Em Pi, filme de estréia de Aronofsky, vemos Max Cohen, homem que tão brilhante em sua profissão quando Nina, a bailarina de Cisne Negro, ambos são também obcecados com a busca da perfeição em termos técnicos, digamos assim. Em O Lutador, acompanhamos o definhamento físico e moral de Randy, atleta, tal qual Nina, em busca de um novo lugar em um espaço que não é mais seu, já que seu corpo massacrado pelo tempo, parece não mais se adequar aquela situação. Em Cisne Negro, podemos entender que Nina busca um novo lugar também, a partir de quando seu professor a orienta para que a mesma busque um algo a mais para a composição de sua personagem má, o Cisne Negro.
Há, evidentemente, um estudo dos corpos nesses três filmes de Aronofsky. Um estudo dos impactos que a obsessão causa no corpo dessas pessoas. Em Cisne Negro vemos um corpo em busca de uma nova dinâmica, essa em sentido abertamente sexual. E o mais brilhante disso, é que tal qual muito dos grandes filmes de Polanski, especialmente Repulsa ao Sexo, vemos uma personagem em constante degradação mental, também por conta do embate advindo do processo de descoberta/libertação sexual.
A história de Nina, bailarina perfeccionista que ganha um disputado papel de protagonista no balé “O Lago dos Cisnes” e se vê em uma terrível crise de identidade por conta de sua atuação, ganha pontos por meio de todos esses interessantes aspectos, mais ainda, se pensarmos a forma como ele é executado. Ele é um thriller, dos mais instigantes possíveis. A Trilha Sonora, adaptada de músicas da peça do Lago dos Cisnes, dá um tom visceral a obra. Destacando-se também, a forma como Aronofski acompanha as danças, leveza e graciosidade quando Nina está como o Cisne Branco, ou mesmo nos seus ensaios iniciais, cortes rápidos e vibrantes, planos-fechados dando uma impressão sufocante na angustiante dança do Cisne Negro já no final não menos que divino. Um trabalho de direção dos mais interessantes esse de Aronofski, sempre muito massacrado – acredito que por causa do fraquinho (se comparado a tríade inicialmente citada) Requiém para um Sonho.
Lindo de ver é a atuação de Natalie Portman, devemos colocar em pauta. Desde o começo, vemos uma moça frágil e pertubada com a perfeição naquilo que faz. No decorrer da trama, com o processo de definhamento psicológico que sua personagem passa, vemos surtos de personalidade, ora gritos histéricos e fúria, ora uma fragilidade imensa da moça, tudo especialmente levado pela grande atriz que é Portman, mais que ideal para o papel. Há também um pouco de auto-biográfico em sua atuação, digamos assim. Se O Lutador tinha muito de um Rourke assombrado com um passado de glórias, buscando um lugar no presente, aqui, vemos Portman, sempre vista como uma atriz de papéis frágeis e doce, idolatrada enquanto diva, mas pouco respeitada enquanto uma atriz de fato. Tal como Nina, Portman também se revela, em um papel corajoso, ambíguo e longe da delicadeza de muitos de seus outros personagens.
Um grande filme, sem dúvidas. Rico em possibilidades. Que observa de uma forma interessante o perfeccionismo. Que olha para sua personagem principal através de um jogo de duplos interessante: de um lado, perfeccionismo, leveza, graciosidade, do outro – representado na figura misteriosa de Lily (interpretada pela linda Mila Kunis) – pulsação, improvisação, sensualidade. Tudo isso levado a um caminho onde a identidade de nossa personagem entra em uma espécie de crise que ela própria não suportará. Terá, enfim, alcançado a perfeição. No redentivo final, onde o público glorifica nossa “heroína”.
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