Chamada de Emergência (2013) - Review
Quando soube que a atriz Halle Berry protagonizaria um novo filme, senti uma mistura de curiosidade e desconfiança. Dona de uma carreira com mais pontos baixos do que altos, a atriz vencedora do Oscar ultimamente era apenas uma vaga lembrança daquela que um dia ja foi considerada uma estrela promissora do cinema. Em plena ascensão, Halle viu sua carreira ser atropelada por um trem de carga após o horrendo filme "Mulher-Gato" (2004), que lhe rendeu uma Framboesa de Ouro e obscureceu seu verdadeiro potencial. Mas talvez ele ainda estivesse ali, adormecido, esperando pelo filme que lhe daria a chance de aparecer novamente.
Quase uma década mais tarde, eis que é lançado "Chamada de Emergência" (The Call, 2013), o filme do qual a atriz precisava para finalmente juntar os cacos e resgatar sua carreira. Ou quase. No papel de Jordan Turner, a atriz interpreta uma despachante da polícia de Los Angeles. Em contato constante com o que há de pior na sociedade, seu psicológico é enfim quebrado quando um erro seu provoca a captura e morte de uma menina. Abalada, Jordan carrega consigo a lembrança dolorosa de seu fracasso, até que 6 meses depois uma ligação parecida a põe em contato com Casey Welson (a Pequena Miss Sunshine, Abigail Breslin).
E após essa introdução direta e (in)tensa, é aqui que o filme engrena de vez. Presa no porta-malas de um carro, Casey tem em Jordan a única esperança para ser resgatada. O problema é que a garota não faz idéia de onde esteja, e Jordan precisa à todo custo superar seu trauma e se concentrar em seu trabalho se não quiser ver a história se repetir. É nesse cenário claustrofóbico que está o núcleo do suspense do filme. Numa concepção pós-iluminista, a liberdade torna-se o bem mais valorizado do ser humano, acima até mesmo de sua integridade física. Do ponto de vista da vítima sequestrada, porém, ambos foram roubados de si à força sem saber por quem ou por quê, e esse mistério ameaçador gera uma angústia subconsciente que absorve o público e provoca a catarse.
E essa catarse mesmo tem razão de ser. Desde o início o filme assume sua condição de thriller e nega ao público a posição onisciente, submetendo-o à tensão sofrida pela vítima e pela policial, cada uma em seu distinto núcleo. Ao focar em Jordan, o diretor Brad Anderson ("O Maquinista") põe a angústia da policial em 3a pessoa, com Halle brilhando ao esbanjar seu carisma e compondo uma personagem de fácil empatia. Com o foco em Casey, a situação muda de figura. Estamos presos no escuro do porta-malas com ela, sentimos o seu medo e angústia em 1a mão. Numa situação muito verossímil, é fácil nos identificarmos com ela - aquilo poderia facilmente acontecer com qualquer um de nós. Além disso, ao restringir-se em grande parte à um cenário, o roteiro é forçado a ser criativo em sua simplicidade, à exemplo de "Por Um Fio" (2002) e "Jogos Mortais" (2004). Do diálogo entre esses fatores surge a atmosfera instigante do thriller.
Então por quê este não é um ótimo filme? A resposta está em seu terceiro ato. Aqui há uma ruptura inexplicável em sua estrutura narrativa, que põe o longa num caminho sem volta rumo ao fundo do mar de clichês. Sem revelar muito, é possível dizer que a protagonista, despachante da polícia, toma a responsabilidade para si e decide resolver tudo com as próprias mãos, arremessando pela janela toda aquela verossimilhança anterior que era o maior elo do filme com o público. À essa altura do campeonato Halle ainda tenta segurar as pontas, é verdade, mas o mesmo não pode ser dito do elenco de apoio e (principalmente) da direção. Assim como o roteiro a que é encumbido de dar vida, o cineasta Anderson se entrega ao caminho dos sustos fáceis, dos enquadramentos em "pontos de vista" forçados, do sangue e mulheres seminuas, que assola as piores produções do gênero.
Tudo isso compõe um terceiro ato que parece ter sido produzido por uma equipe completamente diferente e não faz jus ao que havia sido estabelecido anteriormente, pondo à perder todo o mérito anterior do filme. A repentina mudança narrativa evidencia a falta de entrosamento entre as visões de seus 4 roteiristas distintos, o que por sua vez prejudica a unidade da obra. Com um final que não ajuda, a última impressão acaba sendo a que fica. É de forma plenamente consciente que o filme troca a subjetividade de um suspense bem-construído pela objetividade clichê de sustos baratos que subestimam o público. Por essa razão, "Chamada de Emergência" é um thriller decente mas, em última análise, capenga. E ainda não é o filme que Halle esperava.
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