É lugar comum no estudo da narrativa no cinema que toda história é digna de ser contada, muito mais importando a forma como se o faz, com todas as possibilidades que essa linguagem proporciona, do que propriamente o que se conta. Em outras palavras, mais do que "sobre o que o filme é", importa entender e discutir "como ele é sobre o que ele é".
Dito isso, "The Beguiled", dirigido sóbria e seguramente por Coppola, tanto estética quanto narrativamente, é um filme que consegue trazer à tela a história que pretende contar, possuindo cadência e desenvolvimento de personagens que, embora por vezes pareçam monótonos, soam sempre "no lugar".
A grande questão é que, por certo, uma narrativa não se acaba em si mesma. Quem se dispõe a contar uma história, invariavelmente, pretende comunicar valores, ideias, conceitos, questionamentos, o que for. Nenhuma narrativa, em sua substância moral, existe no vácuo, nem mesmo as que se propõem a versar sobre o próprio vácuo. E é aí que o filme de Coppola decepciona.
Situado no sul dos Estados Unidos durante o auge da Guerra Civil, "The Beguiled" possui uma premissa simples, mas farta em possibilidades: um soldado nortista é encontrado à beira da morte por uma menina, que o leva ao internato onde ela vive reclusa com mais algumas mulheres. Partindo desse ponto, o filme passa a apresentar a forma como aquele "corpo estranho" se insere num ambiente marcado pela mansidão e pela tentativa de manutenção da pacacidade em tempos instáveis.
O grande problema é que Coppola, que parece ensaiar ao longo de toda a projeção sugestões de como a figura alienígena traria à tona os vícios latentes inerentes àquele ambiente, jamais tem a coragem necessária para levar a cabo essas sugestões, seja explícita ou implicitamente. Nada, ao fim, soa como minimamente confrontativo. Ao contrário, o filme se satisfaz com um desfecho que, além de acovardado, passa ao espectador uma sensação de que tudo aquilo que acabou de ser visto foi meramente gratuito, já que a narrativa sai de um determinado ponto, sugere passear por algumas questões, mas nunca realmente o faz, e volta àquele mesmo ponto, tudo isso sem oferecer nada a ser apreciado, discutido ou pensado.
Não dá pra dizer que é ruim, mas "The Beguiled" é bastante decepcionante. Quase como um médico que se contenta com a solução dos sintomas e esquece de tratar da doença em si.
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