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Críticas

Cineplayers

Mal resolvido e repleto de erros, filme peca principalmente na construção de seus personagens centrais.

2,0

Filmes que envolvem questões políticas podem ser perigosos: os espectadores que concordam com as ideias transmitidas pela produção acabam comprando o que a mesma transmite, por tanto a admiram. O contrário ocorre com aqueles que contestam a parcialidade do filme, que vende uma verdade contrária àquela em que acreditam. O que ocorre no cinema mainstream, no entanto, recorrentemente foge dos exemplos citados acima, já que a produção em si se torna maior para o espectador do que qualquer ideologia que a mesma carrega. É assim que Código de Conduta se torna um filme agradável para seu público-alvo, com explosões e tiros desviando a atenção dos problemas que o mesmo levanta.

O filme se ambienta nos Estados Unidos dos dias de hoje, mais especificamente entre os bastidores do poder judiciário de uma grande metrópole, repleto de corrupção e falhas em seu sistema. Quando Clyde Shelton (Gerard Butler), um aparente cidadão comum, presencia dois assaltantes invadirem sua casa e assassinarem sua esposa e filha, a única coisa que o homem espera é justiça. O que acontece, porém, é a redução penal de um dos homicidas, por ter contribuído na aplicação da sentença de morte para o outro. Incrédulo e revoltado, Shelton decide aguardar a libertação do criminoso em questão para fazer justiça com as próprias mãos. Mas sua intenção vai além: ele também pretende alterar drasticamente a estrutura e a forma com que o poder legislativo procede, independente do que isso o custe.

Desde o início de Código de Conduta fica clara a força antagônica existente entre Clyde Shelton e o promotor público Nick Rice (Jamie Foxx). Shelton entra na história como um homem de bem, enquanto Rice parece ocupar a posição de malfeitor – o tipo de oficial da justiça corrupto que aperta a mão de um assassino com quem acaba de fazer um acordo. Com o desenrolar da trama e com a crescente fúria de Shelton vemos, ou deveríamos ver, uma inversão de papéis, quando Shelton se torna uma ameaça efetiva a todo o sistema judiciário e Rice passa a ser retratado como defensor dos ideais comuns da sociedade, por buscar a condenação e punição do primeiro. Embora o método de Shelton seja extremista e incrivelmente violento, o personagem não se desenvolve corretamente e continua com ares de bom moço, assim como Nick Rice permanece emulando o bad guy da história, prejudicando toda a estrutura do filme.

Temos dois personagens que, de lados opostos da lei, duelam para fazer justiça seguindo aquilo em que acreditam, mudando de caráter e crenças com uma facilidade irreal. Tomemos o personagem de Nick como exemplo: em dado momento ele tem a sensata decisão de pedir demissão por não conseguir desempenhar sua função satisfatoriamente, acumulando apenas uma série de decisões erradas e tragédias que decorreram delas. Basta que a prefeita da cidade mencione a palavra “promoção” para que Nick esteja agarrado a uma bíblia fazendo um juramento para continuar na profissão e envolvido no caso que, até aquele momento, havia retirado a vida de vários de seus colegas e ameaçado sua própria segurança e a de sua família.

F. Gary Gray, diretor de Código de Conduta, é um dos responsáveis pelos problemas supracitados por não conseguir trabalhar satisfatoriamente com personagens ambíguos, como os propostos no roteiro de Kurt Wimmer. O diretor já havia errado por deixar com que os anti-heróis de Uma Saída de Mestre se tornassem caricatos, e aqui ele peca novamente no mesmo ponto. Por procurar um excesso de veracidade em seus protagonistas, Gray acabou os deixando questionáveis e pouco críveis. Wimmer, no entanto, não colaborou para que a situação fosse outra: seus conceitos deturpados de corrupção e justiça se desenvolveram erroneamente desde Os Reis da Rua, e a participação do roteirista em filmes do calibre de Ultravioleta já faz com que futuras produções que tragam seu nome nos créditos sejam evitadas.

Ainda que se trate praticamente de um caso de pleonasmo, a acusação de que o cinema norte-americano carece de originalidade deve ser feita, já que Código de Conduta reforça tal afirmação ao fazer uso de elementos empregados exaustivamente em outros filmes e até mesmo na televisão. Um dos melhores exemplos está no momento em que Gerard Butler encarna Dexter, o serial killer da série homônima, em uma cena que copia o programa com tal riqueza de detalhes que poderia até mesmo ser considerada um caso de plágio: a máscara, a serra, o tom sarcástico e psicopata que seu personagem adota e até mesmo a foto das vítimas do assassino a sua vista, que saiu impune da prisão, mas não do vingador que se prepara para mutilá-lo. Tudo remete ao ótimo programa de TV, corroborando com o pensamento de muitos espectadores que hoje direcionam olhares atentos para as séries televisivas por estarem cansados da mesmice presente no cinema comercial.

Se a salvação do filme poderia estar presente em seu elenco, que carrega nomes prestigiados do cinema recente, também não é o que acontece. Gerard Butler deveria selecionar com mais cautela seus projetos futuros, ainda mais por ter Código de Conduta como seu primeiro trabalho no papel de produtor. Fica claro o péssimo aproveitamento de Butler, Jamie Foxx e do restante do elenco, em especial na participação relâmpago de Viola Davis - que sequer se aproxima de seu desempenho em Dúvida. Um dos destaques fica com Colm Meaney, que obviamente se inspirou no Popeye de Gene Hackman, em Operação França, para desenvolver o Detetive Dunnigan.

Por fim, Código de Conduta não consegue sequer resolver os conflitos e indagações que levanta, deixando em aberto suas propostas para “solucionar” os problemas que debate durante toda sua duração. Com uma resolução bastante fácil e anticlimática, fica a sensação de que a solução do filme para todas as questões que aborda é a de manter tudo como estava anteriormente. Solução no mínimo revoltante, como a maior parte da sessão de Código de Conduta.

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