Num primeiro momento, achei Her muito maneiro porque, no contexto apropriado (levando em conta seu estilo e sua proposta), ele se sai bem no que expressa. O filme possui lá sua aura, tem atuações boas, uma sinopse interessante, etc. Entretanto, acho que ele exige uma análise não só sobre como funciona dentro de sua ideia, mas sobre sua ideia em si.
Existem vários pontos irritantes no filme. Primeiro, a atomização das pessoas e das relações humanas. O protagonista é tão, mas tão atomizado! Olhando bem, é fácil perceber que não houve realmente uma apresentação do personagem a nós: seus desejos, seus medos, seu ponto de vista sobre a vida. Isto, porque ele é resumido apenas no amor, seja sobre a presença ou a falta do sentimento. Esse discurso é bem tosco, já que a proposta de uma narrativa é nos adequar a um mundo alheio ao nosso e viver aquela realidade. Theodore é uma personagem unidimensional, resume-se apenas à pessoa com quem ele está. Nisto, a única chave para entendermos o que está havendo na tela é a nossa identificação com algum dos problemas amorosos do cara. Isso é uma estratégia bem fajuta de roteiro, é a forma mais bosta de te chamar a se envolver com o filme. Não há um texto realmente gostoso ou complexo que nos adeque àquele mundo, o que faz com que o filme utilize apenas essa estética rasa (filtros e mais filtros e mais cores e mais músicas bonitinhas) pra nos prender. Funciona? Óbvio que funciona, mas não podia ser algo mais... Sei lá, novo?
Pra piorar, qualquer personagem que possa ser um pouco mais interessante é silenciada. A Amy, a ex-esposa do Theodore, a Samantha (enclausurada pra sempre no clichê da Manic Pixie Dream Girl) e (até mesmo) a Olivia Wilde eram personagens que carregavam possibilidades incríveis de tridimensionalizar a narrativa. Infelizmente, elas são tratadas de modo mais superficial ainda que o protagonista, e todo sentimento que expressam, toda ação que efetuam serve pra movimentar a história de Theodore, o bundão. Fico muito frustrado percebendo como a Samantha enquanto ser e personagem (as descobertas dela enquanto indivíduo foram mais inteligentes que qualquer reflexão do Theo) se estende em diversas possibilidades narrativas, mas ficou calada, escrava do plot mais-que-raso. A história tratando do homem cis hétero branco que (ai meu deus que coitadinho) está sofrendo por amor. De novo.
"De novo", porque é muito cansativa a interpretação do cinema hollywoodiano sobre o que é ou como funciona o amor. Nossas relações são tão diversas, tão profundas, tão intensas. Intensas demais pra serem aprisionadas neste ideal romântico de estética-pela-estética. Se eu me emocionei com os momentos em que Theo sentiu saudade da sua esposa? Claro que sim, a saudade é sempre bem vinda, a saudade é sempre bonita. Amor é algo lindo de se discutir e apresentar. Agora, as narrativas sobre o amor parecem em sua maioria se resumir a este ideal de amor-instagram-contemplativo, no qual "Her" com certeza cai. O que acho pobre nisso tudo é o grande resumo que é feito da experiência amorosa como um terreno unilateral e egoísta, é como as relações são apresentadas como próprias de um indivíduo (geralmente o homem), e como o único foco é esta narrativa sobre como o amor acaba e começa, desprezando completamente os participantes da relação enquanto indivíduos profundos e complexos.
Afinal, o que eu critico não é "Her" em si, enquanto filme dirigido, atuado e assistido por mim. Eu me envolvi com a narrativa, com as atuações, com as musiquinhas, com tudo! O que critico é a pequenez do filme em abordar temas tão sensíveis a nós como amor e solidão, sendo que ao fim nossa única reação é por conta da estética, mas não acerca de sua profundidade ou de seu discurso. "Her" é fofo, é querido, é simpático. Mas é pequeno.
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