É uma árdua tarefa classificar cineastas. Dizer ''melhor'', ainda mais. Talvez, se isso fosse fácil, o cinema não seria um universo tão magnifíco como verdadeiramente é. Falando especificamente do cinema hollywoodiano, uma questão extremamente complexa logo vem a tona: seriam os cineastas da era de ouro maiores do que os atuais? A grande maioria prontamente diria ''sim'', mas realmente não acho que isso seja uma pergunta tão fácil, tampouco que a maioria tenha conhecimento suficiente para dar uma resposta segura.
É simples enxergar, no entanto, que nomes como Orson Welles, John Ford, Billy Wilder, Frank Capra, Elia Kazan, Hawks, Aldritch, Huston e tantos outros diretores da era de ouro sejam considerados maiores que Scorsese, Coppola, Woody Allen, Spilberg, De Palma e companhia. Seria isso justiça? Não me considero, de longe, apto à dar uma resposta a tal questão.
Não poderia deixar de observar, porém, que o tempo desempenha papel fundamental nesse embate. Os primeiros influenciaram os segundos, moldaram seus conceitos sobre cinema. Além disso, caramba, os caras quase que inventaram o negócio todo. Mas o principal talvez seja o que vou chamar de ''tempo de digestão''.
Em vida, nomes de peso como Nicholas Ray, Orson Welles e principalmente Sergio Leone não receberam o crédito devido, foram censurados, editados, banidos, assim como vários outros cineastas. Vejam: o tempo passou, suas obras foram analisadas com mais calma, versões integrais de seus filmes foram disponibilizadas e, hoje, tais nomes são reverenciados de forma justa (?) e tidos como os maiores do cinema. Em outras palavras, os diretores de antigamente tiveram tempo de sobra para serem digeridos e também para influenciarem as gerações futuras.
Será que essa safra mais jovem de diretores não está sofrendo do mesmo mal? Quero dizer, caras como De Palma e os irmãos Coen dividem opiniões mundo afora. É possível concluir que, em uns 40 anos, suas obras certamente serão mais reverenciadas. E isso vale para todos, inclusive os já cultuados como Scorsese e Tarantino.
Essa questão não foi levantada à toa, pois ao assistir Sabrina, de Billy Wilder, me perguntava a todo momento se estava sendo levado pela opinião popular de que o antigo é melhor. Principalmente depois de começar a ver muitos filmes bons e me tornar um verdadeiro cinéfilo, não me lembro de assistir a uma simples comédia romântica, daquela digna de sessão da tarde, me empolgar tanto e vibrar tanto.
Salta aos olhos a habilidade de Billy Wilder em juntar romance, drama, comédia e até uma mensagem social com tanta competência. Claro, o ótimo roteiro de Samuel Taylor ajuda, e muito: como Sabrina vai conquistar David? Como Linus entrará no romance? Quem ficará com Sabrina? Tudo isso é amarrado de maneira mais que satisfatória. Lembrando: a história é simples, o roteiro, não.
A fotografia em preto e branco, as músicas suaves, o clima romântico de uma viagem a Paris, somente reforçam a beleza desse filme, que é cosiderado uma ''Cinderella moderna''. A sutileza com que tudo é disposto envolve até o mais durão dos espectadores e ferrenhos opositores a comedinhas românticas. Comédia sim, pois, hey, esse é Billy Wilder. O pai Larrabee deve conseguir arrancar risadas de qualquer um, principalmente na cena em que é pego no armário pelo filho.
Audrey Hepburn é uma Sabrina perfeita. Sonhadora e apaixonada, frágil e pensativa. Apesar de ser a ''apenas a filha do chofer'', consegue ter os homens aos seus pés. Não poderiam ter feito melhor escolha para o papel. Apesar de estar bem jovem, consegue ter química com os dois atores principais.
Willian Holden, um dos meus atores favoritos da época, acumula papéis em filmes de drama, guerra, faroestes e outros. Aqui, um pouco mais engraçado que de costume, não deixa a desejar quando é exigido. Encaixou como uma luva no papel de um playboy mulherengo que se apaixona por Sabrina.
Bogart é Linus Larrabee, o irmão mais velho de Holden. Em 1954 já estava meio velho (morreria em 1957, se não me engano), mas o seu carisma estava grande como sempre. Seu papel é o de um executivo responsável, muito rico, atarefado e sem tempo para relações amorosas. Durante o filme, ao conhecer Sabrina, vai lentamente mudando até se tornar um grande apaixonado. Não tem jeito, o olhar canastrão de Bogart sugere a todo momento ''eu tenho o controle, vou dar o golpe final''. Mesmo sendo bem mais velho que Hepburn, o casal que formaram soou bem convincente. Só esqueceram de avisar a Sabrina que, se ela não quisesse se apaixonar, que não fosse à Paris com Bogart, ou ela não assistiu a Casablanca?
Acima de tudo, o retrato da crueldade de um ambiente corporativo contamporâneo é realizado com a melancolia característica desse diretor, que o viria fazer novamente em Se Meu Apartamento Falasse (1960). Aqui, sucesso profissional subtrai proporcionalmente satisfação pessoal: Linus não vivia de outra coisa senão sua empresa enquanto David é um mulherengo que já fora casado 4 vezes, mas que agora deveria se casar uma quinta em prol dos negócios. Após hesitar, assistimos no final a uma inversão de papéis quando vemos o bonito sacrifício do irmão mais novo para trazer, pela primeira vez, realização pessoal a seu irmão mais velho. A impossibilidade de uma interação amorosa entre diferentes camadas econômicas também é representada, mas para felicidade geral, é vencida.
Não li muito ainda sobre esse filme, mas sei que uma refilmagem foi feita com Richard Gere, Greg Kinnear e Julia Ormond nos papéis principal. Obviamente não assistirei, pelo menos não por enquanto, pois com certeza teria olhos imparciais para analisá-la. Dá para imaginar o tamanho do abismo que separa o trio de atores do original com o do remake?
Clássico, comédia romantica, atores carismáticos, ótimo filme, procure tudo isso e irá achar em Sabrina. Assisti por ser um filme de um de meus diretores favoritos e não me decepcionei. Além disso, Humphrey Bogart, Willian Holden e Audrey Hepburn unidos (ou separados também) já fazem valer o ingresso. Me surpreendi quando me vi gostando tanto de uma comédia romântica, um gênero que pouco simpatizo principalmente por ser tão inundado por porcarias nos dias atuais. Mas então não me surpreendia mais quando lembrava que o diretor era Billy Wilder.
Juntando tudo, digo que fico cada vez mais confuso. Pode ser que esteja supervalorizando filmes mais antigos, mas onde encontrarei alguma comédia romantica recente que me traga tanta satisfação?
Comentários (0)
Faça login para comentar.
Responder Comentário