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Críticas

Cineplayers

Divertido, aterrorizante, absurdo e bem dirigido. Shyamalan volta a ser destaque no cinema norte-americano.

8,0

Shyamalan virou saco de pancada da maioria dos críticos que, seguindo uma onda quase que uniforme (e muitas vezes ignorante, encontrando erros que simplesmente não existem), vêm estraçalhando seus esforços cinematográficos um a um desde que ele lançou A Vila (que em minha opinião é um dos grandes suspenses dos últimos anos). Mas a situação piorou, e muito, com A Dama na Água, um filme muito mais pessoal que seus outros filmes realizados em Hollywood, onde o diretor praticamente declarou guerra a essa classe de profissionais - e estes não o perdoaram. Seu fracasso repercutiu no público, que fez daquele filme a pior bilheteria da carreira do diretor em Hollywood.

Pessoalmente, detestei A Dama na Água. Ele não se encaixa na filmografia do diretor até então e tudo parece um exercício de pretensão desnecessário, quase uma masturbação fílmica que ele deve ter feito para agradar a si mesmo. Se é isso realmente não sabemos, mas o filme sempre será lembrado como um tropeço na carreira do diretor. Então chegamos a Fim dos Tempos. Agora sem expectativa alguma por parte de crítica e público, Shyamalan conseguiu recolocar sua carreira e seu estilo de volta ao [alto] patamar a que fomos acostumados. Não que isso conseguiu determinar uma mudança na visão dos críticos para com seu trabalho - sua imagem está arranhada e será preciso um filme muito melhor do que Fim dos Tempos (por mais que este já seja ótimo) para restaurar essa visão.

Fim dos Tempos começa maravilhosamente bem. E continua bem. E termina bem. Tem vários deslizes em seu trajeto, mas é um filme firme, divertido, aterrorizante e até mesmo um pouco original. Novamente o diretor, que escreveu e produziu o filme, coloca pessoas comuns em situações extraordinárias. Nesse sentido, o filme aparenta ser uma remontagem de Sinais, uma de suas obras-primas. Lotado de situações improváveis, tanto na história quanto visuais, a obra nos presenteia com um ritmo ótimo e uma sequência de acontecimentos muito bem montada, o suficiente para tornar os 90 minutos de filme ágeis e muito interessantes de serem assistidos.

Porém, há problemas. Estes podem ser sentidos sobretudo no roteiro. Talvez pela baixa metragem não tenhamos sido submetidos a um grande esforço no desenvolvimento dos personagens. O Elliot de Mark Wahlberg, então, apenas para citar um exemplo, ficou sem o desenvolvimento do Graham Hess, interpretado por Mel Gibson em Sinais, e comparando com Malcolm Crowe então, personagem de sua obra-prima máxima, o personagem parece estar anos-luz de distância. Finalmente, outros problemas incluem a utilização esquisita do humor, com situações que às vezes parecem estar fora do lugar ou com o timing incorreto. Mas que seja destacado que pelo menos a metade das situações cômicas propostas por Shyamalan funcionam, e muito bem.

Dito tudo isso, o roteiro levemente inconsistente pouco atrapalha quando ele consegue criar algumas das melhores cenas de suspense e terror do cinema americano desde... A Vila. Particularmente, todo o ato final (o clímax, que não entregarei aqui de forma alguma), é uma aula de cinema do gênero, com tensão, imagens macabras e sustos muito bem empregados, utilizando-se somente um pouco de clichês como a utilização de sons altos e repentinos. Nisso, ajuda a belíssima trilha sonora de James Newton Howard, que mais uma vez executou um ótimo trabalho em conjunto com o diretor.

Novamente Shyamalan colocou uma criança como uma de suas principais personagens. Ashlyn Sanchez interpreta Jess em um papel fundamental (esquisito o fato de alguns críticos terem chamado a personagem de inútil) para garantir que o casal principal (Elliot e Alma) tenha forças para seguir em frente e continuar sobrevivendo. A garota não tem um papel complexo como tiveram as crianças de Sinais ou o inesquecível Haley Joel Osment, que via gente morta, mas complementa um elenco diversificado e, senão artisticamente maravilhoso, que pelo menos combina com a proposta do filme. E qual seria essa proposta? Diversão e boas cenas de suspense.

Fim dos Tempos é um "Shyamalan menor" (não inventei essa expressão, li de uma crítica norte-americana e achei, após assistir ao filme, que é perfeita), mas mesmo menor é um filme com um clima único, passagens tensas, algumas delas deliciosamente macabras e outras deliciosamente absurdas. Um filme dirigido quase despretensiosamente para combinar com a proposta de diversão do filme. E, finalmente, traz a lição de moral "homem vs. natureza" - óbvia ao extremo, mas perfeitamente correta. Não é um filme de grandes teorias para ser discutido, apenas uma sessão extremamente ágil e divertido do Cinema Fantástico, algo que poucos conseguem nos proporcionar nos dias atuais. É bom ter Shyamalan de volta.

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