Deus da Carnificina (2011). Mostrando Quando Um Peso Tem Duas Medidas
Uau! O texto da Yasmina Reza, aliado a sagacidade de Roman Polanski mete o dedão na ferida e com vontade! É de um brilhantismo ímpar! Onde nos deparamos com a desconstrução da sociedade atual na pele de dois casais. Por uma fachada de que se vive em prol da coletividade, são os valores individuais que irão imergir. Será muito mais do que um lavar a roupa suja, irão se despir ora dos conceitos, ora das armaduras, mas numa troca muito rápida de posicionamento. Será um mergulho profundo e individual que não ficará pedra sobre pedra. Um dia que lembrarão para sempre.
A trama do filme é calcado em diálogos que variam do desconcertante para os massageadores de ego. Se foram edificantes, só saberão no day after. O melhor de tudo é que temperada com muito humor. Para nós, é claro!
Onde ainda no início parece que alguns deles não se deram conta de que usam de um peso com duas medidas. Mesmo ela sendo mostrada numa simples fala de um dos personagens. É o óbvio encoberto por: "coisas do passado", "agora os tempos são outros", "vivemos num mundo civilizado"... O Roteiro é tão genial, que essa cutucada vem com essa simples fala: "- Não é tão diferente.". Acompanhem a cena, e tirem as suas próprias conclusões.
Claro que desde o início do filme há muito mais questões levantadas, até nas entrelhinhas. Onde todo o contexto parte de um ato entre dois adolescentes: um, portando um galho de árvore, agride um outro, e tendo como testemunhas oculares um grupo na mesma faixa etária. Na área recreativa de um Parque. Aliás, essa cena é mostrada meio de longe. Numa de que seu parecer ficará em cima do que os seus olhos viram, mas sem ouvir as partes envolvidas. Ouviremos sim, mas relatados pelos pais. E ai, com o peso e medida deles.
Para mim, em "Deus da Carnificina", Polanski nos coloca em cadeiras de um corpo de jurados onde a sentença também levaria em conta os nossos próprios valores. E é ai que eu digo que esse filme deveria ser visto pelas pessoas de mão única. Que nem mostrando por a+b que estão se contradizendo, não aceitarão. Até porque seguem a máxima que seus valores são irrefutáveis.
Houve uma agressão, num local público, onde há danos físicos, e entre dois adolescentes. Após esse incidente, caberia aos pais que papel nessa história? Até porque não estavam presentes no tal parque. Um local que para a mãe do agredido era imune a violência como essa, por ser frequentado por uma classe social de mais posse.
Claro que não dá mais para banalizar a violência do dia-a-dia, como em algo já decantado por João Bosco: "Sem pressa foi cada um pro seu lado...". Mas por outro lado não se deve fechar questão entre o que está certo ou errado. Acima de tudo, ainda não passam de crianças onde o instinto fala mais alto que a razão. Mesmo que o ato seja reflexo do que se sente em sua própria casa, há algo cultural, milenar, de que na rua é o instinto de sobrevivência que fica em alerta. Quando se sente ameaçado, usará as armas que tem, no ali e agora. E é aqui, nesse ato-reflexo, que entrará também como bagagem quem ele é na essência. Voltando ao fato de que se fechar a questão poderá não ver alguém que fez o que fez porque só quis ser aceito pelo grupo.
"- Crueldade e esplendor.
- Caos e equilíbrio."
E é por ai, uma das premissas em "Deus da Carnificina": pesar os atenuantes expostos. Tentar ser impessoal porque serão os pontos de vistas de cada um dos personagens que estarão em julgamento. Só que não em um Tribunal de Júri e sim numa Sala de Estar que até poderia ser em um Lar qualquer se não pertencesse ao casal Penelope (Jodie Foster) e Michael Longstreet (John C. Reilly), pais do filho agredido, recebendo o casal Nancy (Kate Winslet) e Alan Cowan (Christoph Waltz), pais do filho agressor, para o que na cabeça de Penélope: se houve um ato condenável deve haver um castigo.
Mas a lição que fica é: "Conte até 10, até 100... antes de entrar numa contenda entre crianças."
Um filme Nota 10 em tudo! De não querer perder nem um gesto dos personagens, muito menos das falas. Os quatros atores estão soberbos. Em nenhum momento eu pensei em outros. Aliás, é um filme que se piscar corre o risco de perder algo. No filme todo, só há duas cenas externas. A do início, que eu já mencionei. E a outra que fecha o filme com chave de ouro. Explêndida!
Preferi não trazer spoiler. Muito embora cada um dos quatros personagens daria análises mais detalhadas. Onde como argumentavam seus posicionamentos me levaram a sonorizar baixinhos uma interjeições meio impróprias. Como também, o personagem do Christoph Waltz me fez lembrar do filme "Obrigado Por Fumar". Ele parecia ser o advogado do diabo dessa história. Seu cinismo foi bárbaro, bem condizente com sua profissão. John C. Reilly transitava entre um Fred Flinstones e um político daqueles cheios de "agrados", muito era um vendedor de itens domésticos. Kate Winslet soube pesar bem um hamster com a agressão que seu filho praticou. Jodie Foster com suas caras e bocas meio histriônicas, mas bem de acordo com "uma mulher à beira de um ataque de nervos" pelo casamento que levava. Será que os opostos se atraem de fato? E quem teria rodado a baiana em primeiro lugar nessa contenda? Hilária, por sinal!
Então é isso! É mais um filme que entrou para a minha lista de que vale a pena rever. Ô! E como vale!
Por: Valéria Miguez (LELLA).
Comentários (0)
Faça login para comentar.
Responder Comentário