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Críticas

Cineplayers

O conflito das visões de Lurhmann e Fitzgerald impede o filme de ser tudo o que poderia ser.

6,0

O Grande Gatsby, escrito por F. Scott Fitzgerald e publicado pela primeira vez em 1925, é considerado um dos maiores clássicos da literatura norte-americana. Ainda que recebido friamente à época de seu lançamento, o livro, com o passar dos anos, passou a ser admirado e reverenciado como um dos mais pungentes retratos de sua época, dissecando uma sociedade formada por pessoas que se atiravam ao glamour e a um estilo de vida exuberante, mas que escondia muito de podre e decadente por baixo da superfície. O cinema levou a história de Jay Gatsby e Daisy Buchanan às telas diversas vezes, sendo a versão mais famosa aquela estrelada por Robert Redford em 1974, que, arrastada e com problemas de elenco, ficou longe de ser uma adaptação à altura da obra.

Talvez por isso – ou simplesmente por acreditar ter encontrado no texto o material perfeito para seu estilo histriônico –, o cineasta Baz Luhrmann decidiu construir a sua própria versão. E O Grande Gatsby (The Great Gatsby, 2013) de Baz Luhrmann é exatamente o que se espera de um filme de Baz Luhrmann: uma produção com muito espetáculo, cor e energia, mas que por vezes acaba deixando de lado a história e os personagens. Se não chega a ser um equívoco como Austrália (Australia, 2008), que mostrou como o cineasta se sentia pouco à vontade em um contexto de mais seriedade, também está muito longe de ser inspirado como Moulin Rouge – Amor em Vermelho (Moulin Rouge, 2001), onde Luhrmann conseguiu combinar de forma quase impecável todos os excessos que constroem a sua visão de cinema.

Em O Grande Gatsby, o grande desafio do diretor era equilibrar a análise social da obra original com o deslumbramento e os excessos de suas imagens. Há um conflito aí, e um que nem sempre é bem resolvido. A primeira metade do filme é a que mais sofre com essa incompatibilidade de estilos – a câmera afetada do cineasta incomoda bastante, assim como a montagem acelerada e o overacting dos atores, que afastam a plateia da fundamental imersão na história no primeiro ato. As escolhas visuais de Luhrmann mais distraem do que expressam a força da trama, o que fica bem claro na cena em que Gatsby e Carraway estão no carro e o milionário conta pela primeira vez a sua história: tanto a maneira como Gatsby dirige quanto a forma como o diretor filma a cena não possuem qualquer sentido narrativo, funcionando unicamente para tirar a atenção da plateia em relação ao que está sendo dito.

No entanto, se soa vazio em diversos momentos (a festa no apartamento de Myrtle é outro exemplo), o espetáculo de cores e luzes de Luhrmann é perfeito para retratar as grandiosas festas na mansão de Gatsby. Ali, o cineasta se esbalda – e, ali, há motivo para isso. Assim como na obra de Fitzgeral, as festas são parte fundamental da história, os encontros nos quais a futilidade e a cegueira da sociedade são escancaradas. Aqui, verdade, Luhrmann esquece muito do cinismo e do comentário social para se concentrar na construção de cenas de encher os olhos, apostando na forte paleta de cores e no visual feérico que são características suas. Nesse sentido, até mesmo os efeitos especiais surgem intencionalmente destacados, com claro uso da tela verde e do CG, como se tudo aquilo não passasse mesmo de uma época de sonho e ilusão.

Ainda que, nessa primeira metade, haja esse constante conflito entre a seriedade da história e o estilo exagerado do cineasta, Luhrmann se mostra inspirado em outros momentos. A abertura aos moldes da época (ainda que não seja mais uma novidade) é interessante, assim como a entrada de Gatsby em cena pode ser considerada, em termos estéticos, tão bonita quando aquela de Grace Kelly em Janela Indiscreta (Rear Window, 1955). Da mesma maneira, o cineasta consegue usar a narração em off de forma apropriada, fazendo com ela realmente se torne útil, e não apenas um recurso para descrever aquilo que não soube filmar, assim como também trabalha com habilidade os ícones simbólicos da história (como a luz verde e o olhar de Eckleberg), dando a eles o destaque apropriado para que adquiram significados dentro da trama.

Por outro lado, a utilização de músicas contemporâneas (como Jay-Z e Lana del Rey) em uma história situada em outra época, recurso que funcionou tão bem em Moulin Rouge, dessa vez surge apenas deslocado, como se não fizesse parte do filme – talvez, apenas talvez, Luhrmann tivesse a intenção de estabelecer uma ponte entre a sociedade retratada e a atual, mas o paralelo ficou no meio do caminho. E vale ser dito ainda que a grande inovação em relação ao enredo do livro, a ideia de colocar Nick Carraway em tratamento em um sanatório, relembrando os acontecimentos, pouco ou nada acrescenta ao filme, resultando em uma modificação totalmente desnecessária em uma história tão clássica.

