Saltar para o conteúdo

Críticas

Cineplayers

Um gás inocente que se sustenta até hoje.

7,0

Em 1994, o cinema de ação pop era um pouco mais inocente e menos exigente do que é hoje. Se fosse lançado atualmente, Velocidade Máxima (Speed, 1994), apesar da sua história bem amarrada e agitadinha, poderia ser um grande fracasso por causa de sua simplicidade e falta de ambição. Ou pelo menos seria facilmente esquecível, já que a pegada hoje é outra, mais realista, menos receptível a cenas espetaculoides semi-fantasiosas. Mas, naquele ano, o filme foi visto com bons olhos pelo público, que comprou a ideia e o tornou um sucesso, além de ter recebido também boas críticas no geral.

Mas vamos com calma e nos situar. Em 1993, os EUA tinham recebido o primeiro atentado da al-Qaeda, que acabou falhando. Eles colocaram uma bomba em uma van, que entrou na Torre I e foi detonada, causando um buraco de quatro andares de altura no edifício. A ideia era que sua estrutura fosse abalada e a fizesse desabar sobre a Torre II, causando a destruição de um dos maiores símbolos econômicos da América. Pelo menos até 2001, os ‘mocinhos’ haviam vencido e estavam com moral contra o terror. Velocidade Máxima é sobre isso, a exposição do povo americano ao terror, mesmo que o terrorista exibido no filme seja um... americano. E em uma escala muito menor; eles jamais esperariam algo como o 11 de setembro. Nem mesmo o cinema.

Com três atos muito bem definidos (elevador, ônibus e metrô), o filme percorre a história do Oficial Jack Traven (o nome consegue ser mais canastrão que o próprio Keanu Reeves), que em um dia de trabalho impede que uma bomba exploda em um elevador comercial, frustrando os planos do terrorista Howard Payne (Dennis Hopper sendo... Dennis Hopper, mas maneta e ainda mais louco pela falta de drogas do personagem). Como vingança, ele coloca uma bomba em um ônibus em Los Angeles, que deve permanecer acima de 80km/h ou explodirá, matando uma série de americanos comuns. Jack, como esperado, vai até o ônibus para tentar impedir que isso ocorra. Há ainda a bela Annie Porter (Bullock, lindíssima), que na ironia do destino, fica feliz ao conseguir entrar no ônibus que quase perdeu por estar atrasada; veículo na qual acaba assumindo a direção após o motorista oficial ser baleado. É com ela ao volante que boa parte da ação acontecerá.

Ao contrário dos propósitos ideológicos da vida real, o próprio Velocidade Máxima diz, a certa altura, que é apenas um filme de ação. Payne, prestes a revelar suas motivações, pede desculpas por não ter nada maior do que a simples vontade de ter o dinheiro pedido. Nada mais nobre, radical ou qualquer outra coisa que levasse um ser humano a matar um monte de gente. Diferente de hoje, o filme não tem nenhuma mensagem real para passar, nenhum aprendizado, nada. É apenas um filme de ação. E dos bons.

Velocidade Máxima entrega exatamente aquilo que propõe, uma diversão desenfreada, quase ininterrupta. Há os absurdos de sempre: os passageiros do ônibus são bem estereotipados, o vilão força um confronto direto com o mocinho, mesmo em condições físicas piores (no terceiro e já alongado ato do metrô) ou então o fato de Annie estar lá, vulnerável em plena ação policial, quando deveria ter sido levada diretamente a um hospital. Até mesmo algumas cenas onde claramente o ônibus não conseguiria passar (principalmente o tráfego e o salto) ficam críveis. Se não críveis, aceitáveis despercebidamente. O filme tem méritos por isso.

Não pensamos nesses problemas na hora e muito menos nos incomodamos porque simplesmente não há tempo para isso. Não dá para respirar, pois uma ação é levada até a outra e o roteiro explora bem isso: há tensão no elevador, depois já conhecemos os personagens, depois já há mais uma explosão, de repente Jack já está dentro do ônibus, há tiro, descobrimos a identidade do terrorista, e daqui a pouco já estamos enfrentando o ato final, sem nem piscar. Convenhamos, são poucos filmes que conseguem fazer tanto com tão pouco.

