O gênero musical parece estar fadado a ter dois ou três exemplares anuais no circuito comercial. Desprezado pelo grande público, que o considera ultrapassado, o musical sobrevive graças aos fãs do velho cinema de Hollywood e à ambição de ser reconhecido na temporada de prêmios.
Fama, de Alan Parker, que data do já longínquo ano de 1980, só não estava completamente esquecido por causa de sua grudenta música-tema e por fazer parte do currículo de um diretor que ainda possui algum respeito – é de Parker filmes memoráveis como Expresso da Meia-noite, Coração Satânico e Mississipi em Chamas – mas que nas duas últimas décadas simplesmente não acertou, apesar de projetos ambiciosos como Evita.
Decidiram refilma-lo porque, bem, todo mundo já sabe que criatividade não é o forte dos executivos (e dos roteiristas) do cinema norte-americano. Ou alguém duvida que daqui a uns quinze anos não vão estar refazendo Moulin Rouge - Amor em Vermelho ou Chicago? É uma discussão até ultrapassada, há anos que se lê crítica a tal modelo de reciclagem. É também ultrajante a forma como se dão esses projetos: Parker disse publicamente que sequer ligaram para ele informando a feitura deste novo Fama.
O mais curioso é que o que se vê na tela deste Fama é um anacronismo sem precedentes. A começar pela fotografia, em tons de sépia, e iluminação que remete àquelas das décadas de 70/80. O roteiro se fixa em conflitos que não dizem respeito às gerações atuais – ou será que algum jovem se identificará com o relacionamento entre o jovem aspirante a cantor Marco (a revelação Asher Brook, que tem enorme presença de tela) com a também aspirante a atriz Jenny (a insuportável Kay Panabaker, que por si só destruiria o filme por completo)?
E é nesse anacronismo que reside a grande pergunta: se era para refilmar uma produção já esteticamente e narrativamente ultrapassada, não tinha como fazer desta nova leitura algo mais moderno e capaz de atrair a plateia atual? A resposta cabe ao diretor novato Kevin Tancharoen, que apesar do equívocos, ainda consegue manter o pique do filme, principalmente nas cenas coreografadas, ainda que nenhuma delas consiga impressionar.
A estutura de Fama é composta por cinco atos: a audição dos candidatos à famosa academia de artes New York City High School of Perfoming Arts e os quatro anos que se seguem dos alunos selecionados. É esboçado um filme-painel que acaba não se concretizando, restando ao roteiro acompanhar alguns adolescentes por essa jornada de forma mais isolada. Há Denise (Naturi Naughton), talentosa pianista severamente cobrada pelo pai; o aspirante a cineasta Neill (Paul Iacono); o músico Victor (Walter Perez), que não se encaixa nos padrões clássicos; o problemático ator Malik (Collins Pennie); e muitos outros.
Os conflitos vão surgindo aos poucos, segurados com muita inconstância pelo elenco jovem. Para contrabalancear, o elenco de professores é muito bom e discreto, com destaque para Megan Mullally – as cenas dela no karaokê são facilmente as melhores de todo o filme. Na verdade, o filme parece que foi muito picotado na edição, deixando as relações interpessoais muito frágeis, e as histórias dos personagens, muito distantes do público, que não consegue se conectar aos dramas. O exemplo mais forte é a da personagem da dançarina Alice (a bela Kherington Payne), que entra e sai do filme sem qualquer tipo de desenvolvimento dramático, apesar de ser apontada como a mais talentosa de toda a escola.
Infelizmente, diante de todos estes problemas, Fama será esquecido em um tempo muito mais curto que o seu antecessor. Não é um filme ruim, até porque consegue manter o interesse até o fim, mas é um longa-metragem que já nasceu velho e que não tem nenhum poder de seduzir a platéia contemporânea.
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