O ano era 1978. O faroeste italiano já havia entrado em decadência há alguns anos, mas nada impediu de Monte Hellman realizar a última obra-prima do gênero, mesmo que esta não fosse reconhecida, sendo um "privilégio" de colecionadores apaixonados pelo gênero, dos quais, mesmo após ver tudo o que deviam ver, sempre tenta buscar uma obra preciosa e plausível. A tentativa de Hellman e Jerry Harvey (roteirista do filme) era fugir do óbvio, recriar um gênero que já vinha de uma recriação anos atrás com Sergio Leone. O roteiro apresenta rara criatividade e originalidade, mas limitada pelas referências, que por sua vez são bem vindas, e novas características para o gênero, explorando o lado humano de seus personagens e dando espaço para romances, fato que pouco ocorria no gênero.
Condenado pistoleiro Clayton Drumm (Fabio Testi) recebe uma última prorrogação minutos antes de seu enforcamento, na condição de que ele mate fazendeiro Matthew Sebanek (Warren Oates) para uma empresa ferroviária. Ao chegar na fazenda, o pistoleiro é recebido pelo fazendeiro, logo laços de amizade são criados, e o pistoleiro sente-se então impossibilitado de matar Matthew e segue o seu caminho, onde o inferno do oeste irá provocar um reencontro nada amigável. O filme é uma parábola subjetiva sobre o próprio fim do faroeste italiano, de modo visionário, sendo uma grande diversão em todo o seu decorrer, mas finalizado precocemente, onde ainda havia muito a ser contado.
O filme, além de seu próprio estilo, lógicamente reúne vários aspectos do faroeste italiano, mas senti muita falta dos closes e zooms, das câmeras fechadas, da busca pelo ângulo de maior impacto em cenas de violência, que foram utilizados, mas sem nenhum ímpeto. Mas o modo de utilização da trilha sonora é bem explorado, onde há momentos em que o diálogo é deixado de lado, onde a trilha sonora interfere bruscamente no conflito da cena e os personagens, buscando sempre uma junção cena/trilha sonora, em que os sentimentos, seja lá qual for, possa fluir diante de tal vínculo. Nesse aspecto a influência de Leone é inegável, diretor que melhor fez essa conexão na história do cinema.
Hellman faz um western de impacto visual deslumbrante, somando sexo, violência, compaixão, amizade, traição, e uma linha inaudível liga os mais diversos sentimentos, de personagens trabalhados através de uma constante e sutil conexão de tantos anseios, em que a violência gráfica mistura-se ao estilo italiano e emulando com o estilo “americanizado”, contudo, vinculando-se ainda mais com o estilo de Sam Peckinpah, que por sua vez teria o estilo influenciado por ambos países, mas criaria um estilo único. Com Peckinpah no elenco, o auxilio para estilizar os tiroteios, aparentemente deve ter um dedo do mestre americano. Mesmo assim o destaque do filme é Helllman, diretor talentoso e subestimado, que mesmo em uma obra de tempo de duração curto, apenas 1h30min, o diretor nunca acelera as cenas, que desenrolam-se naturalmente, com isso o filme soa como despretensioso em muitos momentos, mas a tal parábola do fim do faroeste italiano torna isso intencional.
O filme Keoma (Keoma, 1976) é tido por muitos como o último exemplar do western spaghetti, ou a última obra prima, mas é importante ressaltar que vieram alguns excelentes filmes do gênero após Keoma, mas filmes injustamentes esquecidos. Hellman brinca com o gênero, realiza uma obra um tanto subjetiva, uma obra que resume muito bem o que foi o western spaghetti: algo que veio com um objetivo, mas desvirtua-se em meio ao seu caminho, não completa tal objetivo e termina, onde ninguém perde, pois suas obras estão lá, indeléveis na história do cinema. China 9, Liberty 37 (Amore, Piombo e Furore, 1978), filme conhecido aqui no Brasil também como A Volta do Pistoleiro é um filme que merece ser visto por qualquer apaixonado pelo gênero, com a garantia de que ao término deste exemplar o espectador estará maravilhado com grata supresa.
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