Animação simbolicamente escrota de um dos maiores mestres da técnica do stop motion: Phil Tippett. Material este que era projeto dele por mais de 30 anos, onde desde o fim dos anos 80 começara a ensejar desenvolver um longa-metragem com sua técnica, completamente. Esta batalha absurda de insistência por trás das câmeras valeu plenamente o esforço. Com toda a nojeira a reboque.
Para abarcar um universo esquizofrênico desses usa-se desta sensacional técnica do stop motion nas mãos de um mestre que possui currículo absurdo com trabalhos em obras como Robocop – O Policial do Futuro (Robocop, 1987); Guerra nas Estrelas vulgo Star Wars: Episódio IV - Uma Nova Esperança (Star Wars: Episode IV - A New Hope, 1977), e suas duas subsequentes sequências; Jurassic Park – Parque dos Dinossauros (Jurassic Park, 1993); entre outros. Um tipo de trabalho considerado por muitos como superado (não pela minha pessoa), mas que jamais deixara de ter seu charme e qualidade na encenação. Este filme é uma prova completa disto. Com seu absurdo detalhamento de cenários e criaturas monstruosas, onde a cada sequência somos agraciados com imagens estarrecedoras de figuras horrendas perambulando, caçando, torturando, e digerindo umas às outras, onde tudo que existe, existe em prol de uma sistemática de maquinaria-orgânica que tem o controle de todos como maldição autodeterminada onde seu objetivo é buscar algum tipo de expiação neste controlo. Algo que se mostra um devaneio frente a realidade do eterno retorno da desgraça e que se o ser humano não é imutável, ele é circunstancialmente repetitivo com camadas outras a embarcar em seus vícios.
O trato brutalmente detalhista das imagens acaba por causar um espectro de pesadelo frame a frame, onde cada imagem corresponde a tal intenção. Como se unissem 24 pinturas (metaforizadas pelas imagens visando seu teor rebuscado) por segundo para gerar este pesadelo colorido ambulante. Como se fossemos não só espectadores do fim dos tempos, mas partícipes daquele espectro feraz de destruição e sentimento de finitude que a obra acaba por conseguir carregar plenamente. É este excesso que chama a atenção. Que serve pra manter o tesão por esta insanidade tanto ligeira em duração quanto visceral em formato.
Um maluco desce dos céus para explodir os níveis mais profundos de uma terra aloprada, pra ver se consegue resetar a porra do planeta. Esse troço fílmico acaba por ser um resultado que mistura terror [com altas doses duma puta seboseira (vômitos, fezes e o escambau)], ficção científica óbvia (pelo mundo pós-apocalíptico que aponta sem toque algum de esperança), e embalsamado por ideias psicodelicamente bizarras sobre punição humana a culminar num círculo vicioso eterno do quão somos escrotos desde a criação (na escolha criacionista que a obra implica em demonstrar seu discurso). É nisso que mora o tal MAD GOD Deus Louco. Desde a citação a Levítico em seu início (única parte com alguma informação escrita (ou falada) que se tenha na fita. Este início remete ao nosso eterno desejo por destruição, já que no ensejo de se criar qualquer divindade para os humanos, em seguida da ideia de criação do universo se segue a punição severa por pecados que se sabe que nunca deixarão de acontecer. Uma espécie de gangorra suicida entre os animais que a partir do momento que pensaram poder controlar seus instintos, objetivaram a criação da posse (propriedade), e nesse esquema, a religião aparecera com mais força, como objeto de adoração e controle. E o Deus maluco.
Phil Tippett propõe um negócio sensorial mesmo, aberto a expectativas e interpretações. Não quer inventar porra nenhuma, mas chocar na mostra dos limites do desastre humano através de soberbas técnicas sebosas. Inclusive a escolha por um filme sem diálogos – com gritos, urros, grunhidos e sons diversos – servem ao filme o caráter de comunicação dos seres, onde as barreiras da comunicação entre humanos foram cansativamente usadas para o aproveitamento do domínio do próximo. A torre de Babel dos primeiros planos existe pra isso. Demonstrar como o caos da falta de comunicação entre semelhantes os leva a destruição. Comunicação esta feita como metáfora através da questão da falta de fala, mas funcional quando o poder de se comunicar depende tanto da fala propriamente dita quanto da empatia de buscar se fazer entender assim como entender o outro, para que haja algum tipo de relação mútua. Tippett explode isso. Mostra que este é um problema universal que não tem solução mostrada até então, tanto que sua explosão é um reset no universo que acelerando o tempo em seguida, acaba por nos mostrar o que esperamos adiante: o clamor da repetição eterna dos nossos infalíveis erros. O tal Deus é mais um escroto que age em prol do caos que ele mesmo forçara criação e para resolver segue sacrificando mais semelhantes para uma tortura eterna onde a solução simplesmente não existe.
Em Mad God o Deus está Louco. O Deus é humano. E é uma merda.
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