Rio tem bons personagens, que ilustram bem um cartão-postal em forma de filme.
Rio é a mais nova animação do brasileiro Carlos Saldanha, responsável pela trilogia A Era do Gelo (Ice Age, 2002) e Robôs (Robots, 2005). O que nos traz a um ponto bastante interessante. Por muito tempo, fomos bombardeados com filmes estrangeiros com uma visão um tanto quando deturpada do Brasil. Aqui, nos é apresentada uma experiência diferente, onde, mesmo em uma produção de grande porte para enfrentar todos os mercados mundiais, o chefe de criação é um carioca, é dele que vem registrados positiva ou negativamente todos os aspectos da cidade.
É claro que Saldanha fez muitas concessões. Rio ainda é um filme extremamente preocupado em agradar o mercado externo, e existe pelo menos um leve ranço de “Brasil que estrangeiro quer ver”. Os mais exagerados podem até afirmar que apesar de ser um filme sobre papagaios para crianças, não deixa de ser sobre turismo sexual (um site estrangeiro comentou como até os pássaros pensam em sexo “lá embaixo”). Mas o único aspecto que realmente incomoda são as músicas. Nesse quesito, com ou sem Sérgio Mendes, Bebel Gilberto, Carlinhos Brown, o samba é apenas para exportação. É bastante provável que a equipe de produção da trilha não tenha passado nem perto de uma bateria de escola de samba. Mas isso não chega a alterar dramaticamente o resultado final. Difícil o público estar interessado se o samba de raiz, se realmente veio do morro. O foco do filme é outro.
Blu (Jesse Eisenberg) é uma arara azul brasileira, que foi capturada e levada quando filhote para um lugar frio e longínquo divertidamente identificado como “não é o Rio”. Ele é então criado por Linda (Leslie Mann), uma nerd americana dona de livraria, um tanto super protetora, mas com bom coração (e nenhum talento para sambar). Tudo muda quando Tulio (Santoro) convence Linda a levar Blu para o Rio de Janeiro, com o objetivo de procriar e salvar sua espécie. A história se desenvolve então numa espécie de road movie, onde Blu vai lidar com suas duas grandes inabilidades: socializar e voar.
O grande trunfo de Rio está em seus personagens carismáticos e bem construídos (embora não necessariamente bem desenvolvidos). Apesar de pouco mudar suas características durante o desenrolar do roteiro previsível e básico, é um prazer simplesmente assisti-los em cena, seus trejeitos, seus diálogos. Por diversos momentos, eu preferia que a narrativa simplesmente parasse por um momento e os deixasse interagir simplesmente, sem a necessidade de canções, vôos de asa delta, ou cenas de ação. Não é a toa que o filme está sendo considerado o começo de uma franquia. Ao contrário de A Era do Gelo, que precisava de um personagem secundário como o esquilo para roubar o show e manter o interesse, Rio possui protagonistas que dão conta do recado, deixando pouco espaço para as figuras engraçadinhas que insistem em pipocar pela tela, que ajudam a ilustrar, mas sabem que o foco está nas araras.
A animação merece menção por estar a anos-luz do que a Blue Sky havia apresentado até agora. Rio pode ser equiparado ao que de melhor é feito em 3D atualmente. Com um roteiro mais caprichado, que saiba dosar melhor a carga dramática possível mesmo em um filme infantil, com momentos mais naturalmente divertidos, e não tão desesperado por agradar em todo frame, poderia ter ficado muito melhor. Mas Rio ainda é um filme que mantém o sorriso na platéia durante toda a projeção, e isso não pode ser considerado um demérito. No máximo um defeito bem intencionado. Mais pretensão em termos de história, e menos em relação ao turismo, seriam bem-vindos.
De qualquer forma, Rio deve ser lembrado como um dos melhores cartões postais da Cidade Maravilhosa, mesmo com favelas, macacos ladrões, crianças que roubam animais em troca de dinheiro e que moram em lajes. Saldanha tem o mérito de conseguir inserir todos esses dados, que poderiam parecer tão pesados e prejudiciais, e transforma-los em filme divertido, sem julgar, mas sem esconder. É ufanista, mas sem mentir (muito).
Belo filme, bem no estilo Disney. Porém, como na maioria dos filmes que se passam no Brasil, teima em mostrar as mesmas coisas que todos mostram no nosso país, ou seja: favela, carnaval, futebol e criminalidade. Não fosse passado no Rio de Janeiro mostraria também o Pelourinho e a Amazônia. Nos EUA também tem miséria e eles não mostram isso para o mundo em todas sua películas, mas tudo que é feito referente ao Brasil insiste nisso. Isso faz com que o mundo ainda pense que o povo brasileiro é uma porção de índios que ficam batucando e dançando o ano todo em meio a crimes e miséria. Por ser um desenho, logo, mais direcionado ao público infantil, acho que poderiam se ater somente às belezas do Rio. Contudo a animação é de primeira qualidade e a história não fica devendo nada para outros do gênero. Vale apena conferir.