Certos filmes nos dão uma sensação não de decepção, mas aquele sentimento de "nossa poderia ter sido infinitamente melhor", que a ideia inicial tinha um potencial gigantesco e se perdeu por as vezes um leve descuido, ou alguns deslizes dos atores, equipe técnica ou vários outros fatores. No caso de "Sem Limites" que é baseado em livro de Alan Glynn, que eu sumariamente preciso ler urgentemente, mas não acho pra compra-lo de espécie alguma, o provável pior desacerto existente foi a direção de Neil Burger. O diretor e roteirista responsável pelos medianos "O Ilusionista", "Gente de Sorte" e a bomba ambulante "Divergente", tem nesse exemplar seu melhor trabalho, o que por si só já não é grande coisa assim. Presumivelmente, Burger perdeu o controle do seu projeto, devido ao fato da história possuir uma prévia tão instigante e excitante que vários furos e um final que perde um pouco do brilho, o filme se torna uma experiência não ruim, mas frustrante...
Eddie Morra é um escritor que está sem criatividade e perdido na vida. Ele tem uma última chance de salvar sua carreira, mas o desânimo se mostra ser maior. Tudo, no entanto, muda quando ele encontra o ex-cunhado, que oferece uma nova droga, capaz de ativar o funcionamento completo do cérebro. O “traficante” dá a primeira pílula para Eddie experimentar, porém, logo avisa que cada uma custa 800 dólares, eita! Sem perspectivas, Eddie reluta um pouco, mas acaba por experimentar o remedinho. E quando "bate" o efeito do NZT a mente do nosso protagonista muda. Tudo muda. O apartamento passa de um chiqueiro a algo habitável, o livro vai de zero palavras a meia edição em questão de horas. Só de ouvir novas línguas ele passa a ficar fluente. Em questão de minutos ele está tagarelando sobre direito, flutuações do mercado financeiro, ganhando verdinhas em mesas de pôquer, dormindo com as mais belas mulheres de Nova York e no melhor estilo Vitor Belfort de ser, acaba por partir pra porrada quando um bando de brutamontes cruza seu caminho, somente usando memórias dos filmes que já havia assistido do Bruce Lee e lutas de Muhammad Ali. Mas, tudo tem um preço não é mesmo? E as coisas começam a ficar complicadas para Eddie quando outras pessoas começam a ter conhecimento da droga e querem se apoderar dela...
Esteticamente o filme é irretocável, isso graças ao diretor de fotografia Jo Willems. Willems utiliza luz azulada e fria durante o inicio da fita exibindo ares de melancolia, desanimo, abatimento e infelicidade de Eddie. Já após o uso do NZT, as cores começam a ganhar luzes vermelhas e alaranjadas, mais quentes, refletindo agora já o aumento de confiança e a nova personalidade do personagem, que imediatamente apresenta ser uma espécie de semideus. Ao sair do campo da mera mudança de saturação de cores e distorções de imagens, há muitos efeitos bem hipnotizantes, como o do zoom em perspectiva eterna e o quadro esmaecido dentro do quadro de cores saturadas. A montagem/edição também se destaca, por mostrar um trabalho eficiente e hipnótico, deixando a fita com duração enxuta de aproximadamente 105 minutos e intercalando otimamente bem os momentos de loucura e euforia de Eddie com as intercessões dramáticas e de suspense. A trilha sonora também não podia ser mais acertada. Além da música incidental pontuada está lá também uma das melhores bandas de rock da atualidade, o Black Keys, com sua "Howlin For You".
A escolha do elenco se mostra um dos primeiros equívocos do longa. Abbie Cornish prova ser apenas um rosto bonito e corpo delicioso, não conseguindo demonstrar todo o desespero e desencontro de Lindy, relevando ela a parâmetros pessimamente explorados. Anna Friel, Robert Burke, Tomas Arana e Patricia Kalember não potencialização a carga dramática que poderia ter sido potencializadas, mas também não são tão exigidos assim. A atuação de De Niro é bem limitada, mas não porque o ator não tenha capacidade, porém, porque o papel dele é pouco utilizado. Não me contradizendo, mas apenas especificando, Bradley Cooper se supera. O ator já se livrou da alcunha de Phil Wenneck de "Se Beber não Case" a muito tempo e se firma como grande de sua geração, provando não possuir apenas sorriso charmoso e belos olhos azuis e pensar que o papel poderia ter ficado com o péssimo Shia LaBeouf. Mas, o maior problema de "Sem Limites" seja mesmo o roteiro escrito por Leslie Dixon, que possui mais furos que queijo suíço. Como a cena em que Lindy usa a droga no parque de patinação e os problemas mequetrefes que encobre Eddie, situações mais obscuras poderiam ter sido criados para exibir mais perigo ao nosso herói...
Está certo que a moral ou não-moral de "Sem Limites" não se relaciona com a eternidade ou com o infinito, mas, de algum modo, com o renascimento. Essa questão é um mote que foi o grande salto desse argumento ante outros filmes. Seríamos capazes de ceder quanto para renascer perfeitos? Seríamos capazes de fazer o quê para seduzir todos? Como a sociedade espera que sejamos? Questões como essas, ricas em caráter reflexivo que fazem a pena assistir a película, mesmo sem levar a narrativa cinematográfica a uma conclusão fechada, seduzem qualquer mero mortal. Pontos para Cooper, que seduz e o maior acerto da história é que qualquer um queria estar na pele dele...
"A escolha do elenco se mostra um dos primeiros equívocos do longa. Abbie Cornish prova ser apenas um rosto bonito e corpo delicioso"
Falou tudo...
Bom filme, mas ainda não simpatizo muito com Cooper. E sei que isso afeta meu julgamento. Mas diverte.