Kick-Ass é baseado na minissérie em quadrinhos homônima lançada em 2008, escrita por Mark Millar(mesmo autor de Wanted, adaptado para o cinema em 2008) e desenhada por John Romita Jr.. O HQ ficou conhecido por seu humor negro e sua alta dose de violência gráfica. Tendo os direitos para a produção do filme em mãos desde o lançamento da primeira edição, o diretor Matthew Vaughn, depois de muita luta contra o moralismo dos grandes estúdios, e ajuda de amigos como o ator Brad Pitt, fez Kick-Ass finalmente ganhar as telas.
Um filme que desde o princípio beira entre uma realidade cruel e uma fantasia alucinada, assim como mistura comédia e violência.
A história gira em torno de Dave Lizewski, um adolescente fã de quadrinhos que não tem absolutamente nada de especial. Isso até o dia que cansado da violência urbana e altamente influenciado pelas histórias que leu, compra uma roupa no eBay e decide se tornar um super-herói. Usando o nome de Kick-Ass, em sua primeira ação Dave acaba conseguindo apenas apanhar muito e ainda por cima ser atropelado. Porém, mesmo depois de uma pequena temporada no hospital, não desiste, e em sua segunda ação acaba conseguindo salvar um homem. E não só isso, filmado por um celular, vai parar no youtube e da noite pro dia vira fenômeno. Assim, Dave acaba conseguindo a vida de um verdadeiro super-herói. Mas o problema começa quando o caminho de Dave cruza o de Big Daddy e Hit Girl, dois justiceiros de verdade, que estão batendo de frente com o chefe da máfia Frank D’Amico, e ele acaba caindo numa história de violência real.
Um dos principais desafios que se tem na produção de uma adaptação é sempre o roteiro, e Kick-Ass não foge a regra. Tendo apenas 8 edições, cada uma com cerca de 30 páginas, uma adaptação “quadro a quadro” não teria mais de uma hora e vinte, enquanto o filme tem quase duas horas. É aqui que entra o diferencial de muitas adaptações recentes, principalmente no mundo dos quadrinhos: a participação do autor original. O roteiro dividido entre Vaughn, Millar e Goldman difere em muito do original, mas não foge do espírito da obra e consegue preencher espaços com momentos originais divertidos(como a cena do microondas) e aprofundamentos interessantes. Isso, infelizmente, não muda o desagrado que alguns fãs mais radicais provavelmente terão com o filme, que acaba sendo como uma reencarnação, tem o espírito mas não a cara.
Diferente de outras produções recentes como Watchmen e Sin City, Kick-Ass não tenta transportar para a tela todo o visual do quadrinho, optando por uma fotografia mais simples, algo que combinou com a própria trama, trazendo para algumas cenas do quadrinho um tom mais realista. Um exemplo disso é a cena em que Dave apanha pela primeira vez, muito mais enxuta que a do quadrinho. Porém, percebam que eu falo que apenas dá um tom, porque Kick-Ass passa longe de ser um filme realista, e tem espaço para alguns momentos bem mais arrojados e fantasiosos.
Vaughn acertou na medida dos efeitos especiais, usando-os muito bem nos momentos necessários do filme. Destaque o uso do slow motion em algumas cenas de ação, no maior estilo das produções de Zack Snyder. O diretor soube usar muito bem ainda alguns recursos visuais, com destaque para a cena da tortura transmitida via web. Em termos de direção, podemos encaixar Kick-Ass como uma espécie de junção dos dois trabalhos anteriores de Vaughn, o suspense mafioso Nem tudo é o que parece e a adaptação do livro de Neil Gaiman, Stardust.
Porém, algo que se deve destacar com certeza em Kick-Ass não é a técnica, mas sim os atores. Aaron Johnson compensa a diferença física com seu personagem(que é loiro e de cabelos lisos no quadrinho) com uma ótima atuação como Dave, mostrando que não tem talento apenas para o drama, mas também para a comédia. Nicolas Cage se mostra num bom momento como Big Daddy, e os momentos em que contracena com Chloe Moretz são ótimos, conseguindo expressar a aprofundada relação pai e filha no filme. Mas é para Chloe que temos que separar um espaço maior. A pequena de 13 anos rouba a cena desde sua primeira aparição no filme. Interpretando Hit Girl, a garota de 11 anos que chacina mafiosos e tem uma boca sujíssima, é impossível não se encantar com ela.
E é Hit Girl a protagonista da maior parte das cenas de ação frenéticas de Kick-Ass. Apesar de sua censura alta no Brasil e de ser de fato violento, o filme não passa perto do nível de violência gráfica do quadrinho. Para compensar esse fato, Vaughn não economizou em cenas de ação, e substitui momentos gore do quadrinho por cenas que arrancarão ao menos um sorriso do rosto do espectador.
E não podemos esquecer, é claro, que Kick-Ass ainda é um filme de comédia, e uma paródia aos super-heróis muito mais interessante e divertida que certas tentativas que tem aparecido no cinema ultimamente. Kick-Ass mantém o humor cru do quadrinho, não censurando piadas sujas e não se preocupando em como isso possa soar.
Um grande problema do filme é acabar perdendo o gás em certo momento, e não conseguir migrar para alguns momentos sérios de forma natural. Algo que talvez tenha sido um problema na troca de bandas.
Assim, o filme tem alguns tropeços, sendo o principal não conseguir manter a pegada da obra original, mas consegue se apoiar em alguns momentos maiores, como seqüências de ação inspiradas. Com isso, Kick-Ass não é nenhuma obra prima, mas ainda sim é uma boa mistura de ação e comédia, e nesses dias de falso moralismo, é um colírio pros olhos de quem não está nem ai para um piada suja ou para se a garota sanguinária tem 11 anos.
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