O fato é que O Grande Gatsby parece encontrar o tom correto apenas em sua segunda metade, exatamente quando Luhrmann reduz os seus exibicionismos e se foca mais nos personagens e no aspecto trágico da trama. A partir desse momento, sua câmera se acalma e a montagem relaxa, dando ao filme a abordagem mais centrada que ele pedia desde o início. Até mesmo os atores parecem se beneficiar com isso: se no princípio o Gatsby de Leonardo DiCaprio parece mais agitado do que um adolescente deslumbrado, completamente diferente do elegante homem do livro ou até mesmo daquele construído por Robert Redford na última versão, aos poucos ele vai assumindo seu caráter misterioso e de encantamento diante de Daisy. Já Carey Mulligan surge em cena com a sua doçura habitual, mas é apenas após certo tempo que ela consegue fazer a plateia compreender quem sua personagem realmente é – não a mulher idealizada por Gatsby, mas apenas mais uma representante daquela sociedade de aparências.

Bastante fiel ao texto original de Fitzgerald (são poucas as alterações, como na questão do hospício), o roteiro ainda, escrito pelo próprio Luhrmann e por Craig Pearce, se revela bem montado no que diz respeito às motivações de cada personagem: cada atitude tomada por um deles é justificada por algum acontecimento prévio, dando ao filme uma coerência que, só em termos de comparação, por vezes faltava na versão anterior (escrita por ninguém menos que Francis Ford Coppola). Em contrapartida, o acúmulo de excessos da primeira metade de O Grande Gatsby causa um distanciamento entre os personagens e a plateia, impedindo um maior envolvimento e, consequentemente, o drama que o filme poderia gerar. O espectador fica indiferente ao que acontece com Gatsby, Daisy e Carraway, o que resulta em uma produção fria e emocionalmente vazia. Como se não bastasse, outros aspectos também acabam incomodando, como o excesso da expressão “meu velho” (sim, ela faz parte do livro, mas é utilizada tantas vezes aqui que se torna irritante) e a longa duração – vale ressaltar, porém, que a ideia de utilizar palavras do texto na tela, ainda que mais uma vez remeta a Moulin Rouge, funciona com elegância em quase uma homenagem a Fitzgerald.

Baz Luhrmann merece créditos por tentar dar a sua interpretação e imprimir o seu estilo ao clássico, ao invés de simplesmente reverenciar Fitzgerald. O conflito entre as visões de ambos (um adepto ao espetáculo sem conteúdo e o outro voltado à elegância narrativa com significado), no entanto, resulta em um filme desconexo, que demora a se encontrar. Ainda falta ao Cinema dar a O Grande Gatsby o tratamento que ele merece. Dessa vez, o resultado final ficou como a própria sociedade que o clássico de Fitzgerald critica: deslumbrante, visualmente rica, mas com pouco que a sustente.

Comentários (4)

Thiago Lopez | sexta-feira, 14 de Junho de 2013 - 00:39

Bom texto, mas acho que era um filme projetado com jeitão de blockbuster mesmo. Não é um clássico de forma alguma, e concordo que a obra de Fitzgerald ainda merece uma adaptação mais adequada. Também acho que Luhrmann não trabalhou bem os simbolismos, e sua habilidade reside mesmo nas cenas mais pragmáticas.

Mas de qualquer forma, o filme de Luhrmann é bem produzido, traz mais um belo trabalho do DiCaprio (embora com alguns maneirismos) e merece ser assistido. Todo o exagero faz parte da crítica ao estilo de vida despropositado daquele setor da sociedade, e fica claro que aquelas pessoas não são de forma alguma glamourizadas. Ao contrário, o Gatsby 2013 evidencia a plasticidade de suas vidas. É um filme que tem seus méritos e introduz o livro de Fitzgerald à uma nova geração bem distante de 74.

Ainda aguardo aprovação da minha crítica aqui no site, mas em suma, é isso.

Shin Chan | sexta-feira, 14 de Junho de 2013 - 17:59

Esse filme demorou muito de sair.Só para voces terem uma idéia o filme já foi filmado antes de Django Livre e tanto que o natal de 2012 anos EUA seria um presente Duplo DiCaprio.

Assistir...🙄

Danilo Oliveira | domingo, 23 de Junho de 2013 - 18:10

Palavras chave:Artificial; Plastico ; Purpurina ;Trilha sonora imbecil

Perfumaria pura. E de mau gosto.Sofrível.

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