Há algumas obras que já trazem no próprio titulo aquilo que é esperado pelo espectador e “Preciosa” faz jus a isso e alcança o objetivo de ser precioso enquanto história e a forma como ela é narrada.
Faz-se essencial nessa película o espectador estar despido de conceitos como humanidade, solidariedade e felicidade plena, pois é um retrato da dura realidade e de como as relações e os laços afetivos não podem ser vistos somente por ângulos biológicos e consangüíneos, morais e religiosos, ou seja, a natureza humana caminha no limiar entre o sublime e o grotesco.
O foco narrativo não conflui para as tão “débeis” superações incabíveis, os já tão gastos e deploráveis contos em que o plebeu /plebéia no final se casa com o príncipe/princesa pelo contrário é contundente em demonstrar a realidade social, a falta de perspectiva e o descaso dos órgãos públicos e como esses fatores contribuem sistematicamente para agravar condições sociais tão excludentes.
Logicamente não se pode generalizar, entretanto, também não se pode ignorar que problemas considerados básicos para um mundo tão moderno continuem tão presentes, ignorados e até mesmo normalmente incorporados a paisagem social como a pobreza, a violência, a falta de estratégias e objetivos nas áreas de educação, saúde e outros serviços sociais ineficazes e caducos.
Realmente a narrativa sobre a vida da personagem Claireece Precious Jones é um soco no estômago, é como um caco de vidro cortante que rompe a delicada pele da casca dos sonhos legando aos olhos a tarefa quase impossível de suportar as agruras, sofrimentos e humilhações que constituem a trajetória de vida da protagonista.
Destaca-se ainda outro aspecto relevante o filme não se passa em países normalmente lembrados no cinema somente como pólos de prostituição, tráfico de drogas e esconderijos paradisíacos como países da América Latina, África, Oriente Médio e o leste europeu, a obra é ambientada nos Estados Unidos mais especificamente no Harlem.
O diretor Lee Daniels promove uma belíssima adaptação baseada no livro Push, de Sapphire (Ramona Lofton) e de maneira corajosa e visceral explana todo o descaso de instituições estadunidenses em relação a negros, pobres, latinos e homossexuais.
Evidencia-se na película que o órgão escolar acaba punindo os atores sociais e reforçando a exclusão, o serviço de assistência social se mostra distante da realidade as visitas de supostos profissionais de apoio e investigação social se revelam descompromissadas e indiferentes ao sofrimento do outro.
A personagem competentemente interpretada por Gabourey Sidibe sofre todo tipo de violência física e psicológica envolvendo agressões, incesto, insultos e outras hostilidades como indiferença e desprezo. Já a performance da atriz Mo´Nique encarnado o papel da mãe extremamente perturbada, descontrolada, aproveitadora e incrivelmente insensível e cruel é no mínimo uma atuação magistral e merecedora por ter levado a estatueta dourada.
Avalia-se também outros aspectos valiosos na obra como o artifício utilizado para arrefecer o sofrimento de Precious onde ela cria um mundo de fantasias para atenuar as agressões morais e físicas, os elementos como ponto da vista e quadro cênico são tecidos habilmente, os enquadramentos são meticulosos e especialmente a trilha sonora é soberba.
A obra fílmica Preciosa é uma denúncia social e humana e também um louvor a tantos que lutam no anonimato contra adversidades que abrangem a própria condição de fraqueza humana e as mazelas políticas e sócio-econômicas.
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