3,0
Era óbvio que esse reboot da clássica história de A Múmia iria precisar de uma atualização em seu conceito. O mundo não é mais o mesmo; nem como o de 1999, quando Brendan Fraser e Rachel Weisz protagonizaram uma divertida e inocente versão da história, muito menos como o de 1932, quando o personagem recebeu sua mais clássica adaptação para o cinema. A proposta de conceber um filme com mais movimento, mais ação e menos desenvolvimento, então, já era esperada. O mote dessa nova versão é evidente: de olho no universo expandido de outras empresas, a Universal resolveu promover um encontro entre os seus monstros clássicos em uma série de filmes que, posteriormente, gerarão um grande crossover, mas essa ideia já se mostra mal executada logo no primeiro filme.
A história é bem simples: a Múmia agora é uma mulher milenar amaldiçoada após matar a sua família por poder. Condenada à prisão eterna, é mumificada viva até ser acordada por um soldado de moral duvidosa chamado Nick Morton (Cruise) milhares de anos depois, o que faz com que ela vá atrás dele psicoticamente para completar um ritual de sacrifício que a deixaria ainda mais forte. O que vem depois é uma série de sequências mal dirigidas de uma perseguição que nunca empolga como ação e nem deixa os espectadores no clima por praticamente abandonar o horror original do personagem. Não há problema nenhum em mudar a essência de uma história, desde que a nova identidade assumida seja competente e proporcione uma boa diversão, o que não é o caso aqui.
A troca de sexo da personagem é bem-vinda e abre um leque de possibilidades criativas, todas desperdiçadas por um roteiro raso e focado no personagem de Cruise, que a todo momento estará correndo, brigando com os servos dela ou explodindo algo. Com viés de se manter atual e trazer a discussão sobre a igualdade de gênero, acaba falhando ao tornar a vilã totalmente dependente de um sacrifício masculino. Rechaça o discurso a mocinha do filme, que nos primeiros segundos em tela faz questão de se mostrar independente e moderna ao não ter vergonha nenhuma de assumir para o superior de Nick que dormiu com ele, mas que passa o resto do filme todo dependente dele para sobreviver, inclusive em uma espetacular sequência da queda de avião, um dos poucos pontos altos do filme.
Assim como o cinema influenciou os games na década de 90 com Kojima usando todas as suas referências para criar a série Metal Gear Solid, os games hoje influenciam os filmes com narrativas estruturadas em uma ação mais urgente. As referências a franquias como Uncharted e Tomb Raider são óbvias, por vezes bebendo também da fonte de jogos de zumbi como Left 4 Dead e The Last of Us, mas sem entender direito como utilizar tais referências de maneira natural, deixando tudo meio bagunçado e sem propósito.
O personagem de Russell Crowe, por exemplo, acaba mostrando o seu lado obscuro de maneira desnecessária em uma cena de luta totalmente descartável e quebrando qualquer mistério que a série poderia explorar em torno do personagem clássico de O Médico e o Monstro, provando que a Universal está realmente engajada em fazer algo grandioso, mas sem o tato ou sensibilidade necessários para executar isso de maneira sutil e gradativa. Ao escancarar referências enfraquece o discurso, resultando justamente o contrário que ela pretende com tal reunião. A bagunça é explícita: veja o personagem de Jake Johnson, o sargento Vail, que em determinados momentos é apresentado como um cara perigoso quando controlado pela Múmia, e em outros serve como alívio cômico, o que claramente não combina com o seu desenvolvimento, mostrando que a produção do longa não sabia muito bem o que fazer e nem como.
O que fica de A Múmia é a sensação de um projeto ambicioso que não teve mãos capazes o suficiente para executá-lo de maneira individual, pensando apenas no coletivo. Os efeitos especiais são espetaculares, a personificação da múmia ficou muito bacana e atual, mas o principal para um filme de ação, que é divertir e criar grandes momentos, o filme fica devendo - e muito. Que as continuações consigam corrigir esses problemas e criar um grande universo, porque os atores escalados até o momento merecem filmes melhores.
A questão é, será que o projeto continua depois de um filme tão fraco?