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Críticas

Cineplayers

Não é suspense, não é terror, não é drama. Mas é um bom filme com bons personagens e belíssima técnica.

6,0

Embora esteja em circuito comercial razoavelmente amplo, esse filme deve ser encarado como uma obra voltada mais ao público que gosta de ver filmes mais cerebrais. Muitas pessoas saíram da sessão em que estive extremamente frustradas, querendo seu dinheiro de volta. Sem razão. É um filme feito para pensar, que não lhe dá respostas prontas. E também é um filme que não tem apenas uma resposta específica pronta para seus acontecimentos. E, num segundo também, é um filme que pode ser visto de algumas maneiras diferentes: como um simples suspense – o que o torna fraco; como um estudo de personagens – o que o torna no mínimo intrigante; finalmente, como um filme de técnica – o que o torna lindo de se ver e interessante de se acompanhar.

Como suspense, o filme, como já dito, é fraco. O nome é de certa forma apelativo. Um filme sobre reencarnação pode fazer os espectadores mais desatentos recorrerem a obras de suspense religioso, como por exemplo Stigmata (bem aceito) ou Exorcista - O Início (razoavelmente bem aceito, tem mais nome que aceitação). Não é isso que Reencarnação promove. A história é sobre uma criança de 10 anos que aparece na vida de uma moça que está prestes a se casar, dizendo que é a reencarnação de seu marido morto há também 10 anos – e com dados que realmente parecem provar para todos que isso é verdade, tanto que Anna, a tal moça, entrega-se logo de corpo e alma para o rapaz, já que nunca conseguiu realmente esquecer seu marido.

O filme não tem nenhum susto, é todo clima (veja mais para frente parágrafo sobre ser um filme de técnica), e o espectador logo percebe isso. O que poderia salvar o filme, nesse caso e para o espectador que estava afim de acompanhar um suspense, seria ter o famoso final surpresa. Não é o caso. Bem pelo contrário, o filme deixa mais perguntas que respostas. Então, como suspense, Reencarnação realmente não funciona sob forma alguma: não assusta e não há final-surpresa para chocar.

Como estudo de personagens Reencarnação torna-se um trabalho bem mais interessante. Traz temas bem intrigantes, mesmo que alguns de forma sutil demais para a maioria das pessoas perceberem. O mais óbvio, mesmo, é sobre pedofilia. A personagem de Nicole Kidman realmente se entrega toda ao menino. As cenas devem ter sido filmadas com muito cuidado para não transgredirem nenhuma lei de apoio à criança e ao adolescente existente nos Estados Unidos. O filme traz uma ótica diferenciada sobre o tema, já que raramente pensa-se em “pedófila”. É um termo utilizado quase totalmente no gênero masculino. Outro tema óbvio é a própria reencarnação, embora o filme não julgue muito a validade da existência dela ou não – seus personagens raramente a colocam em dúvida de forma contundente. Finalmente, outro tema seria o comportamento do noivo de Anna, que aceita de forma estranha a presença da criança em suas vidas: ao mesmo tempo que acha que é tudo uma grande brincadeira, ele sente-se cada vez mais amedrontado por dentro, pois, no fundo, no fundo, sabe que pode ser real.

Como filme de técnica, Reencarnação é no mínimo belíssimo. Planos amplos e cenas longas, o clima vazio, de espaço, presente no prédio (ambas as características lembrando muito, em vários momentos, O Iluminado, de Stanley Kubrick), trilha sonora utilizada de forma incrível, com longas pausas silenciosas, que transformam o ritmo do filme em algo incrivelmente lento na maioria do tempo (além de ter belíssimas composições), fotografia apagada, quase sem vida. Todos estes são elementos que tornam o filme diferente. Não há originalidade, apenas superioridade técnica em relação à média das produções atuais. O diretor Jonathan Glazer é o mesmo de Sexy Beast (que, por sinal, é um filme muito bom) e seu próximo trabalho é um filme de mistério com Robert De Niro. Promete, já que está melhorando cada vez mais. Sua melhor cena nesse filme é o close que dá no rosto de Nicole Kidman, no teatro, pelo tempo que parecem ser incontáveis minutos. Demonstra, naquele momento, a complexidade dos pensamentos que passam na cabeça de Anna. Ótimo momento para o diretor e a atriz.

Reencarnação é um bom trabalho, mas recomendado apenas para quem não esperar um suspense. Ao mesmo tempo que seu roteiro não é tão original, ele propõe aos personagens que passem por situações interessantes e decisões complicadas, tornando-os figuras um tanto quanto complexas. Tecnicamente é algo pra se ver, ouvir e se sentir. O filme tem algumas passagens que são popularmente chamadas de “forçadas”, ou pelo menos desnecessárias à história em si, mas isso faz parte do gênero. Ou, pensando melhor... qual gênero? Sinceramente não consegui, até agora, definir Reencarnação em nenhum deles. Isso é bom!

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