E o filme não conseguiu destaque por falta de concorrência: vale lembrar que, em 1994, uns 'filminhos' como Um Sonho de Liberdade (The Shawshank Redemption, 1994), O Rei Leão (The Lion King, 1994), Pulp Fiction – Tempo de Violência (Pulp Fiction, 1994), O Profissional (Léon, 1994) e outras obras hoje consideradas clássicas dos anos 90 estavam chegando aos cinemas. Foi um feito de respeito.

Além do roteiro inspirado em boas cenas de ação, um outro fator faz Velocidade Máxima funcionar de maneira eficiente: atuações. Temos um Hopper rabugento, rancoroso, impiedoso; Reeves e Bullock em tremenda sintonia, usando roupas típicas dos anos 90 que hoje são vistas sob o ar nostálgico que cativa qualquer um que viveu a época; e até mesmo um Jeff Daniels sendo usado como mero coadjuvante de luxo, que acaba tendo uma ou duas das passagens mais marcantes do filme fora do ônibus (sua cara antes de uma explosão é impagável). Aliás, esse é outro mérito de Velocidade Máxima: uma explosão ou outra deixa a entender que aqueles personagens estão realmente em perigo, o que ajuda na tensão e na captação da atenção do público.

Curioso que depois desse filme, o até então competente diretor de fotografia Jan de Bont (que assinou como fotógrafo filmes do calibre de Duro de Matar [Die Hard, 1988] e Caçada ao Outubro Vermelho [The Hunt for Red October, 1990]) nunca mais conseguiu repetir o sucesso de Velocidade Máxima na cadeira de direção. Entregou, quando ainda tinha prestígio com a indústria, trabalhos ruins como Twister (idem, 1996; legal apenas por suas repetições na Sessão da Tarde) e A Casa Amaldiçoada (The Haunting, 1999), além da pavorosa sequência Velocidade Máxima 2 (Speed 2: Cruise Control, 1997). Todos filmes muito simples, assim como o primeiro Velocidade Máxima, o que leva a crer que todos esses acertos com relação a ele tenham sido mais sorte de tudo combinar perfeitamente do que talento de Bont como diretor propriamente dito.

Afastado das câmeras desde que fez a abominação Lara Croft Tomb Raider - A Origem da Vida (Lara Croft Tomb Raider: The Cradle of Life, 2003), ele está filmando seu primeiro projeto em dez anos, Five Minutes to Live, onde dois homens (um deles John Cusack) assaltam um banco e dizem à gerente que, se ela não fizer a transferência que exigem em cinco minutos, será morta. Vamos ver no que vai dar.

Seja mais uma bomba ou um novo recomeço, pelo menos de Bont deixou a lembrança de Velocidade Máxima para toda uma geração de jovens cinéfilos dos anos 90.

Comentários (24)

Alexandre Carlos Aguiar | quinta-feira, 11 de Julho de 2013 - 13:20

Discordo desse início de crítica, afirmando que há 20 anos (nem chega a isso) os filmes de ação eram mais inocentes que os atuais. Talvez este filme tenha feito relativo sucesso exatamente porque era inocente demais e não o contrário. Curioso é que muitos filmes que se enquadram na categoria "Sessão da Tarde" como este, assim que são lançados, recebem olhadas de soslaio e desdém os mais diversos, mas basta alguns anos de rodagens para que alguma medalhinha de CULT estampe seu peito. Seria uma nova categoria na 7a. arte, a de filme-vinho tinto, quanto mais velho, melhor? 😁

Liliane Coelho | sexta-feira, 12 de Julho de 2013 - 11:25

Tem um episódio dos "Caçadores de Mitos" sobre o pulo do ônibus, se seria fisicamente possível ou não. Vocês já devem imaginar a resposta... Mas bons filmes de ação geralmente ignoram completamente a existência de Sir Isaac Newton.
Filmão!

Araquem da Rocha | sexta-feira, 10 de Abril de 2015 - 12:26

É ótimo.Melhor filme de ação que já vi!

Faça login para comentar.