Por mais que a transição por todos os gêneros cinematográficos sejam um caso extremamente árduo e por mais que a comédia nem de longe seja meu gênero preferido, eu o considero o mais difícil de ser executado. Ao longo da história da 7ª arte, fomos brindados com mais porcarias do que obras-primas, mas quando o acerto acontece aí é certeiro. Passando por obras doces e ingênuas de Chaplin como "Tempos Modernos" e "Luzes da Cidade", o típico humor britânico e requintado de "Monty Python - Em Busca do Cálice Sagrado", o escracho de Jim Abrahams, David e Jerry Zucker em "Corra que a Policia vem Aí" e "Apertem os Cintos... O Piloto Sumiu!", "Quanto Mais Quente Melhor" do mestre intangível Billy Wilder, e até mesmo o gênio Kubrick se aventurou pelo gênio entregando outra máxima com "Dr. Fantástico". A comedia teve seus últimos suspiros com "Se Beber, Não Case!", "Borat" e "South Park", mas sem dúvidas quem dominou o gênero durante toda a década de 90 e inicio/metade dos anos 2000 foram os irmãos Peter e Bobby Farrelly...
"Os Três Patetas", "Passe Livre", "Antes Só do que Mal Casado", "Amor em Jogo", "Ligado em Você", "O Amor é Cego", "Osmose Jones", "Eu, Eu Mesmo & Irene", "Quem Vai Ficar com Mary?" e "Kingpin" são filmes dos irmãos que por mais que não sejam unanimidade e possuam alguns deslizes aqui e ali, possuem particularidades que os tornem obrigatórios para os amantes do gênero. Mas, propriamente dito, o fato de uma comédia ser boa, depende de uma grande combinação de fatores, até mesmo dentro da comédia existe a espécie dos subgêneros, como os já citados no paragrafo anterior. A vezes a pessoa prefere uma sátira, um pastelão do que um humor mais acido e negro por exemplo. O maior acerto da fita demonstrasse no excelente roteiro escrito por Bennet Yellin em conjunto com os irmãos Farelly, que por mais que possua piadas bobas e idiotas em momento algum desrespeita a inteligência do espectador e não o trata com imbecil como é efeito na atrocidade chamada "Os Espartalhões" por exemplo, transitando por todo tipo de comédia que possa ser feito...
Lloyd Christmas (Jim Carrey) é um motorista frustrado que vê sua vida mudar completamente quando resgata uma mala deixada pela bela Mary Swanson (Lauren Holly) no saguão de um aeroporto, antes dela seguir viagem para Aspen. Ao lado de seu grande amigo Harry Dunne (Jeff Daniels), ele parte numa viagem que cruzará o país na tentativa de devolver o objeto para a moça, provocando muitas confusões pelas estradas norte-americanas. Pra piorar a situação, a mala continha o dinheiro do pagamento de um resgate e os sequestradores partem em busca da dupla. E pronto, partindo dessa premissa bem simples, são criadas as mais absurdas e criativas situações que acabam sendo capazes de fazer rir o mais cético e sério cidadão. É o politicamente incorreto, utilizado massivamente nas obras máximas dos anos 80, aqui são executadas sem medo de serem distorcidas por parte da crítica puritana e de quebra ainda sobra tempo e espaço para referencias, como um interessantíssima ao clássico "O Silêncio dos Inocentes".
O sucesso do longa é garantido não somente pelo sensacional roteiro, mas também pela excelente condução dos irmãos, que logo em seu primeiro trabalho já entregam uma película que hoje faz parte não só da história da comedia, mas do cinema mundial. Os Farelly contam ainda com o ótimo trabalho de montagem de Christopher Greenbury que mescla com extremo equilíbrio os momentos cômicos durante todo o decorrer da trama. O longa possui tantos acertos que até as compras de roupas novas ao som de 'Pretty Woman' se torna hilária e mesmo que o filme não agrade gregos e troianos é impossível não dar sorrisos ao longo da trama, ainda mais com o fechamento com a já clássica e icônica cena do ônibus que é tão magistral que na época das filmagens Carrey se recusou a rodar outro final, considerando aquele o fim definitivo para o filme. Uma palavra que pode ser agregada a película conjuntamente é coragem. Coragem dos irmãos Farelly, coragem essa por abusar da escatologia, já que os diretores parecem tentar chegar no limite do aceitável por parte dos espectadores.
Se o cinema já nos brindou inúmeras vezes com parcerias com químicas fascinantes e esplêndidas como Mel Gibson e Danny Glover em "Máquina Mortífera", Paul Newman e Robert Redford em "Butch Cassidy & Sundance Kid", Jackie Chan e Chris Tucker em "A Hora do Rush", John Travolta e Samuel L. Jackson em "Pulp Fiction" e Will Smith e Martin Lawrence em "Bad Boys", aqui temos Lloyd Christmas e Harry Dunne, interpretados magistralmente por Jim Carrey e Jeff Daniels. Carrey sempre se mostrou um deslumbrante ator ainda mais quando atuou em filmes dramáticos, mas aqui demonstra que com caretas ou cacoetes pode arrancar risos de fazer chorar do espectador mais cético como por exemplo, na cena em que Lloyd conta para Harry que vendeu um pássaro morto para um menino cego, repare a tossida que o ator dá tentando disfarçar a revelação trágica, brilhante. Daniels não fica pra trás, mostrando uma veia cômica que até então não havia sido explorada. As cenas da língua presa num teleférico e a privada quebrada na casa de Mary são formidáveis.
O orçamento de "Debi & Lóide" foi de aproximadamente US$ 16 milhões, sendo que o filme arrecadou nas bilheterias de todo o planeta algo em torno de US$ 246 milhões, isso prova ao menos que não foi só eu quem achou o filme um dos mais engraçados da história do cinema. Um bom filme não precisa somente de uma história mirabolante, de efeitos especiais arrasadores ou de pirotecnia e apelo marqueteiro para se sagrar sucesso de bilheteria ou entre críticos, basta apenas criatividade, paixão e espontaneidade das pessoas envolvidas para que o resultado final seja majestoso. Devemos rir na cara das adversidades e obstáculos para que possamos ter uma paz interior e uma leveza na forma de interpretar os sentidos da vida e terminar "Debi & Loide" sem um sorriso no canto na boca se torna uma tarefa hercúlea. Para atuar no filme, o astro em franca ascensão Jim Carrey teve depositado em sua conta, US$ 7 Milhões, sendo que Jeff Daniels recebeu apenas US$ 750 mil. E pensar que os dois atores permanecem o mesmo tempo em cena ao longo de todo o filme. Acho que no fim das contas todos nós temos um pouquinho de debiloide no nosso ser...
Esta entre as melhores comedias que ja assisti. Uma das grandes duplas do cinema. Pra variar, otimo texto Lucas. Tu ta que so melhora, cara.
Obrigado meu caro!