monuments Men, 2014), o mais recente trabalho de George Clooney na direção, há uma cena na qual os personagens de Bill Murray e Bob Balaban encontram um jovem soldado alemão em uma escura floresta. Após desajeitadas ameaças, os três se entendem através de sinais e acabam sentando no chão e compartilhando cigarros, sem falar nada. Por mais que tenha (ou ao menos pareça ter) uma intenção nobre, o momento nada mais é do que um imenso nada: não traz maior compreensão em relação aos personagens, não gera risadas, não faz a trama andar, não envolve emocionalmente. Trata-se simplesmente de uma imagem em movimento de três pessoas fumando em meio a árvores na escuridão.

Essa cena pode ser considerada um microcosmo do que é Caçadores de Obras-Primas. Assim como ela, o filme também é um imenso nada. Clooney (a partir de mais um roteiro escrito com seu colaborador Grant Heslov) comete aqui seu primeiro erro inequívoco na cadeira de diretor, em uma obra que tem o coração no lugar certo, porém nada mais. É surpreendente, na verdade, ver um contador de histórias que havia se mostrado tão versátil e inteligente em trabalhos anteriores realizar um filme desleixado, estruturalmente preguiçoso, com erros tão básicos para um profissional de seu nível e experiência.

Mas comecemos pelo começo, literalmente. Caçadores de Obras-Primas tem um dos primeiros atos mais apressados e equivocados dos últimos anos. Em pouco mais do que cinco minutos, o filme já trouxe o personagem de Clooney apresentando aos superiores a ideia dos protetores de obras de arte, já formou a equipe toda e até mesmo já fez com que todos os integrantes passassem por um treinamento militar básico. Em outras palavras, o espectador ainda não faz a menor ideia de quem são aquelas pessoas e Clooney já pede que acreditemos no fato de que formam uma equipe unida, leal, com a qual cujo destino temos que nos preocupar.

Não é assim que funciona – e George Clooney, diretor e roteirista consagrado, deveria saber disso. Em um filme como Caçadores de Obras-Primas, é fundamental a construção de uma base inicial para sustentar o restante da narrativa: uma apresentação prévia de cada personagem, um tempo junto a eles para reforçar o sentimento de camaradagem, seja o que for. Aqui, não há nada disso e, como conseqüência, todos eles são verdadeiros estranhos para a plateia. Não possuem personalidades, não têm motivações e é difícil até mesmo lembrar seus nomes. Assim, quando o filme exige uma resposta emocional da plateia – como quando algo acontece com um deles, quando preferem correr o risco de explodir para ficar junto a um companheiro ou quando um personagem escuta a voz de sua família no alto-falante enquanto toma banho –, ela simplesmente não vem, uma vez que a distância entre o espectador e aquelas pessoas do filme é imensa.

Para piorar, Caçadores de Obras-Primas também não é bem-sucedido quando se arrisca na comédia. Na verdade, o filme parece sofrer de uma grande crise de identidade da qual o Clooney jamais consegue escapar. Por vezes drama de guerra, ocasionalmente suspense investigativo, pontualmente cômico, lá e cá flertando com o romance, Caçadores de Obras-Primas luta para encontrar equilíbrio em meio a tudo isso, ficando no meio do caminho entre todos esses gêneros. É um grave problema de tom, apenas realçado pela utilização óbvia da pouco inspirada trilha de Alexandre Desplat, que surge unicamente para sublinhar tudo aquilo que está sendo visto na tela, sem trazer qualquer acréscimo à produção.

Mas os problemas com a construção de Caçadores de Obras-Primas não param por aí. O descuido com a estrutura da narrativa fica perceptível também nos diversos furos e lugares-comuns do roteiro, como é o caso do (quase)romance entre dois personagens, que surge abrupto e totalmente despropositado, e o desdém dos oficiais superiores no que concerne os objetivos da equipe. Como se não bastasse, muito do que é visto no filme parece ser conseqüência de cenas que devem ter ficado no chão da sala de montagem: em determinado momento, por exemplo, o personagem de Clooney fala que a jornada serviu para um personagem recuperar sua dignidade. Mas por que ele precisava recuperá-la? Qual foi o seu “erro” citado em uma conversa anterior? O filme jamais explica isso, assim como também não se digna a mostrar por que razão o personagem de John Goodman passa a andar de muletas de uma hora para outra.

O resultado desse desenvolvimento repleto de falhas não é outro senão o total desperdício de um grande elenco. Bill Murray – um dos maiores talentos cômicos que o cinema já produziu – é reduzido a uma dúzia de cenas bobas cujo centro é uma implicação sem sentido com Bob Balaban, enquanto a recém-oscarizada Cate Blanchett sofre com uma personagem unidimensional e caricata. Goodman, Damon, o próprio Clooney e o francês Jean Dujardin também são criminosamente limitados a cenas superficiais e rápidas e pouco conseguem acrescentar em termos de carisma ou humanidade aos seus personagens, entrando e saindo de cena sem deixar qualquer marca no espectador.

Trazendo ainda uma fotografia excessivamente escura, mal resolvida, e um clímax tão tenso quanto um episódio da Galinha Pintadinha, Caçadores de Obras-Primas é um filme confuso, pessimamente estruturado, incapaz de envolver, emocionar, divertir ou gerar qualquer reação no espectador – além de tédio, claro. A reflexão sobre a importância da arte como documento histórico, como algo que merece ser preservado, é válida, mas aqui acaba se perdendo em meio a uma história soterrada de problemas.

É uma pena, mas, caso existisse uma equipe como essa salvando filmes por aí, Caçadores de Obras-Primas certamente seria deixado de lado.

Comentários (6)

Nayara Ingrid da Cruz Andrietta | quarta-feira, 12 de Março de 2014 - 21:47

Bem eu não assisti o filme, mas vi que muitas pessoas incluindo você reclamaram do filme ser confuso e parecer não ter gênero nenhum o que é uma pena, pois Clooney é um excelente diretor e ver que ele errou é bem triste né agora a parte da Galinha Pintadinha eu realmente ri horrores.

Rodrigo Torres | terça-feira, 18 de Março de 2014 - 04:21

Bosta de filme. Deu até vontade de diminuir a nota. rs

Renato Coelho | domingo, 04 de Maio de 2014 - 22:20

É triste ter que criticar negativamente um filme onde contracenam bons atores como George Clooney e Bill Murray. E por que eu disse bons atores e não ótimos atores? Justamente porque fazem filmes como esse. Matt Damon depois da trilogia Bourne virou um ator comum, com papéis pra lá de pífios.
O filme tem uma série de cenas desconexas e sem sentido, como a cena em que a mulher chega no consultório do dentista, onde Bill Murray está extraindo um dente. Todos poderão pensar que a mulher vai fazer alguma coisa, que é uma espiã, que é uma ladra, mas não, está ali apenas para ouvir o grito banal de dor do Bill Murray, e faz cara de espanto.
E o filme segue assim, dando sono em todo mundo.
Outros filmes com nome de “Caçadores” foram infinitamente melhores, a começar pelo melhor de todos “Caçadores da Arca Perdida” e terminando com o acima da média “Caçadores de Emoção”. Incluir o “Caçadores” nesse filme, portanto, é uma blasfêmia, um desrespeito.
Nota 3

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