Clint Eastwood fazendo que não vai, mas indo
Clint Eastwood decide enveredar-se em um dos âmbitos de maior defesa do conservadorismo tesudo-estadunidense (frescura deles): o seu belicismo secular. Focando na história de Chris Kyle, um franco-atirador numa espécie de semibiografia focada em seus anos de morticínio no combate na guerra escrota do Iraque.
Clint Eastwood como conhecido conservador norte-americano que é, busca criar uma atmosfera que vise montar um mosaico das articulações que viriam a motivar Chris ao combate por seu país. Desde a criação texana nas bases dos westerns e na educação conservadora baseada em ideais patrióticos pungentes pós-derrocada vietnamita da era Nixon. Além do fato do crescimento de Kyle entrelaçar-se ao seu modus operandi nacionalista na vontade de lutar contra o suposto mal do oriente.
Diante desta conversa mole já conhecida em obras outras, entra a derrocada do humano pelo Clint. Kyle sempre é realçado como um batalhador nacionalista (cego, grifo meu), conservador de cum força (perdendo-se, é bom afirmar) que não mede sacrifícios para defender seu país num esquema de patriotismo furado já conhecido. O que ele não esperava é que isto custaria sua sanidade e sendo, mesmo assim, uma lenda perdida em meio ao caos dos tiroteios. Sempre como um anestesiado diante do muito do que o cerca.
Clint mostra esta figura como exemplo de onde o sujeito de guerra metido a conservador competente e fodão pode se lascar com gosto. Os excessos como destruição mental e física. Kyle é um cara engajado, criado em família católica praticante, temente a Deus e defensor voraz do instinto de proteção familiar. Elementos em repetição que Eastwood labuta seu talento em narcotizar tudo nesta figura de seu atirador. São as nuances dadas a Kyle que transformam tudo em um estudo crítico dos excessos e de que forma uma marmota dessas é enaltecida.
Há uma consternação das possibilidades do quão se pode perder quando se assumem determinados riscos. Um entendimento de como uma figura clássica americana em seu ensejo inicial viria a deixar perder-se nos conflitos bélicos que seu infame país teima de inventar. Inclusive o tesão de guerra é escamoteado pela excelente técnica aplicada nos fazendo ter regozijo pela ação criada. Clint é maroto. Mantém um assassino de guerra como tal e vítima ao mesmo tempo sem acusar frontalmente o país que o cria. Mantém a parada no cinza, pra gente criar uma definição. Que seja no ensejo do enterro ou na paranoia frente a TV. Clint aposta no seu personagem como peça quebrada, mas sem crucifica-lo. É coerente com o seu cinema crítico de si mesmo e sem solução salvacionista em termos de país. É uma posição coerentemente melancólica.
Chris Kyle afirma não se arrepender de ter matado (oficialmente) 160 pessoas em suas viagens ao oriente, e diz querer ter protegido mais seus companheiros em uma alusão a todos os meandros da criação conservadora. Mas seu semblante mostra, não o arrependimento, mas mostra o envelhecer do peso dos anos de uma responsabilidade paranoica (escolha do próprio) de se tirar uma vida e de como isto pode afetar o enrijecer de toda uma existência. Clint aponta contradições desse belicismo. O assumir de responsabilidades e o que elas te acarretam. Não visa discutir a questão ética da guerra em si por questões óbvias, mas, sim na concatenação de seu personagem principal sempre perdido o em meio a tanto heroísmo que lhes é dado. É uma mensagem.
Bradley Cooper assumiu o processo inteiro nas texturas dadas a Kyle deixando-o como uma figura multifacetada de expressões sutis e alertas em busca do próximo alvo, dentro do pensamento de guerra e mote de recepção heroica futura (que ele acaba se lascando a posteriori). Interessante a alegria inicial do pungente cidadão americano de fala dura e segura para se engendrar nas dúvidas de seu silenciar futuro.
Os iraquianos são mostrados simplesmente como o outro em combate. A visão de Clint é ríspida, mas não rasteira, oportunista e preconceituosa. Aqui é a visão do outro ao longe. Como se fossem desconhecidos para os seus atacantes (que de fato o são, já que as buchas pouco conhecem daqueles que vão executar). Kyle é mais um moralista de guerra que Clint não executa, mas o enverniza de vitimismo cinza para melhor enterrá-lo.
Que não passe despercebido, logicamente, a parte técnica. Porra Clint ainda chuta muitas bundas quando quer. A sugestão das imagens nas conjunturas solitárias de Kyle é soberba, onde todos os tons de cinza e o amarelado das areias diárias da desgraça na fotografia (excelente apoio de Tom Stern) funcionam como o infindável conflito interno de Kyle vindo a mostrar o talento do Eastwood na construção de tragédias gregas de seus personagens. Um mestre. A montagem eficiente e o som estupendo completam o espetáculo visual que culmina na excelente montagem da cena final no Iraque com direito a criação de uma atmosfera insuportável de tensão na despedida bélica strictu sensu de Kyle no Iraque.
Se procurares uma crítica ao modelo antibelicista norte-americano, não acharás um grande aporte aqui. Se buscares um troço dialético, e confuso, que defenda e alopre (até certa medida) os moldes do conservadorismo clássico tu encontrarás um material cercado de falhas e conotações intrínsecas aos sofrimentos dos caminhos seguidos das figuras que vivem sob a égide desta escola. A escola conservadora do tesão de guerra. Aqui há um estudo de uma figura acima de tudo, defendendo e culpabilizando seus problemas com o enaltecimento da força das escolhas de proteção/mortandade de gregos e troianos.
Critica foda para um filme foda. Álias, esse filme não foi bem aceito pelo padrão da crítica americana justamente por essa visão "neutra" acerca do moralismo cinematografico, que, na cabeça deles, o cinema NUNCA deveria ter hahahaha.
Valeu meu chapa. Cara esse papo de moralismo é de lascar, o cidadão faz o filme com sua visão e trata de um tema a sua maneira e o que interessa primordialmente é o porquê dele tratar o material assim, ao invés de ter que escolher radicalmente um lado como algo que fosse uma obrigação. Mesmo eu discordando de qualquer visão política que seja desse filme, eu vi aqui uma oportunidade ao debate, principalmente por não radicalizar, isto causa desconforto na turma hardcore conservadora assim como na militância. Se o cara consegue uma presepada dessa já sai ganhando. Eu mesmo não faria. Trataria o atirador como filha da puta e foda-se.
"Eu mesmo não faria. Trataria o atirador como filha da puta e foda-se.", pior q eu faria da msm forma Ted haha. Dou graças que Clint Eastwood tá ai ainda na ativa entregando em tempos variados essas pequenas grandes perolas do meio cinematico, por que são poucos os cineastas conservadores que conseguem andar no gelo fino do "moralismo cinematografico -argh-" e ainda assim entregar um puta de um filme a sua maneira.
Total. Que bom que ele persiste condicionado isso. Acaba por gerar um desconforto de vários lados, o que é ótimo. Filme que feito pra agradar demais é só que tem (na tentativa).