Um filme que se tornou clássico com o tempo, mas funciona melhor como drama do que como horror.
Se colocarmos O Lobisomem ao lado de outros filmes de monstros clássicos da Universal, como Drácula ou Frankenstein, vamos perceber que, no mínimo, ele é diferente. Em comum com os demais só temos um demônio a ser exorcizado pela sociedade, pois as suas diferenças de construção, roteiro, direção e demais fatores técnicos são absurdamente diferentes dos outros citados. Enquanto eles tentam assustar, arrisco-me a dizer que O Lobisomem aposta muito mais no drama do que no horror. É um filme construído não para termos medo do monstro, mas sim pena. E, por isso mesmo, é o que faz mais sentido de todos, o que tem o melhor roteiro; simplesmente não é um trabalho de horror, apesar de, com o passar dos anos, ter sido imortalizado como tal.
É fácil de entender o porquê: o personagem principal, o lobisomem, tornou-se um dos mais populares de todos os tempos, então é óbvio que as pessoas, quando forem assistir ao filme, vão esperar algo altamente aterrorizante devido à personificação temporal adquirida. Mas não é o que acontece. O “monstro” só aparece nos últimos vinte minutos, depois de uma poderosa construção de personagem, extremamente interessante. Nela, conhecemos Larry Talbot (Lon Chaney Jr.), um homem que retorna para a casa do pai, no País de Gales, após a morte do irmão mais velho. Só que, durante um passeio com a bela Gwen (Evelyn Ankers), ele é mordido por um lobo e acaba amaldiçoado. Agora, toda noite de lua-cheia, Larry se torna um lobisomem, colocando em risco a vida de todos a sua volta.
Destes filmes de monstro da Universal, este é o que tem a história mais amarradinha. Aqui tudo está interligado; você entende perfeitamente o porque de uma coisa levar à outra – algo que não acontece, por exemplo, em Drácula (a viagem dele soa como se tivesse acontecido "do nada") ou em Frankenstein (várias coisas só são percebidas pelo público porque o filme diz que foi assim e pronto). Essas coisas não acontecem em Lobisomem, talvez porque o roteiro não foi adaptado de uma obra, como nos dois casos citados, onde fica difícil explicar tudo em apenas uma hora e dez de filme (mas não se engane, o personagem não foi criado aqui, apenas utilizado de maneira original).
A partir dessa detalhada construção, temos uma infinidade de virtudes a serem destacadas: o questionamento social dos personagens em volta dos principais, as conseqüências dos fatos que estão ocorrendo pelos envolvidos, entendemos o psicológico dos personagens, suas motivações, etc. Ponto para Curt Siodmak, que soube roteirizar um belo trabalho, que nunca soa gratuito e nem ridículo aos olhos do público. Outro fator bastante curioso é a mistura de folclore versus realidade que o filme faz. Os personagens não acreditam que aquele mundo possa existir, mas a partir do momento em que tudo acontece, sentimos lentamente a transformação em suas vidas. Tudo é muito construtivo. Aproveitando de maneira bastante eficiente as lendas em torno do lobisomem (fraqueza à prata, a lua-cheia, o pentagrama), essa mistura se torna bastante eficiente e torna a validade do longa maior.
Depois do clima criado, é a hora do monstro aparecer. Nesse momento, Lon Chaney Jr (filho do grande Lon Chaney, grande ator de filmes mudos como O Fantasma da Ópera, de 1925) consegue criar um personagem altamente complexo, onde ao invés de sentirmos medo dele, sentimos pena. Larry não queria ser daquele jeito, não queria estar vivendo a realidade em que se encontra e começa a sofrer os preconceitos que todos lhe impõem. Uma pena que sua maquiagem, tão complexa na época (e já clássica), não funcione mais nem como curiosidade: simplesmente fica impossível pensar que alguém possa sentir medo daquilo, tornando o filme um drama eficiente e um horror datado. Há ainda a participação de Bela Lugosi (o imortal Drácula), fazendo o cigano (chamado Bela!) que transmite a maldição para Larry, e de Claude Rains (famoso pelo Capitão Renault de Casablanca), assumindo o pai do jovem rapaz amaldiçoado por Bela.
Pode não ser o mais popular de todos, mas com certeza é o mais cult e bem trabalhado. Estando totalmente datado, vai ser muito mais eficiente se visto como um drama de personagem, e não um horror que fará vergonha nos últimos minutos de exibição. Tendo essa informação em mente, é só aproveitar tudo o que O Lobisomem tem a oferecer ao seu público.
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