Um suspense político que está mais para drama, mas que ainda assim reserva suas poucas qualidades.
Se antes os trailers nos deixavam com o pé atrás porque contavam demais, agora eles estão com a estranha tendência de nos enganar. Ao assistir A Intérprete, a sensação que fica é justamente essa. É sim um suspense político, mas bem diferente do apresentado, caindo muito mais para o drama. Sydney Pollack, famoso diretor do gênero, erra a mão no ritmo do filme, que é extremamente interessante em alguns pontos, mas totalmente vazio em outros, prejudicando o resultado final. Ao mesmo tempo que o roteiro nos deixa grudados na cadeira durante algumas boas passagens, na maioria ele apela para o óbvio e o ridículo.
Conta a história da intérprete das Nações Unidas Silvia (Nicole Kidman), que ouve sem querer um plano para assassinar um importante líder africano, dentro da própria ONU. Ela recebe então a proteção do agente federal Tobin (Sean Penn), que tem recentes problemas pessoais bastante sérios. Ele tenta descobrir detalhes do caso, se Silvia faria parte de uma conspiração ou, porque não, se ela não estaria inventando tudo para 'aparecer' para a mídia.
Pelo trailer, parece que a espinha dorsal do filme ficaria nessa dúvida do agente Tobin, o que tornaria tudo mais interessante. Porém, ela nada mais é do que um pretexto para que tudo aconteça, dando lugar a uma trama batida e cheia de moralismos forçados. Ao invés de acompanharmos um belo trabalho de personagens, temos uma trama convencional sobre um líder que não pode ser assassinado e a tensão que ocorre entre os personagens, que claramente se identificam por suas situações atuais. Essa dúvida que o agente tem fica para trás muito rápido, não é algo explorado pelo roteiro.
Há outras coisas muito erradas também, como estar sempre claro que existe gente por trás de tudo, tirando todo o clima de suspense apresentado pela situação inicial. Não é um suspense, é bom deixar claro. Apesar de ter uma excelente seqüência no ônibus, e um pré-final bastante correto, tudo sempre está muito claro e óbvio. É um investimento pesado - e errado - em um drama, que soa forçado, e não no suspense. Há uma cena do homem mascarado que é simplesmente vergonhosa. Constrangedoramente ruim. É algo totalmente gratuito, que serve apenas para ligar alguns fiapos soltos da trama e que, sinceramente, incomoda bastante.
Apesar do roteiro fazer algumas opções bastante decepcionantes (principalmente no foco da história), conduzindo de forma extremamente básica a trama, sem nunca brincar com o que está acontecendo, e sem nos dar a exata noção da gravidade do caso, pelo menos não é irritante. Conseguimos levar na boa toda sua duração. A história simplesmente não brilha, é menos grandiosa do que deveria ser. Fica um constante sentimento de que está faltando algo. Tem suspense, mas é um suspense. Tem drama, mas não é drama. Tem tiros, mas não é ação. Acaba saindo uma salada mal temperada, mas fácil de digerir.
O final é curioso. Ao mesmo tempo que se mostra satisfatório na conclusão da trama, é extremamente decepcionante no desfecho de seus personagens. O ciclo se fecha de forma maravilhosa, foge do óbvio de maneira como poucos filmes policiais fazem, quando as intenções políticas são reveladas. Porém, quando os personagens revelam suas intenções individuais, a decepção é grande. Fica um ar de 'já vi isso em algum lugar', além de soar bastante dramalhão, sentimentalóide, por causa do background construído anteriormente. A direção de Pollack é segura, mas no tempo errado. Longo, o filme tem algumas seqüências bem desnecessárias, sendo interessante aqui ou ali, mas dispensável no resto.
O elenco está afiado e consegue safar algumas situações muito ruins, fazer com que elas passem despercebidas pela maioria do público. São soluções fáceis, claramente escolhidas para agradar uma fatia maior de pessoas. Sean Penn está maravilhoso, como sempre, e Nicole Kidman finalmente está linda novamente - afinal, ela passou vários e vários filmes 'feia'. Nicole chegou, inclusive, a deixar por uns dias as filmagens para poder filmar um final alternativo para a porcaria Mulheres Perfeitas. Catherine Keener, que é uma excelente atriz e já fez trabalhos importantíssimos, foi reduzida a uma coadjuvante de luxo que não tem uma seqüência sequer que preste. Ela vai passar como uma mera desconhecida pela grande maioria das pessoas.
Para o público casual, vai ser um filme divertido, mas que será esquecido logo, logo. Para os fãs do gênero, pode ser um oásis no deserto, devido a falta de opções, mas com a consciência de que existem trabalhos melhores nas locadoras - principalmente do próprio Pollack. Vale também pela curiosidade de ver as instalações da ONU reais, já que este foi apenas o primeiro filme a ter autorização para filmar lá dentro. O final chegou a me lembrar, vagamente, o Sob o Domínio do Mal original, mas sem o mesmo desfecho, só a situação.
Se conseguir agüentar na boa as passagens desnecessárias, vai ser divertido. Com uma ou outra seqüência mais trabalhada (como a do ônibus), vai prender sua atenção. Apenas não exija muito dele, mas também não o subestime. Afinal, mesmo que seja um filme menor e cheio de erros de Sydney Pollack (apesar de toda a produção se super estimar), é infinitamente melhor que muita baboseira que é lançada toda semana nos cinemas e locadoras pelo país.
Comentários (0)
Faça login para comentar.
Responder Comentário