Prendam a respiração. Façam um pedido. Contem até três.
Quando o confeiteiro maluco espalha cinco bilhetes dourados em seu produto de maior vendagem (a barra de chocolate Wonka) por todos os continentes gerando uma imensa agitação entre as pessoas, o que dividimos em comum com os personagens que transitam, cena ou outra, atrás de um modo de conseguir o tal prêmio, é a sensação incontrolável de curiosidade, porque assim como eles, não sabemos muito bem o que aquilo significa – tamanho o mistério em torno da figura do doceiro e de sua fábrica –, tampouco onde se chegará depois da procura toda (o que traz um misto de expectativa e medo da decepção).
É aí que o filme faz com que adotemos a perspectiva de Charlie Bucket, um moleque que entrega jornais para ajudar no sustento de sua casa, onde reside junto com a sua mãe, uma humilde lavadeira, e seus inválidos avós maternos e paternos – que dividem uma mesma cama de casal. Como não pode contar com outros recursos para facilitar a sua vontade de conhecer a fábrica (caso ache algum dos bilhetes), o menino investe pura e simplesmente na esperança, fomentada pelas férteis histórias contadas pelo seu querido vovô Joe – que casa com o arquétipo do velhinho doce e bondoso que trazemos internalizado desde a infância –, que estimula como pode a força de vontade do neto pelo poder na imaginação.
Junto do garoto pobre e de bom coração, ganham, claro, outras crianças com algum tipo de deficiência de caráter (tem a menina mimada, a obsessiva, o garoto guloso, o chato) fomentada pelo possível mal exemplo dos pais (não se esqueçam das canções dos Oompa-Loompas, aqueles pequenos e bizarros ajudantes do estabelecimento), que os acompanham no passeio pela fábrica, e o filme usa desses estereótipos não como caminho narrativo mais óbvio, mas para que, além do reconhecimento imediato, os personagens funcionem como um exemplo moral a não ser seguido, já que a moral é aquela velha de sempre sobre a perpetuação de bons valores em meio a um mundo tão dissoluto – sem reforçar muito os habituais maniqueísmos, ao fazer toda consequência sofrida pelos pequenos e seus pais (inclusive com o protagonista e seu avô na cena da bebida voadora), nada mais que uma reação da própria falha.
Mas antes de ser um filme que carrega consigo toda essa cota de mensagens edificantes, A Fantástica Fábrica de Chocolate é sobre a inconfundível magia da curiosidade, especialmente pelo olhar da criança (talvez isso explique o seu valor nostálgico tão forte). Não é a toa que mesmo os adultos aqui guardam consigo esse fascínio pelo novo, pelo desconhecido, agindo como verdadeiras crianças tanto no momento de suspense a cada barra de chocolate aberta em busca do bilhete ou, no caso dos acompanhantes, ao se depararem com o universo estranho e fabuloso dentro da fábrica de doces, fechada por tanto tempo, o que despertou essa vontade maluca de saber, mais que o resultado da competição, o que havia de tão misterioso que tornava aquele lugar tão especial, de alguma forma; como síntese disso, a cena em que Charlie é intimidado por um ambulante enquanto observa fascinado para a fachada da fábrica, e mesmo o tom assustador do homem não consegue fazer com que o menino diminua seu desejo de saber o que há ali – pelo contrário.
É por isso que a imagem da sala de chocolate, onde o excêntrico Willy Wonka apresenta aos seus convidados o departamento onde se fabrica a tão deliciosa bebida, tem um significado tão forte nesse sentido (é, particularmente, o momento-chave do filme); porque é ali que adultos e crianças encaram o fim de uma busca através de uma visão equivalentemente embasbacada, sendo como crianças diante de uma árvore de natal cheia de presentes, a qual passaram tanto tempo esperando e agora veem o resultado ao lado do próprio Papai Noel – que é, mais ou menos, o que a figura curiosa do confeiteiro remete. Nem é necessário correr para desembrulhar os pacotes, já que o que importa, de verdade, é saber que está ali, que aquilo é real, e que, definitivamente, valeu a pena acreditar.
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