Qu’est-ce un rêve française?
Quanto mais envelhecemos, mais nos percebemos desencantados com nossas vidas medíocres, repleta de longas horas cansativas no trabalho e poucos momentos de fruição artística e o prazeiroso ócio aristocrata. Órfãos de uma infância repentinamente perdida, nos revoltamos contra o presente e suspiramos impotentes por um passado áureo em que todos eram mais felizes.
Essa é a temática do novo filme do mais europeu dos diretores de cinema dos EUA, Woody Allen, 75 anos. O consagrado diretor acrescentou, este ano, mais uma pérola à sua vasta cinegrafia, o encantador Meia-noite em Paris (Espanha/EUA 100 minutos). Se o seu desejo, ao final do filme não for entrar imediatamente em um automóvel e desembarcar na frenética Paris do entre-guerras e beber taças e taças de champagne com artistas do calibre de Salvador Dalí, Cole Porter e Scot Fitzgerald, saiba que há algo de muito errado na sua mente, por ter ficado tão insensível à beleza.
O filme tem uma história surreal, descompromissada com os laços do real que provocam a senilidade precoce dos homens. Este é o dilema da personagem Gil de Luke Wilson, roteirista de sucesso em Hollywood que vai a Paris com a conservadora família de sua noiva Inez, interpretada por Rachel McAdams (que consegue fazer o espectador ter ganas de esganá-la). A ignorância e a insensibilidade da família de Inez são a síntese do desprezo de Woody Allen pelos setores tradicionalistas e republicanos dos EUA (com destaque para o famigerado Tea Party) e geram frases ácidas e impagáveis por parte de Gil.
Cansado da rotina pequena-burguesa de sua noiva, Gil inesperadamente vê seus desejos atendidos ao vagar pelas ruas de Paris à meia-noite; viaja no tempo e visita a Paris habitada por seus ídolos, gente do calibre de Gertrude Stein, Ernest Hemingway e Pablo Picasso, com os quais passa a conviver em um ritmo alucinante de festas e debates literários. Nessa viagem, Gil conhece a jovem estudante de moda Adriana, interpretada deliciosamente pela vencedora do Oscar Marion Cotillard, pela qual se apaixona. Em meio a conversas sobre a natureza da arte e da vida, em diálogos em que o apreciador vê Woody Allen em sua melhor forma, Adriana convence Gil a viajar ainda mais no tempo, mergulhando agora na Paris da Belle Époque, em que vemos gênios como Toulouse-Lautrec e Edgar Degas.
Meia-noite em Paris, como todos os filmes de Woody Allen, não são para todos, exige um paladar refinado para a ironia do diretor e um banco de referências cinematrográfico considerável (para os entendidos não há piada melhor do que a dica de Gil para o jovem Luis Buñuel, que não consegue entender porque os convidados não conseguiriam deixar a sala de jantar do filme proposto pelo protagonista). Contudo, mesmo o mais insensíveis poderão sentir uma inefável ânsia por une court promenade à travers les rues de Paris sous la pluie.
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