Tim Burton imprime seu tom frio e sinistro para a clássica história de Alice no País das Maravilhas, mas falha ao provocar mudanças maneiristas no desenvolvimento dos personagens e no enredo.
Desde que a Disney lançou Alice no País das Maravilhas em 1951, a história do autor Lewis Carroll se tornou ainda mais popular e passou a ser conhecida no mundo inteiro. Quase 60 anos depois, Tim Burton, o conhecido diretor norte-americano responsável por obras como Edward Mãos de Tesoura, Ed Wood, A Fantástica Fábrica de Chocolate e Peixe Grande, reaparece com o clássico completamente modificado (à sua maneira, claro). O mínimo que se deve esperar de uma refilmagem dirigida por Burton é aquele seu típico tom frio e sinistro, que garante um visual arrebatador e exclusivo, característico de todos os seus trabalhos. Em "Alice in Wonderland", ele não deixa por menos principalmente neste aspecto. Aliás, se tem algo que merece ser elogiado no filme, é o trabalho excepcional realizado por Burton, no qual, mais uma vez, ele foi capaz de elaborar cenários hipnóticos, sempre muito ousados e bonitos (até demais, diga-se de passagem). Entretanto, esse elemento que sempre serviu para engrandecer suas obras, desta vez não foi suficiente para livrar "Alice no País das Maravilhas" dos erros aparentes, e o resultado é bem abaixo daquele que Tim Burton já demonstrou ser capaz de entregar.
A menina Alice agora surge com 19 anos e já tem que se preocupar com um casamento arranjado. Pausa. Desde o início do filme, Burton faz questão de mostrar que modificou até a base da história. A partir da primeira cena do longa já é possível identificar a principal mudança provocada pelo diretor. "Alice no País das Maravilhas" não é só uma refilmagem do clássico infantil da década de 50, como também é uma continuação. Evidentemente que não pode ser classificado como tal, mas não deixa de ser mais uma versão da história da garota que encontra um mundo além da sua imaginação.
De volta à sinopse, Alice se vê frente à frente com toda a nobreza britânica e, aparentemente, está em um beco sem saída. É quando ela vê um coelho usando roupas e um relógio, no entanto, que ela resolve largar tudo para o alto e seguir o animal para ter certeza de que seus olhos não estavam pregando-lhe uma peça. Como resultado de sua curiosidade, Alice cai em na toca do coelho e simplesmente não para mais de cair (em uma alusão nítida ao clássico da Disney). Do momento em que bate no solo firme em diante, Alice encontra-se na Wonderland, ou como também pode ser chamada, Underland. Lá, a jovem encontrará criaturas estranhas, lugares e cenários absurdos e personagens curiosos. Ela logo fica sabendo que deve seguir por caminhos desconhecidos a fim de derrubar a temida Rainha Vermelha do poder, que espalha o terror pelo local; e também encontrar o verdadeiro sentido de um presságio local, no qual ela é tida como a protagonista.
Enfim, pouco restou de "Alice no País das Maravilhas" de 1951. Na verdade, Tim Burton realiza uma desajeitada mistura entre a animação da Disney e o filme Alice Através do Espelho, o que explica os personagens que, eventualmente estiveram presentes em um, mas não em outro. No auge do seu estilo, Burton cria uma sincronia interessante entre seus tons sombrios e o universo imaginado por Lewis Carroll, o que resulta em um espetáculo visual que logo cansa. A beleza dos cenários, repletos de cores e curvas, encanta até um certo momento. Depois, tudo aquilo perde o brilho e o visual não surpreende mais os olhos do espectador.
E aí reside o principal erro de Burton. Tendo ele criado o visual belo, mas com excessos, o espectador concentrará sua atenção mais em outros aspectos do filme. Como não há muito o que exigir da história (o roteiro possui tantos clichês que não existe harmonia alguma entre a previsibilidade da ação e a originalidade da técnica), os olhares se voltarão para o elenco, repleto de estrelas. A principal delas, Johnny Depp, aparece com uma composição de personagem forçada. Seu Chapeleiro Maluco possui gestos exacerbados e comportamentos que, mesmo sob pesadíssima maquiagem, já denunciam o intérprete que está por detrás dela. Depp, neste seu mais novo trabalho, não faz jus à fama que tem. Anne Hathaway é outra que não encontra o tom certo para compôr sua personagem. Ela interpreta a Rainha Branca com artificialismo e maneirismos desnecessários, tentando dar à personagem um ar mais cômico e cordial. Tudo o que consegue é passar a impressão errada. Helena Bonham Carter, pelo menos, está ótima. A atual mulher de Tim Burton precisava olhar sempre para uma câmera especial durante as filmagens, devido aos efeitos especiais que pairam sobre a sua personagem, a Rainha Vermelha. Para interpretá-la, Bonham Carter fez uso de todo o carisma que possui e o resultado foi a melhor atuação de todo o elenco. Aliás, carisma é algo que falta (e muito) à jovem (e desconhecida) protagonista Mia Wasikowska. Ela demonstra toda a sua inexperiência e a personagem Alice passa um ar ingênuo acima do necessário. A atriz parece que recebeu poucas instruções do diretor, o que coloca em dúvida também o trabalho de Burton no comando de elenco.
E ainda existe o mau uso do 3D. Além de desnecessária, a tecnologia sofreu baixas com a péssima conversão. A imagem ficou por muitas vezes desnorteada e a nitidez que se percebe em conversões mais bem realizadas nem dá as caras. Ou seja, somando esse problema com a distribuição descabida de cópias legendadas no Brasil, que correspondem a somente 20% do total de cópias, o resultado é uma dose extra de irritação e indignação.
Alice no País das Maravilhas é, em suma, um filme muito abaixo daquele que poderia ter sido. Possui diversos exageros por parte do diretor Tim Burton, o que acaba refletindo no trabalho do elenco e no desenvolvimento da história. Apesar do belo visual, que também recebe a interferência maneirista do diretor, o filme não consegue alçar voos maiores e decepciona.
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