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Críticas

Cineplayers

Um desrespeito grave com a inteligência do público.

2,0

Não se enganem pelo cartaz. Ou melhor, não se enganem pelos nomes de Nicole Kidman, Matthew Broderick ou qualquer outro famoso que esteja nele também. O filme é uma tragédia. Pegaram o livro de Ira Levin e destruíram tudo. Se vocês não sabem, ele é o responsável pela obra-prima O Bebê de Rosemary, que Polanski levou aos cinemas de maneira brilhante. Só que Frank Oz não só alterou o sentido da obra como também fez de tudo para deixar o filme mais comercial e de um modo que agradasse o maior número de pessoas possível. O resultado saiu pela culatra e, além do filme ficar sem graça, mesmo se intitulando uma comédia, ele é dono de um dos maiores furos já vistos em toda a história do cinema em sua conclusão.

Joanna Eberhard (Nicole Kidman) é uma publicitária de sucesso no mundo dos realities shows, que levou a empresa onde trabalha à liderança de audiência por vários anos seguidos. Ao anunciar seu novo programa, no qual um casal iria para uma ilha e passariam um tempo separados, acompanhados dos mais belos representantes do sexo oposto, algo inesperado aconteceu: o marido, o qual havia sido fiel à sua mulher e duramente deixado de lado pela mesma, aparece para estragar a festa. Preocupada com o pagamento das indenizações dos envolvidos, a chefona da empresa Helen Devlin (Mary Beth Peil, a vovó de Dawson's Creek) demite "delicadamente" Joanna.

Percebendo que Joanna meio que entrou em estado de choque, seu marido Walter (Matthew Broderick) decide pedir demissão da vice-presidência da empresa e se mudar para o condomínio perfeito conhecido como Stepford. O lugar é um encanto: casas gigantes, paredes brancas e de gramados verdinhos. Tranqüilo e sem perigo algum, é o lugar perfeito para eles recomeçarem a vida – e também o casamento em crise. Tudo ia bem até que depois de várias tentativas de ser como as demais mulheres da vizinhança, Joanna começa a desconfiar que há algo de errado no comportamento das pessoas dali, já que as mulheres parecem não ter vida própria, desejando apenas agradar a seus maridos, e estes com o estranho costume de se trancar em um casarão todos os dias ao melhor estilo "Clube do Bolinha". Joanna então inicia uma investigação junto com as duas únicas  pessoas que pareciam normais por ali: Bobbie Markowitz (Bette Midler), uma escritora relaxada e que vai contra tudo o que se vê em Stepford, e Roger Bannister (Roger Bart), um homossexual famoso em busca de seu espaço.

Só que o filme não passa de um grande lenga-lenga que não faz rir. Ou melhor, até faz, mas muito pouco mesmo e com piadas que passam longe de Nicole ou Matthew. Ela parece estar no piloto automático, com uma atuação sem graça e muito funcional para Joanna, o que acabou afastando o público da personagem principal, bem longe de atuações esplendorosas como em Dogville ou Os Outros. Não espere também vê-la do jeito maravilhoso como ela está no cartaz, pois se aproveitaram de uns quinze minutos finais para vender a imagem de Nicole, já que ela está sempre feia, de cabelo curto e maquiagem do dia-a-dia, ao contrário da grande loira dos olhos azuis e bochechas rosadas que nos chama para o cinema. Nem Matthew se salva, ficando longe de outras interpretações cômicas como ele protagonizou no imortal Curtindo a Vida Adoidado, tornando-se um mero coadjuvante de Nicole, exatamente como seu personagem é em relação à esposa no filme.

Se os atores principais não dão conta, parte da culpa é do roteiro, pois ele nos apresenta situações leves e de sorrisos discretos. Não é uma comédia que lhe fará rolar de rir, o que é muito ruim, já que a conclusão é extremamente decepcionante, diferente do livro e que gerou um catastrófico buraco na história, que não fizeram nem questão de ligar melhor os acontecimentos (leia abaixo o furo e entenda o que quero dizer, caso você já tenha visto o filme ou não se importe de descobrir a “grande” reviravolta final). Até que a música, a fotografia e os componentes de quadro são bem bonitos e simpáticos, com bastante cores, sempre bem contrastadas, dando um ar de Tim Burton ao filme (que inclusive esteve cotado para dirigir o filme, mas preferiu ficar de fora).

Como dito antes, os coadjuvantes comandam os poucos momentos divertidos que há no filme. Bette Midler, que já havia feito comédia antes em Do Que as Mulheres Gostam?, possui as melhores passagens, pois ela é justamente a personagem que questiona tudo ao seu redor. Roger Bart também não faz vergonha e provoca alguns risos com a interpretação de seu homossexual, que parece se encaixar perfeitamente naquele mundo afrescurado de Stepford. Faith Hill, a mesma que canta a canção tema de Pearl Harbor, faz ponta como uma das esposas perfeitas do local, justamente a que dá início à desconfiança toda de Joanna. Christopher Walken e Glenn Close estão pouco inspirados, infelizmente prejudicados por seus personagens terem sido suavizados, perdendo justamente o brilho que eles tinham se o filme fosse levado para um lado mais sombrio.

Na verdade, até que, se não fosse o “grande” final, Mulheres Perfeitas seria apenas um filme ruim, e não essa tragédia. O filme é levado de maneira bem leve e nunca fica interessante, mas pelo menos não torcemos para que ele acabe logo, já que é bem curtinho. Mas acredite em mim, o final pôs tudo a perder quando tentou melhorar, já que ele foi regravado depois da péssima recepção do público em exibições testes, inclusive fazendo com que Nicole Kidman abandonasse provisoriamente as filmagens de The Interpreter para este compromisso. Com essa onda de remakes, bem que poderíamos ter ficado apenas com As Esposas de Stepford, de 1975, mas a sede de faturar em cima de uma comédia leve acabou nos trazendo essa “obra-prima” de 2004.

"O grande furo" – não leia os dois parágrafos seguintes caso não queira ter informações sobre o final do filme revelados.

Como você leu mais acima, os produtores regravaram o final para tentar agradar melhor o público, mas acabaram fazendo uma grande besteira. Ao tentar deixá-lo mais feliz, trocaram as mulheres que eram substituídas por robôs por apenas quatro chips implantados em suas cabeças. Porém, o que eles esqueceram, é que durante o filme algumas esposas colocam dinheiro pela boca, colocam a mão no fogo e não se queimam ou ainda começam a soltar faíscas em curto-circuitos.

Como explicar que apenas esses quatro chips poderiam alterar o interior físico das mulheres? Claro que foi uma escolha para deixar tudo mais fácil, de modo que elas pudessem voltar ao normal no final. E o sistema de segurança então? Que sistema é esse que consegue controlar o cérebro de uma pessoa mas não tem sequer uma senha para protegê-lo, onde basta um louco sair apertando os botões dos painéis seguidamente para desarmar tudo? Se você ainda duvida do furo, como explicar o corpo robotizado que estava entre Nicole Kidman e Matthew quando ela tentava convencê-lo a não fazer a transformação? Este seria o corpo que iria substituir o corpo de Nicole após a transformação.

Os motivos que fazem o filme andar também são contraditórios: se Matthew está infeliz perante sua inferioridade quanto a Joanna, por que ele largou a vice-presidência no início do filme? São tantos absurdos que, se ao menos o roteiro tivesse sido revisado, o filme não teria se tornado inesquecível. Só que nem sempre isso é uma virtude.

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